Lei Maria da Penha – Lei 11.340/06
Conforme o artigo 1º desta lei, ela se aplica às mulheres, independentemente da idade, em situação de violência dentro do ambiente doméstico e familiar. Além disso, é possível sua aplicação entre homem (agressor) e mulher (vítima), bem como em casos de agressor de outro sexo.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
É possível a aplicação desta lei em casos em que a mão possa estar agredindo a filha, ou a neta a avó ou até mesmo nos casos em que duas mulheres estejam vivendo em relação marital.
Entretanto, não é possível que haja a aplicação da Lei Maria da Penha nos casos em que o homem seja vítima, principalmente nas provas de Exame de Ordem. Uma vez que, o objetivo desta lei é proteger um gênero que se encontrava em situação de desigualdade, ou seja, as mulheres (entendimento majoritário).
Além disso, é possível sua aplicação nos casos em que a vítima seja mulher transexual (que apresenta corpo masculino, mas psicologicamente se considera como mulher), uma vez que o mais importante é como a pessoa se enxerga, não sendo necessário que ela tenha feito a cirurgia de adequação sexual ou não tenha alterado o RG. Diante disso, o PL 8032/2014 discute o assunto, bem como a jurisprudência.
No que se refere ao art. 5º desta lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (importante destacar que estes últimos também se enquadram neste tipo de violência:
I-A violência precisa acontecer no âmbito doméstico. Neste caso o requisito é referente à localização, mesmo que a vítima esteja esporadicamente no ambiente.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Marília frequenta a casa da família Brandão diariamente, uma vez que trabalha como empregada doméstica na referida residência. Entretanto, com uma certa frequência sofre ofensas e algumas agressões físicas de seu patrão Jorge. Neste caso, tal violência configura-se como violência doméstica e familiar.
“para configurar a incidência da lei Maria da Penha não é necessário que agressor e agredida tenham vínculo consanguíneo ou relação afetiva, bastando que este se valha do ambiente doméstico para efetivar a agressão.” TJRS – 70058141292 (Conflito de jurisdição)
II-No âmbito da família, podendo ser, inclusive, por pessoas que são parentes por afinidade.
III-Em decorrência de uma relação afetiva, não precisando haver coabitação. Neste caso poderá se enquadrar, inclusive, relação de ex-namorado ou ex-marido.
O parágrafo único deste artigo destaca que as relações pessoais deste artigo independem da orientação sexual. Basta que a vítima seja mulher.
O artigo 6º destaca que a violência doméstica e familiar contra a mulher é uma das formas de violação aos Direitos Humanos.
O artigo 7º determina quais são as formas de violência doméstica:
I-Violência física: essa forma de violência se encontra tipificada no art. 129 §9º do CP e na Lei 11.340/06. Ou seja, se enquadra na lesão corporal e nas vias de fato.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Duas mulheres que vivem juntas em união estável não apresentam uma relação de muito respeito uma com a outra. Diante disso, certo dia, durante uma briga, Beatriz atira seu espelho em Marcela, causando ferimentos físicos nela. Neste caso estamos diante de um exemplo de violência física contra a mulher.
II- Violência psicológica: nesse caso se enquadra qualquer conduta que cause na mulher qualquer prejuízo emocional e na autoestima. Tal conduta se refere ao crime de ameaça (art. 147 CP) com este dispositivo, além de poder se referir a constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, insultos, chantagens, entre outros.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Neymar, casado com Bruna, tem muitos ciúmes dela com suas amigas, por isso, não permite que ela saia para encontrá-las. Portanto, controla todos os movimentos da esposa, não permitindo que ela saia quando deseja, vigia seus horários, a mantém controlada de diversas maneiras.
III-Violência sexual: esse tipo de violência se enquadra no artigo 213 do CP juntamente com o artigo 7º,III Lei 11.340/06 e se refere a qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Marcelo, durante relação sexual com sua esposa, a obriga a fazer atos sexuais que lhe causem desconforte e constrangimento, mediante coação e ameaça.
IV-violência patrimonial (crime de dano + Lei 11.340/06): se refere a qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, etc.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Jorge está desconfiado de que sua esposa tem mantido relações extraconjugais e que, muito provavelmente, está mantendo contato com o possível amante pelo Facebook. Diante disso, em uma crise de ciúmes, o marido quebra o laptop dela. Este fato configura em violência patrimonial, uma vez que o computador é utilizado por ela para o trabalho e suas necessidades pessoais.
V-Violência moral: qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Manuel tem um triste hábito de denegrir a imagem de sua esposa, falando que ela o trai frequentemente com um colega de trabalho e quando ela está com ele, ele a chama de burra, prejudicando sua autoestima e rebaixando-a. Neste caso estamos diante de uma violência moral.
O artigo 9º prevê a Assistência à mulher em caso de violência doméstica e familiar e isso ocorre da seguinte forma:
-O juiz poderá determinar, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal. Ex.: Bolsa Família, programas de cesta básica, vaga nas escolas e creches, etc.
-Para as mulheres que trabalham, o juiz poderá determinar: I – acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta; II – manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. É importante mencionar que a Lei nº 13.894 de 2019 (Pacote Anticrime) determinou que será realizado encaminhamento à assistência judiciária, quando for o caso, inclusive para os casos de divórcio, anulação de casamento ou dissolução de união estável perante o juízo competente.
-Para a mulher vítima de violência sexual, será garantido o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.
-Além disso, o Pacote Anticrime adicionou cinco parágrafos ao artigo 9º que, resumidamente, se referem a: (i) o agressor será obrigado a ressarcir todos os danos causados à vítima, inclusive ressarcir ao Sistema Único de Saúde (SUS) os custos relativos aos serviços de saúde prestados à mulher; (ii) os dispositivos de segurança utilizados para os casos de perigo iminente e disponibilizados para o monitoramento das vítimas terão seus custos ressarcidos pelo agressor (alguns dispositivos tecnológicos e eletrônicos têm sido usados para esse fim); (iii) o ressarcimento referido não poderá causar qualquer ônus ao patrimônio da mulher e de seus dependentes, bem como não poderá influenciar na pena aplicada ao agressor; (iv) a mulher vítima de violência doméstica e familiar terá prioridade para matricular seus dependentes em instituição de educação básica mais próxima de seu domicílio, ou transferi-los para essa instituição; (v) serão sigilosos os dados da ofendida e de seus dependentes matriculados ou transferidos para as instituições mencionadas.
No que se refere ao atendimento pela autoridade policial, em caso de iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, ela deverá tomar as providências legais cabíveis. Além disso, tanto o atendimento policial quanto o pericial devem ser realizados preferencialmente por servidores do sexo feminino, tomando os cuidados necessários previstos no artigo 10-A da Lei Maria da Penha.
Além disso, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial deverá tomar as seguintes medidas (artigo 12): (i) ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência (narrativa do ocorrido) e “colocar no papel” o que foi dito oralmente (tomar a representação a termo); (ii) colher todas as provas que servirem para esclarecer o fato, bem como ouvir o agressor e as testemunhas; (iii) enviar, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, um documento com pedido da ofendida para a concessão de medidas protetivas de urgência; (iv) determinar que ocorra o exame de corpo de delito da ofendida e pedir outros exames periciais necessários; (v) remeter, no prazo previsto em lei, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público; (vi) conforme acrescentado pelo Pacote Anticrime, deverá ser verificado se o agressor possui registro de porte de arma de fogo e, na hipótese de existência, juntar aos documentos do processo essa informação, bem como notificar a ocorrência à instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte, nos termos da Lei 10. 826/2003 (Estatuto do Desarmamento), dentre outras neste artigo.
Importante mencionar, também, o artigo 12-C, que foi acrescentado pelo Pacote Anticrime que determina que, se for verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da mulher vítima de violência doméstica e familiar, ou de seus dependentes, o agressor deverá ser afastado do lar , domicílio ou local de convivência com a ofendida pela autoridade policial, pelo delegado de polícia (quando o Município não for sede de comarca ou pelo policial (quando o Município não for sede de comarca e não houver delegado disponível no momento da denúncia). Além disso, é importante mencionar que o agressor não terá direito à liberdade provisória, nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência.
No que se refere à competência, o artigo 15 da Lei Maria da Penha trata somente dos processos no âmbito cível, determinando que ser á competente, nesses casos, o Juizado do seu domicílio ou de sua residência, do lugar do fato em que se baseou a demanda ou do domicílio do agressor. Entretanto, em relação aos processos criminais, será aplicado subsidiariamente o CPP, na regra geral do seu artigo 70 – Local da consumação do crime.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Um casal morador do estado do Rio Grande do Sul foi passar o final de semana em Belém, no Pará, e a mulher teve uma atitude que desagradou seu marido e o deixou com ciúmes e este bateu nela. Nesse caso, o agressor vai ser processado em Belém, no local da consumação do crime.
Fica a dica!
-Conforme a Jurisprudência, quem decide sobre o conflito entre Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e o Juizado Criminal (Jecrim) é o Tribunal de Justiça.
– O homicídio doloso contra a mulher é julgado no Tribunal do Júri, que é onde são julgados os crimes dolosos contra a vida.
– Conforme o artigo 16 da Lei Maria da Penha, a mulher vítima não pode se retratar da representação feita em sede policial no caso de violência doméstica, apenas perante o juiz.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Marcela compareceu à Delegacia e narrou que foi vítima de um crime de ameaça, delito este de ação penal pública condicionada a representação, que teria sido praticado por seu namorado Pedro, se enquadrando em caso de violência doméstica e familiar contra a mulher. O procedimento foi encaminhado ao Ministério Público, que ofereceu denúncia em face de Rui pela prática do crime de ameaça (art. 147 do Código Penal, nos termos da Lei nº 11.340/06). Marcela, porém, comparece à Delegacia, antes do recebimento da denúncia, e afirma não mais ter interesse na responsabilização de seu namorado. Entretanto, conforme o artigo 16 da Lei Maria da Penha, a renúncia à representação é possível até antes do recebimento da denúncia e perante o juiz.
-Conforme determina o artigo 17 da Lei Maria da Penha, não pode haver aplicação de penas de prestação pecuniária e multa em caso de violência doméstica e familiar.
Medidas Protetivas de Urgência
Os artigos 18, 19, 20 e 21 desta Lei trata das disposições gerais das medidas protetivas de urgência, que ocorrem nos casos em que a mulher corre risco de morte.
Das medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor, o artigo 22 da Lei Maria da Penha determinou que o juiz poderá definir: a proibição ou restrição do uso de arma de fogo por parte do agressor; o afastamento do agressor da casa, a proibição do agressor de se aproximar da mulher agredida, a restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, a obrigatoriedade da prestação de alimentos provisórios; a restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor; a proibição de venda ou aluguel de imóvel da família sem autorização judicial; o depósito de valores correspondentes aos danos causados pelo agressor, etc; proibição de condutas como: frequentação de determinados lugares, visita de familiares da vítima.
Além disso, com a Lei 13.984/2020, dois incisos foram acrescentados ao referido artigo 22: comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação e acompanhamento psicossocial dele, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
Anteriormente, a Lei Maria da Penha era apenas protetiva, mas criou, em 2018, seu primeiro crime no artigo 24-A (Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência): §2º – embora a pena máxima seja de 2 anos, o delegado não pode aplicar liberdade provisória por meio de fiança. Apenas o Juiz. §3º se houver outros crimes, será punido por eles também.
Entretanto, caso o agressor tenha descumprido medida protetiva em 2017, sua conduta será atípica, uma vez que a Lei que acrescentou o artigo 24-A foi publicada só em 2018.
Ademais, com relação ao artigo 41 da Lei Maria da Penha, é importante mencionar que em qualquer situação que envolva violência doméstica e familiar contra a mulher, não é possível a aplicação da Lei 9.099/95. Tendo em vista este dispositivo, é importante mencionar as seguintes consequências:
1º Julgado do STF: Qualquer lesão presente no âmbito doméstico e familiar e crimes da Lei Maria da Penha são de ação penal pública incondicionada. Portanto, não depende de representação, não sendo possível mudar de ideia.
A não ser que tenha ocorrido ameaça, neste caso será ação penal pública condicionada a representação da vítima.
2º Julgado do STF: Como não é possível que os processos da Lei Maria da Penha sejam julgados pelo Jecrim, também não é possível a aplicação ao acusado da suspensão condicional do processo, da transação penal e à composição civil dos danos, quando houver violência doméstica e familiar contra a mulher.
Entretanto, é importante mencionar que é possível a Suspensão Condicional da Pena (SURSIS) em casos em que o agressor seja primário e de bons antecedentes.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Gilcélia, mãe de Ricardo, pessoa primária e de bons antecedentes, está em dúvida sobre o que pode acontecer juridicamente com seu filho, uma vez que ele agrediu a ex-namorada ao encontrá-la em uma sorveteria com um vizinho, causando-lhe lesão corporal de natureza leve. Neste caso, por ele ser primário e de bons antecedentes, é possível a aplicação do sursis da pena.
Além disso, no caso do exemplo, é possível mencionar que a ação penal não depende de representação da vítima, sendo pública e incondicionada, já a pena não pode ser substituída por uma que seja restritiva de direitos, bem como a Lei Maria da Penha é aplicada mesmo em casos em que os envolvidos não tenham mais uma relação afetiva.
Fica a dica: Conforme jurisprudência do STJ, o artigo 41 também afasta a Lei 9.099/95 tanto aos crimes quanto às contravenções penais praticados contra mulheres no âmbito doméstico e familiar.
Ademais, não é possível a incidência do princípio da insignificância ou bagatela no caso de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Para tanto, é importante mencionar a Súmula 589 do STJ que afirma que é inaplicável o princípio da insignificância nos crimes ou contravenções penais praticados contra a mulher no âmbito das relações domésticas.
Vetores utilizados pelo STF para configuração da bagatela:
- Mínima ofensividade da conduta do agente,
- Nenhuma periculosidade social da ação,
- Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento,
- Inexpressividade da lesão jurídica provocada.
No caso de bagatela imprópria não seria aplicável. Seria oriunda de uma tese defensiva afirmando que se o casal se reconciliasse durante o curso do processo criminal, o juiz poderia absolver o réu com base no chamado “princípio da bagatela imprópria”. Essa tese não é aceita pelos Tribunais Superiores.
Nos crimes praticados no âmbito doméstico e familiar, a palavra da vítima possui algum valor especial, porque esses tipos de crimes acontecem normalmente sem testemunhas.
Ademais, as medidas despenalizadoras não podem ser aplicadas aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, porque Lei 9.099 não pode ser aplicada nesses casos.
Ademais, a Súmula 536 do STJ determina que a suspensão condicional do processo e a transação penal não se aplicam na hipótese de delitos sujeitos ao rito da Lei Maria da Penha.
Lei de Crimes Hediondos Lei 8.072/90
O termo “crimes hediondos” encontra-se previsto na Constituição da República de 1988, em seu artigo 5º, inciso XLIII, possuindo a seguinte redação: “A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça e anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.”
Existem três critérios para definir a hediondez do crime, são eles: o legal, o judicial e o misto. Segundo o critério legal, considera-se hediondo aquele crime que a lei define como tal, pouco importando a sua gravidade no plano abstrato. Já no critério judicial, o juiz, no caso concreto, irá analisar e definir se o crime é ou não hediondo. Por fim, no critério misto, o legislador fornece parâmetros mínimos, possuindo o juiz liberdade dentro desse parâmetro para classifica-lo como crime hediondo ou não.
Pela leitura do artigo 5º, XLIII, o ordenamento jurídico pátrio adotou o critério legal para definir o que é crime hediondo.
Cabe frisar que a tentativa de crime hediondo não exclui sua hediondez, ocorrendo somente a redução de pena, nos moldes do artigo 14, § único, do Código Penal.
O rol dos crimes hediondos é taxativo, conforme o artigo 1º da Lei 8.072/90. Dessa forma, não pode o magistrado, no caso concreto, definir determinada conduta como crime hediondo se a mesma não estiver capitulada no referido rol. São eles:
- Homicídio: será considerado hediondo quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente e homicídio qualificado (art. 121, §2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII).
É importante mencionar que se admite a figura do homicídio qualificado-privilegiado, combinando-se os §§ 1º e 2º do art. 121 do Código Penal, desde que a qualificadora tenha natureza objetiva (incisos III e IV). Nessa hipótese, tal crime não será considerado hediondo, primeiramente por falta de tipicidade, uma vez que o inciso I não faz menção sobre homicídio privilegiado, e em segundo lugar, pela incompatibilidade entre o privilégio e a natureza hedionda do delito.
- Lesão corporal: em regra não é considerada crime hediondo. Ocorre que a Lei 13.142/2015 alterou o Código Penal, assim como a Lei de Crimes Hediondos, prevendo como crime hediondo, o inciso I-A, “lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2o) e lesão corporal seguida de morte (art. 129, § 3o), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição.”
- Roubo:
a) circunstanciado pela restrição de liberdade da vítima (art. 157, § 2º, inciso V); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
b) circunstanciado pelo emprego de arma de fogo (art. 157, § 2º-A, inciso I) ou pelo emprego de arma de fogo de uso proibido ou restrito (art. 157, § 2º-B); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
c) qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte (art. 157, § 3º); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019).
Atenção! O crime de latrocínio encontra-se tipificado previsto no art. 157, §3º, parte final, do Código Penal, restando caracterizado quando, da violência empregada durante e em razão da prática do crime de roubo, ocorrer a produção do resultado morte.
- Extorsão: em regra, não é considerada crime hediondo. Entretanto, quando a extorsão for qualificada pela restrição da liberdade da vítima, ocorrência de lesão corporal ou morte (art. 158, §3º do CP), conforme previsão no art. 1º, inciso III, da Lei 8.072/90, será considerado crime hediondo.
- Extorsão mediante sequestro: ao contrário do que ocorre com os crimes de roubo e de extorsão, que são considerados hediondos apenas se qualificados pelo resultado morte, é tipificado como hediondo independentemente da modalidade, seja na modalidade simples ou na modalidade qualificada.
- Estupro: em todas as suas modalidades é considerado crime hediondo.
- Estupro de vulnerável: após o advento da Lei 12.015/09 foi inserido no Código Penal o denominado estupro de vulnerável. Destaca-se que antes da mudança legislativa, o STF e o STJ já consideravam o estupro de vulnerável como crime hediondo. Após a mudança legislativa, as hipóteses antes denominadas presunções de inocência passaram a ser parte dos elementos do tipo penal do artigo 217-A, não havendo dúvidas quanto a sua hediondez, uma vez que previsto na Lei de Crimes Hediondos.
- Epidemia com Resultado Morte: a epidemia por si só não é considerada crime hediondo. Para ser considerada, exige-se que seja qualificada pela morte.
Cabe frisar que somente a propagação de doença humana configura o crime do art. 267, §1º do Código Penal, uma vez que, se tratando de enfermidade que atinja animais e plantas, o crime será o do art. 61, Lei 9.605/98, não hediondo por falta de previsão legal.
- Falsificação de medicamentos: tal delito encontra-se previsto no artigo 273 do Código Penal, sendo que todas as suas formas dolosas configuram crime hediondo. Dessa forma, verifica-se que a forma culposa do delito, previstas no artigo 273, §2º do CP, não é considerada hedionda.
- Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável: com o advento da Lei nº 12. 978, que entrou em vigor no dia 22 de maio de 2014, para além da mudança do nome jurídico do artigo 218-B do Código Penal, também foi acrescentado ao art. 1º da Lei nº 8.072/90 o inciso VIII para considerar tal crime como hediondo. Dessa forma, verifica-se que tanto na forma simples, prevista no caput, quanto na forma majorada, prevista no §1º, são considerados crimes hediondos.
Nas modalidades submeter, induzir, atrair e facilitar, o delito se consuma no momento em que a vítima passa a se dedicar à prostituição, colocando-se, de forma constante, à disposição dos clientes, ainda que não tenha atendido nenhum (crime instantâneo, ainda que de efeitos permanentes).
Na modalidade de impedir ou dificultar o abandono da prostituição, o crime consuma-se no momento em que a vítima decide deixar a atividade e o agente obsta esse intento (crime permanente).
- Furto qualificado pelo emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum (art. 155, §4º-A do CP).
Cumpre ressaltar a previsão do parágrafo único do art. 1º da Lei de Crimes Hediondos, vejamos:
Parágrafo único. Consideram-se também hediondos, tentados ou consumados: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
I – o crime de genocídio, previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II – o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido, previsto no art. 16 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
III – o crime de comércio ilegal de armas de fogo, previsto no art. 17 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV – o crime de tráfico internacional de arma de fogo, acessório ou munição, previsto no art. 18 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V – o crime de organização criminosa, quando direcionado à prática de crime hediondo ou equiparado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Os crimes de tráfico de drogas, tortura e terrorismo não são considerados crimes hediondos e sim como equiparados, significando que embora não sejam crimes hediondos recebem o mesmo tratamento dispensado pela Constituição Federal, bem como pela Lei nº 8.072/90, sendo eles insuscetíveis de anistia, graça e indulto. Vejamos:
- Tráfico de drogas: importante mencionar que, segundo entendimento dos Tribunais Superiores, a figura do tráfico privilegiado, prevista no artigo 33, §4º da Lei 11.343/2006, não é considerado como equiparado a crime hediondo, por haver incompatibilidade entre o privilégio do tráfico, com o tratamento distinto conferido pelo legislador, e a natureza hedionda do delito.
- Tortura: encontra-se previsto na Lei 9.455/97 em seu artigo 1º.
Destaca-se que as lesões leves suportadas pela vítima serão absorvidas pelo crime de tortura.
A condenação de agente público por delito previsto na Lei de Tortura acarreta, como efeito extrapenal automático da sentença condenatória, a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada, segundo entendimento do STJ.
Aplica-se a lei dos crimes de tortura mesmo que o delito tenha sido praticado fora do Brasil, desde que a vítima seja brasileira.
- Terrorismo: encontra-se previsto na Lei 13.260/16. Há grande divergência na doutrina sobre quais atos previstos na citada lei que podem ser considerados como terrorismo e, consequentemente, equiparados a hediondos. Parte da doutrina afirma que somente o artigo 2º da Lei 13.360/16 tipifica o crime de terrorismo. Os outros tipos penais estariam apenas relacionados ao crime de terrorismo, mas não o seriam propriamente ditos. Além disso, tais doutrinadores alegam que a Constituição da República equipara a hediondos apenas os atos de terrorismo, que são aqueles previstos no artigo 2º da Lei Antiterrorismo.
De outra banda, a outra parte da doutrina, capitaneada por Rogério Sanchez, aduz que todos os crimes previstos na Lei 13.260 são equiparados aos hediondos. Para os seguidores desse entendimento a Constituição da República equipara o terrorismo e não os atos de terrorismo aos crimes hediondos. Isso tanto é verdade que a lei é denominada Antiterrorismo, sendo ela uma lei de regência. Por fim, a citada lei, em seu artigo 17, estabelece que se aplicam os consectários da lei de crimes hediondos a todos os artigos da Lei Antiterrorismo.
Além do mais, é importante destacar que as consequências e as vedações aplicadas aos crimes hediondos também são aplicadas aos equiparados.
Nos termos do art. 2º, inciso I, da Lei 8.072/90, os crimes são insuscetíveis de anistia, graça e indulto:
- Anistia: perdão estatal concedido pelo Legislativo através da edição de Lei Federal. Se dirige a fatos e não a pessoas. Art. 107, inciso II do CP.
- Graça (indulto individual): perdão estatal concedido pelo presidente da República – por decreto, a determinado condenado – art. 84, II da CRFB/88 – art. 107, II do CP.
- Indulto (indulto coletivo): clemência estatal concedida pelo Presidente da República, por decreto, a um número indeterminado de condenados.
Os crimes hediondos e equiparados são inafiançáveis. Cabe frisar que na redação original da Lei dos Crimes Hediondos vedava-se também a liberdade provisória sem fiança. Entretanto, essa proibição foi abolida pela Lei 11.464/2007.
Em sua redação original, a Lei dos Crimes Hediondos trazia em seu corpo que o regime para cumprimento de pena, nos crimes hediondos e equiparados, seria o integralmente fechado, não tendo o condenado, assim, direito a progressão de regime. Ocorre que em 2006, o STF decidiu pela inconstitucionalidade desse regime, uma vez que violava os princípios da individualização da pena, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana. A partir da declaração de inconstitucionalidade, permitiu-se, assim, a progressão de regime de cumprimento de pena privativa de liberdade nos crimes hediondos e equiparados. Além disso, o magistrado, na fixação do regime inicial, deverá observar as Súmulas 718 e 719 do STF.
Além do mais, é importante mencionar que a Lei 13.964/2019 revogou a previsão do artigo 2º §2º da Lei 8.072/90, levando em consideração a Súmula Vinculante 26 e a Súmula 471 do STJ.
O artigo 2º da Lei 7.960/89 prevê, de forma genérica, que o prazo da prisão temporária é de 5 (cinco) dias, podendo ser prorrogado por igual prazo em caso de extrema e comprovada necessidade. A lei de crimes hediondos, por sua vez, aumentou o prazo da prisão temporária para 30 (trinta) dias, sendo tal prazo também prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade, em se tratando de crimes hediondos e equiparados.
A Lei de Crimes Hediondos estabelece em seu artigo 3º, a possibilidade de condenados serem mantidos em estabelecimentos penais de segurança máxima. O condenado de alta periculosidade pode não ser necessariamente um condenado por crime hediondo ou equiparado. Cabe frisar que, para o presídio federal não vão apenas os condenados pela Justiça Federal.
Ademais, segundo a doutrina de Gabriel Habib, o §3º do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos “trata-se de permissivo legal para o condenado recorrer da sentença penal condenatória em liberdade, desde que o juiz fundamente a sua decisão, em conformidade com o princípio da fundamentação das decisões judiciais, previsto no art. 93, IX, da CRFB/88.”
O artigo 83 do Código Penal, que trata do instituto do livramento condicional, foi alterado pela lei dos crimes hediondos, sendo acrescentado em seu texto o inciso V, que dispõe que o condenado por crime hediondo deverá cumprir mais de dois terços da pena privativa de liberdade para a sua obtenção, desde que o condenado não seja reincidente específico em crimes dessa natureza. Dessa forma, verifica-se que é proibida a concessão de livramento condicional ao reincidente específico em crimes hediondos ou equiparados, ainda que não seja o mesmo delito. O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade inferior a dois anos, e a não reparação do dano causado pela infração penal, quando possível, impede a concessão do livramento condicional.
A Lei de crimes hediondos passou a prever uma espécie de qualificadora para o crime de associação para o crime, delito previsto ao teor do art. 288 do Código Penal, disciplinando que será de 3 a 6 anos de reclusão a pena prevista no referido artigo, quando se tratar de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo. Assim, se o fim da associação criminosa for praticar crimes hediondos e/ou equiparados a hediondos, a pena será mais grave, ou seja, trata-se de uma modalidade qualificada de associação criminosa.
Lei Antidrogas (Lei 11.343/06)
A Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD) e prescreveu medidas acerca da prevenção do uso indevido de drogas, reinserção de usuários e dependentes, estabelecendo normas para coibir a produção não autorizada e o tráfico ilícito, definindo, ainda, os respectivos ilícitos penais e regulamentando o procedimento para a sua apuração.
Conforme artigos 1º e 2º dessa Lei, drogas são as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, especificados em lei ou relacionados em lista atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Além disso, não é permitido, em todo o território nacional, tanto as drogas em si, quanto o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas. Entretanto, a União pode autorizar o plantio, a cultura e a colheita dos vegetais referidos no caput deste artigo, exclusivamente para fins medicinais ou científicos, bem como para uso estritamente ritualístico-religioso.
Fica a dica: O Instrumento Regulatório 2.4.1/2019 (Anvisa) possibilita que empresas fabriquem medicamentos à base de maconha no Brasil. Antes, apenas a importação era permitida, desde que fosse feita com autorização específica da Anvisa para a pessoa física.
Crimes na lei Antidrogas
Inicialmente, é importante mencionar que as penas poderão ser aplicadas de forma isolada ou cumulativamente, bem como podem ser substituídas, desde que sejam ouvidos o Ministério Público e o defensor.
- Porte e cultivo para consumo pessoal (art. 28 da Lei 11.343/06)
- Sujeito ativo: qualquer pessoa.
- Sujeito passivo: o sujeito passivo imediato é a coletividade (titular do bem jurídico). O sujeito passivo mediato é o Estado.
- Objeto
c.1) Objeto jurídico: o bem jurídico, ou seja, o objeto jurídico tutelado neste crime é a saúde pública.
c.2) Objeto material: é a droga.
d) Núcleos do tipo: trata-se de tipo penal misto alternativo, contempla cinco verbos, se consumando com a realização de qualquer um deles. Vejamos:
d.1) adquirir: obter a propriedade, a título oneroso e gratuito. O mais comum, entretanto, é a compra onerosa;
d.2) guardar: é ter sob seu cuidado, seja por conta própria ou de terceiro;
d.3) trazer consigo: é sinônimo de portar, ter junto ao corpo;
d.4) ter em depósito: armazenar, manter em caráter prolongado, num determinado local;
d.5) transportar: conduzir de um local para outro em algum meio de transporte;
É importante mencionar que a lei pune somente o perigo social representado pela posse atual da substância, que deixará de existir quando ela já tiver sido consumida.
e)Elemento subjetivo do tipo: o art. 28 da Lei de Drogas apresenta um dolo específico – que vai caracterizar a conduta do usuário – adquirir, transportar, trazer para o consumo pessoal.
f)Crime de perigo abstrato: com exceção do crime previsto no artigo 39 da Lei 11.343/06, todos os crimes da Lei de drogas são considerados crimes de perigo abstrato. Dessa forma, a prática da conduta prevista em lei acarreta na presunção absoluta de perigo ao bem jurídico, não cabendo prova em contrário.
Segundo a jurisprudência pátria, não é possível afastar a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio com base no princípio da insignificância, ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida.
De forma excepcional, a 1ª Turma do STF aplicou o princípio da insignificância para o crime previsto no artigo 28 da Lei de Drogas, uma vez que concedeu habeas corpus para trancar procedimento penal instaurado contra o réu e invalidar todos os atos processuais, desde a denúncia até a condenação, por ausência de tipicidade material da conduta imputada. No caso, o paciente fora condenado, com fulcro no art. 28, caput, da Lei 11.343/2006, à pena de 3 meses e 15 dias de prestação de serviços à comunidade por portar 0,6g de maconha.
g)Consumação e tentativa: a modalidade adquirir é instantânea, consumando-se com o acordo de vontade entre o vendedor e o comprador. Entretanto, no que tange às modalidades trazer consigo, guardar, ter em depósito e transportar, cumpre destacar que as mesmas são consideradas crimes permanentes, se consumando no instante em que o autor consegue a posse da droga, prorrogando-se no tempo enquanto ele a mantiver. A doutrina entende ser possível o crime tentado na modalidade “adquirir”.
h)Natureza Jurídica: é importante mencionar que, atualmente, há uma discussão do STF referente à inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei 11.343/06 sob o fundamento que tal norma viola a esfera de intimidade do indivíduo e a vida privada, além de violar, também, o princípio da lesividade, uma vez que o uso de droga violaria apenas o próprio bem jurídico do cidadão.
i)Penas:
i.1)advertência sobre os efeitos das drogas: tal pena deve ser entendida como uma espécie de explicação a ser feita pelo magistrado ao agente quanto aos malefícios do uso das drogas, não apenas a sua própria saúde, como também à saúde pública. O próprio magistrado que fará a advertência.
i.2)prestação de serviços à comunidade: a citada pena deve ser cumprida em programas comunitários, serviços à comunidade, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas, na forma do art. 28, §§3º e 5º da Lei 11.343/06.
i.3)medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo: é uma espécie de pena restritiva de direitos em que o acusado possui a obrigação de comparecer a determinados programas onde receberá orientação de profissionais de diversas áreas do conhecimento humano.
Cabe destacar que a prestação de serviço à comunidade e a medida educativa possuem o prazo máximo de 5 meses (art. 28, §3º). No entanto, caso haja reincidência, o prazo máximo será de 10 meses. Cumpre destacar que para a garantia do cumprimento das medidas educativas citadas, a que injustificadamente se recuse o condenado, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente, à admoestação verbal e multa.
No que se refere à multa, seu valor é creditado ao Fundo Nacional Antidrogas e sua fixação se dá em duas fases. Na primeira fase fixa-se a multa levando-se em conta a reprovabilidade da conduta, a multa entre 40 e 100 dias-multa. Na segunda fase, será levado em conta a capacidade econômica do agente, o valor do dia-multa irá variar de 1/30 do salário-mínimo até três vezes o valor do salário-mínimo.
Conforme estabelece o art. 30 da Lei 11.343/2006, a prescrição desse crime é de 2 anos. Esse prazo é aplicável tanto à prescrição da pretensão punitiva como também à prescrição da pretensão executória. Observa-se, portanto, que se trata de uma exceção à regra prevista no Código Penal.
j) Figura equiparada – art. 28, §1º da Lei 11.343/2006: o artigo 28, §1º prevê o mesmo tratamento penal dado ao crime do artigo 28 a quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica para consumo pessoal. Caso plante para venda ou entrega a terceiro, incidirá nas penas do artigo 33, §1º, II, do mesmo diploma legal, que se equipara ao tráfico.
k) Rito processual: a ação é pública incondicionada. O processo, por sua vez, segue o procedimento sumaríssimo, uma vez que se trata de menor potencial ofensivo, sendo competente para o julgamento do crime Juizado Especial Criminal.
2) Tráfico ilícito de drogas (art. 33 da Lei 11.343/06): a terminologia “tráfico de drogas” não existe na lei estudada, sendo tal nome dado pela doutrina. Segundo entendimento da doutrina, o tráfico de drogas engloba tanto os crimes previstos no art. 33, caput, quanto no art. 33, § 1º, e no art. 34. Cumpre destacar que o art. 33, caput, contempla 18 núcleos, tratando-se de um tipo misto alternativo, também conhecido como crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. Dessa forma, se o autor praticar duas ou mais condutas referentes ao mesmo objeto material (mesma droga), ele responderá por um único crime. No entanto, se as condutas forem praticadas contra drogas diversas, estará caracterizado o concurso de crimes.
a) Sujeito ativo: esse crime é considerado comum ou geral, uma vez que pode ser praticado por qualquer pessoa, não se exigindo qualidade especial do agente. No entanto, parte da doutrina entende que, no tocante às condutas prescrever e ministrar, o crime é próprio, uma vez que somente o profissional da saúde pode prescrever ou ministrar a droga.
É importante mencionar que se admite a coautoria e a participação em todas as condutas típicas descritas.
Caso o agente pratique o crime prevalecendo-se de sua função pública, ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância, as penas serão aumentadas de 1/6 a 2/3.
b) Sujeito passivo: o sujeito passivo imediato é a coletividade, uma vez que é o titular do bem jurídico. O sujeito mediato, por sua vez, é o Estado.
c) Objeto: c.1) objeto jurídico: o bem jurídico protegido é a saúde pública.
c.2) Objeto material: é a droga.
d) Núcleos do tipo:
d.1) Importar: introduzir no território nacional;
d.2) Exportar: enviar para fora do território brasileiro;
d.3) Remeter: enviar de um lado para outro, dentro das fronteiras nacionais e sem acompanhar a mercadoria enviada;
d.4) Preparar: compor, aprontar para consumo, obter algo por meio da composição de elementos;
d.5) Produzir: fabricar, elaborar, fazer algo que não existia;
d.6) Fabricar: produzir em maior escala, valendo-se de equipamentos e máquinas próprias;
d.7) Adquirir: incorporar ao patrimônio; é a aquisição a qualquer título, oneroso ou gratuito;
d.8) Vender: alienar mediante um preço;
d.9) Expor à venda: exibir para fins de alienação;
d.10) Oferecer: ofertar, mostrar, disponibilizar gratuita e onerosamente;
d.11) Ter em depósito: manter armazenado, conservar em algum lugar;
d.12) Transportar: levar de um lugar para outro mediante o uso de algum veículo ou meio de transporte, deslocar, conduzir a droga, acompanhando-a;
d.13) Trazer consigo: ter a posse ou conduzir a droga junto consigo, nas próprias vestes ou no corpo, por exemplo nos bolsos, no sapato, no ânus, etc.
d.14) Guardar: tomar conta, ter sob sua vigilância coisa de outra pessoa;
d.15) Prescrever: receitar;
d.16) Ministrar: aplicar, servir, inocular, injetar;
d.17) Entregar a consumo: passar às mãos, dar a outrem para que consuma;
d.18) Fornecer: dar, prover, propiciar o abastecimento, ainda que gratuitamente.
Por se tratar de crime de ação múltipla, caso o autor pratique duas ou mais condutas contra o mesmo objeto material (mesma droga), ele responderá por um único crime. No entanto, se as condutas forem praticadas com cargas diversas de entorpecentes, estará caracterizado o concurso de crimes.
e)Elemento subjetivo do tipo: todas as condutas relativas ao tráfico são dolosas. Implicam, também, a prova de que a vontade do agente é a entrega da droga a outrem, seja a título gratuito e oneroso.
f)Crime de perigo abstrato: com exceção do crime previsto no artigo 39 dessa Lei, todos os crimes da lei de drogas são considerados crimes de perigo abstrato. Dessa forma, a prática da conduta prevista em lei acarreta a presunção absoluta de perigo ao bem jurídico, não cabendo prova em contrário.
g)Consumação e tentativa: a consumação do delito se dá no momento em que o agente realiza a conduta típica. Algumas condutas previstas no artigo 33 são crimes instantâneos, como, por exemplo, vender adquirir, oferecer etc. Por outro lado, outras condutas constituem delitos permanentes, como nos verbos transportar, trazer consigo, guardar, ter em depósito etc. Nessas últimas condutas, a consumação se prolonga no tempo, sendo que, durante todo o período em que o autor estiver com a droga, o crime estará em plena consumação, de modo que a prisão em flagrante será possível em qualquer momento.
É importante destacar que é possível a prisão em flagrante do proprietário da droga quando ela for encontrada em sua residência, mas ele estiver em outro local, já que as condutas guardar e ter em depósito constituem crime permanente. Convém ressaltar, também, que a jurisprudência entende que é dispensável o mandado de busca e apreensão quando se trata de flagrante de crime permanente, como é o caso do tráfico ilícito de entorpecentes nas modalidades citadas, desde que haja fundadas razões de que o crime esteja ocorrendo no interior da residência.
A tentativa, por sua vez, é possível. Entretanto, na prática, dificilmente o crime ocorrerá na forma tentada, haja vista que o legislador tipificou como infração autônoma, inúmeras condutas que normalmente seriam meros atos preparatórios de condutas ilícitas posteriores, como, por exemplo, preparar substância entorpecente com o fim de vendê-la.
h)Elemento normativo: a conduta deve ser praticada sem autorização ou ainda em desacordo com a determinação legal ou regulamentar para se configurar tráfico. Nesse caso, será necessário um juízo de valor por parte do juiz, de acordo com o caso concreto, no sentido de se verificar se o agente possui autorização ou se ele respeita os limites da regulamentação.
i) Flagrante preparado: ocorre quando alguém (particular ou autoridade policial), de forma insidiosa, instiga o agente à prática do delito com o objetivo de prendê-lo em flagrante, ao mesmo tempo em que adota todas as providências para que o delito não se consume.
De acordo com a Súmula 145 do STF: “Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.” Ocorre que duas situações em relação ao tráfico devem ser diferenciadas. Se tratarmos da conduta “vender” não haverá crime, por se tratar de crime impossível. Contudo, no tocante à conduta “ter em depósito”, o crime será considerado permanente, ou seja, se consuma no tempo independente da conduta do policial. Nesse caso, o flagrante será considerado válido.
j) Dosimetria da Pena: a pena prevista para esse crime é de reclusão de cinco a quinze anos e pagamento de quinhentos a mil e quinhentos dias-multa.
Nos termos do artigo 42 dessa Lei, o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta do agente.
No que concerne à pena de multa, o art. 43 prevê que o juiz estabelecerá, para cada dia-multa, valor não inferior a um trinta avos nem superior a cinco vezes o maior salário-mínimo, analisando, para isso, as condições econômicas dos acusados. No caso do juiz considerar a pena de multa ineficaz, tendo em vista a situação econômica do acusado, poderá aumentá-la até o décuplo.
Em caso de concurso de crimes, seja formal ou material, as penas de multa serão cominadas sempre cumulativamente.
É importante mencionar que o STF, no julgamento do HC 111.840/ES de 27 de junho de 2012, decidiu que o art. 2º, §1º da Lei 8.072/90, que fixa o regime inicial para o tráfico como fechado, independente do montante da pena, seria inconstitucional, por ferir o princípio constitucional da individualização da pena. Dessa forma, mesmo para os crimes hediondos, tráfico de drogas, terrorismo e tortura, o regime inicial só poderá ser fechado nos casos em que a pena fixada na sentença não for menor do que 8 anos, se o condenado for reincidente ou se as circunstâncias do caso concreto recomendarem uma gravidade diferenciada daquele crime específico, o que deverá constar expressamente da fundamentação da sentença.
k)Livramento condicional: o artigo 44 prevê que só poderá ser obtido depois do cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente específico, que nesse caso refere-se àquele que já foi condenado por tráfico e que volta a cometer crime dessa mesma natureza. No que tange aos casos de delitos comuns, o livramento condicional poderá ser obtido após o cumprimento de 1/3 da pena, se o sentenciado for primário, e de ½ no caso de reincidente em crime doloso.
l)Vedações: a Lei 11.343/2006 prevê em seu artigo 44, que o crime de tráfico de drogas e seus equiparados são insuscetíveis de sursis, graça anistia e indulto. Além disso, a lei proíbe a concessão de fiança e liberdade provisória, de modo que o autor preso em flagrante por tráfico deverá permanecer acautelado até a sentença. Caso haja excesso de prazo, existe a possibilidade de relaxamento da prisão. Cabe frisar que com o advento da Lei 11.464/2007, que deixou de proibir a liberdade provisória para crimes hediondos, passou-se a entender que é cabível a concessão para o crime de tráfico, apesar da vedação expressa prevista na lei especial.
m) Ação penal: é pública incondicionada, sendo seguido o procedimento próprio previsto na Lei 11.343/2006.
3) Tráfico privilegiado (art. 33 §4º da Lei 11.343/06)
Nessa modalidade de crime, para que o autor seja beneficiado pela modalidade tráfico privilegiado, faz-se necessária a coexistência de quatro requisitos: a) que o agente seja primário; b) que o agente tenha bons antecedentes; c) que o agente não se dedique às atividades criminosas; d) que o agente não integra organização criminosa. Tais encargos são cumulativos e subjetivos, bem como não dizem respeito ao crime, mas sim ao criminoso, quais sejam:
- Primariedade: o acusado que pratica determinado crime não poderá ter, para si, à época do fato delituoso, sentença condenatória transitada em julgado referente à prática de outro crime.
- Bons antecedentes: o conceito é dado por exclusão, é portador de bons antecedentes aquele que não tiver contra si maus antecedentes.
- Não se dedicar às atividades criminosas: significa que o acusado deve desenvolver atividade laborativa lícita, e não dedicar-se a atividades criminosas.
- Não integrar organização criminosa: o autor não deve integrar organização criminosa, cujo conceito adotado no artigo 1º, §1º da Lei 12.850/13 assim define: “considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.”
Com o objetivo de determinar o quantum de diminuição da pena, o juiz deve se valer dos critérios constantes no art. 42 da Lei de Drogas, quais sejam: a natureza e quantidade da droga, a personalidade e conduta social do agente, tendo o magistrado plena autonomia para aplicar a redução do quantum reputado adequado de acordo com a peculiaridades do caso concreto, desde que o faça de maneira fundamentada.
Cabe frisar que a Lei 11.343/06 vedava a conversão da pena privativa de liberdade em pena restritiva de direitos. Dessa forma, caso o agente fosse condenado a uma pena de 04 anos, haja vista a causa de diminuição prevista no artigo 33 §4º, tal pena não poderia ser convertida em restritiva de direitos. Contudo, o STF, em sede de controle difuso, declarou a inconstitucionalidade parcial desse parágrafo sob a justificativa de que a proibição da conversão ofendia ao princípio da proporcionalidade, uma vez que o legislador estaria usurpando a função do judiciário de análise do caso concreto. Apesar do STF ter declarado a inconstitucionalidade em controle difuso, que tem efeito apenas entre as partes, o Senado aprovou a Resolução nº 5 de 2012, retirando a eficácia da expressão “vedada a conversão em penas restritivas de direitos”.
Cumpre ressaltar que o Plenário do STF, no julgamento do HC 118.533, ocorrido em 23.06.2016, decidiu que o tráfico acidental (eventual) não é equiparado a hediondo. Tal decisão do Plenário do STF repercutiu no STJ, com o cancelamento da Súmula 512, que possuía a seguinte redação: “A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33 §4º, da Lei 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas.”
Além disso, o artigo 112 da Lei 7.210/84 (LEP) foi alterado pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019), determinando, em seu §5º, “que não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no §4º do art. 33 da Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006.”
4) Figuras equiparadas ao tráfico (art. 33 §1º da Lei 11.343/06)
No inciso I, o objeto material não é a droga, e sim a matéria prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas. Cumpre ressaltar que não se faz necessário que o objeto tenha natureza de drogas, que contenha o princípio ativo. Portanto, considera-se matéria-prima, a substância bruta da qual podem ser extraídas ou produzidas as drogas.
Tradução Jurídica: “como assim, prof?”
Um exemplo que podemos citar é a acetona ou o éter, que podem ser usados para a preparação da cocaína.
No que se refere ao insumo, cumpre ressaltar que trata acerca do elemento participante do processo de formação de determinado produto. Apesar de não ser possível se extrair dele a droga, o insumo é utilizado para a produção da substância entorpecente quando agregado à matéria-prima.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof?”
O bicarbonato de sódio, por exemplo, que somado aos restos de cocaína, dá origem ao crack.
O produto químico, por sua vez, é substância química qualquer, pura ou composta, utilizada em laboratório no processo de elaboração da droga, sem, todavia, se agregar à matéria-prima.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Um exemplo a ser citado é a acetona, utilizada para o refino de cocaína. Cabe frisar que a matéria-prima deve ser direcionada à preparação da droga, não necessitando de serem tóxicos em si e de estarem presentes em qualquer lista do Ministério da Saúde ou similar.
A tipificação desse crime também está condicionada à demonstração de que a conduta foi executada em desacordo com o elemento normativo sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Logo, se a utilização da matéria-prima, dos insumos e dos produtos químicos for feita de acordo com a Lei nº 10.357/01, que estabelece normas de controle e fiscalização sobre produtos químicos que, direta ou indiretamente, possam ser destinados à elaboração ilícita de substâncias entorpecentes, psicotrópicas ou que determinem dependência física ou psíquica, há de ser reconhecida a atipicidade da conduta. Portanto, se alguém importar, exportar, remeter, produzir, etc, matéria-prima, insumo ou produto químico devidamente autorizado, trata-se de fato atípico.
Já no inciso II, para configurar esse delito, faz-se necessária a presença do elemento normativo “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.” Além disso, é importante ler o art. 2º da Lei 11.343/06.
Entende-se como semear, o lançamento da semente ao solo a fim de que ela germine. Tal hipótese é considerada crime instantâneo. Cultivar, por sua vez, é manter, cuidar da plantação. Nesta hipótese, trata-se de crime permanente. Por sua vez, fazer a colheita significa recolher a planta ou os seus frutos. Nesta hipótese estaremos diante de um crime instantâneo.
Para que se configure o crime, não se é exigido que a planta contenha a substância entorpecente, pois, nos termos da Lei, basta que se transforme em matéria-prima para sua preparação. Na verdade, há plantas que, em si, possuem o princípio ativo, como, por exemplo, as folhas da maconha. Nesse caso, a posse ou guarda da folha já configura o crime de tráfico na figura do art. 33. Entretanto, existem determinadas plantas que não possuem o princípio ativo, necessitando, assim, de passar por processos químicos ou outras formas de preparo para que se obtenha o princípio ativo. Nessas hipóteses, as plantas constituem matéria-prima e configura-se a figura equiparada em análise.
Ademais, verifica-se ser comum o traficante semear, cultivar, colher e obter a droga em sua forma bruta, e, após o refino, a comercialize a outros traficantes ou ao consumidor. Nessa hipótese, estaríamos diante das condutas descritas no artigo 33, caput e do art. 1º da Lei 11.343/06. No entanto, o agente deverá responder por um crime apenas, em decorrência do princípio da consunção. Nessa hipótese, o juiz levará em conta a perpetração das várias condutas para a fixação da pena-base. Resta claro que se as condutas não possuírem nexo de sucessividade, o autor responderá por dois crimes em concurso material.
Conforme estabelece o artigo 32 da Lei 11.343/06, as plantações ilícitas serão imediatamente destruídas pelo delegado de polícia, que recolherá quantidade suficiente para exame pericial, de tudo lavrando auto de levantamento das condições encontradas, com a delimitação do local, asseguradas as medidas necessárias para a preservação da prova.
No inciso III, é importante destacar que se considera local, o imóvel ou móvel, não sendo necessário o agente ser o seu dono, bastando que tenha a sua posse ou a sua simples administração, guarda ou vigilância. Cabe frisar que o art. 63 da Lei 11.343/06 estabelece que o magistrado, na sentença poderá decretar a perda de veículos, embarcações ou aeronaves utilizadas no tráfico.
Além do mais, é importante mencionar que o delito em tela estará tipificado para quem consentir na utilização de local de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, público ou particular, para que, nele, terceiro pratique o tráfico de entorpecentes. Nessa última hipótese, a conduta já seria punível como participação no tráfico exercido pelo terceiro, mas como a lei transformou tal conduta em crime autônomo, deverá ser feita a diferenciação: quem consente na utilização do local praticará o crime do § 1º, III, e quem comercializa a droga terá praticado o crime do art. 33, caput. A habitualidade, neste crime, não é requisito, sendo ele consumado com a concretização do tráfico no local.
Já o inciso IV, incluído no artigo pela Lei nº 13.964/2019, determinou que torna-se uma conduta equiparada ao tráfico de drogas, vender ou entregar drogas – ou sua matéria-prima – para agente policial disfarçado. Insta ressaltar que essa conduta engloba um tipo penal misto e alternativo, em que o agente pode vender e/ou entregar. O objeto da conduta pode ser a droga em si, sua matéria-prima, seu insumo ou produto químico para sua produção. Contudo, a entrega da substância deve ser, necessariamente, (1) para um local disfarçado e (2) sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar.
5) Induzimento, instigação ou auxílio ao uso de droga (Art. 33, §2º)
A conduta de induzir denota o convencimento a determinada pessoa a fazer o uso da droga. A instigação, por sua vez, significa que o agente reforça a ideia de fazer o uso da droga à pessoa que já pensava em fazer. Já o auxílio, constitui na ação do agente que colabora de forma material com o uso, fornecendo à determinada pessoa, materiais que facilitem o uso da droga.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Um exemplo de auxílio, seria fornecer a outra pessoa o papel para fazer o cigarro de maconha ou o cachimbo para usar o crack.
Já o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa e o sujeito passivo é toda a coletividade.
A consumação do citado crime se dá quando a pessoa a quem a conduta foi direcionada efetivamente faz uso da droga. A tentativa em tal crime é possível.
As penas para as condutas descritas no art. 33 §2º da Lei 11.343/06 devem ser fixadas de um a três anos de detenção, admitindo, dessa forma, a suspensão condicional do processo, o sursis e a substituição por pena restritiva de direitos. Tal modalidade não é considerada crime hediondo.
Para tal crime, admite-se a fiança, a liberdade provisória e o livramento condicional, que pode ser obtido com o cumprimento dos requisitos do artigo 83 do CP.
Por fim, a ação penal nesses crimes é pública incondicionada.
6) Cedente eventual (Art. 33, §3º)
O tipo penal em comento exige quatro requisitos cumulativos: oferta eventual da droga; oferta gratuita; destinatário seja do relacionamento de quem oferece a droga; e a droga seja para consumo conjunto.
Além disso, o art. 33, §3º aponta como um de seus elementos especializantes o oferecimento eventual da droga a pessoa do relacionamento do agente. Dessa forma, verifica-se que deve se tratar de pessoa conhecida, próxima ao agente, a ele ligada por meio de relação de amizade ou coleguismo, mesmo que desprovida de maior intimidade.
Tradução Jurídica: “Como assim, prof.?”
Cleosvaldo estava atoa em casa e assistiu em uma série de Televisão, um grupo de pessoas fumando maconha e ficou interessado, como sabia que seu vizinho estava vendendo esse tipo de droga, resolveu comprar para experimentar. Aproveitando que sua irmã estava em casa, e querendo companhia para compartilhar do momento, resolveu convidá-la para fumar com ele. Nesse caso, a conduta se enquadra no crime previsto no art. 33, §3º.
Além disso, o último elemento especializante constante do art. 33, §3º, diz respeito ao consumo compartilhado da substância oferecida pelo agente. Como o legislador faz uso da expressão para juntos a consumirem, tem-se aí verdadeiro especial fim de agir ofertante.
O sujeito ativo deste crime pode ser qualquer pessoa, tratando-se de crime comum. Entretanto, como já dito, faz-se necessário que seja alguém do relacionamento daquele a quem a droga é oferecida. Ademais, nesse caso, existem dois sujeitos passivos: coletividade e a pessoa a quem a droga é oferecida.
Trata-se de crime formal, cuja consumação se dá quando a droga é oferecida, ainda que não ocorra o resultado, qual seja, o efetivo consumo conjunto do entorpecente. A tentativa, por sua vez, é impossível. No caso de o agente oferecer a droga, o crime consuma-se; caso não faça, será fato atípico ou o crime previsto no artigo 28, da Lei 11.343/06.
Além do mais, trata-se de crime de menor potencial ofensivo, uma vez que a pena máxima cominada é de um ano. Em consequência disso, são cabíveis a transação penal e a suspensão condicional do processo. Outrossim, não são aplicáveis ao crime em estudo as vedações do artigo 44 da Lei 11.343/06, quais sejam, a liberdade provisória, sursis, anistia, graça e indulto. Também não são aplicáveis as causas de redução de pena do art. 33, §4º do mesmo diploma legal.
Por fim, a ação penal é pública incondicionada, devendo o processamento ser realizado no Juizado Especial Criminal.
7) Associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006)
Ao contrário do crime de associação criminosa, previsto no artigo 288 do CP, que exige a presença de pelo menos três integrantes para a sua ocorrência, na associação para fins do tráfico, o legislador impõe tão somente o número mínimo de duas pessoas.
Além disso, deve haver a intenção de cometer quaisquer dos crimes previstos nos art. 33, caput e §1º e 34 da Lei de Drogas. Outrossim, não há necessidade de existência de condutas reiteradas. Basta a estabilidade e a permanência.
Cumpre ressaltar que pode haver a configuração do crime de associação para o tráfico, sem que tenha ocorrido o tipo penal do tráfico de drogas. A mera associação com o objetivo de comercializar drogas já configura o crime em tela.
Ademais, é importante mencionar que o crime previsto no artigo 35 da Lei 11. 343/06 não é considerado crime hediondo e nem mesmo equiparado.
Por ser crime comum, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Já o sujeito passivo no citado crime é a coletividade.
O crime em tela é formal, consumando-se com a simples formação do grupo, ou seja, com o ato de associarem-se os agentes, animados pelo desígnio especial presente no tipo, independente de qualquer prática criminosa subsequente.
A tentativa na associação é inadmissível, uma vez que os atos anteriores à ação de associar-se constituem simples atos preparatórios, e não início de execução.
A pena prevista para o citado crime é de reclusão de 3 a 10 anos e 700 a 1.200 dias-multa.
Conforme previsto no artigo 44 da Lei 11.343/06, o crime em estudo é insuscetível de fiança e liberdade provisória, não podendo, ainda, conceder sursis ao condenado. Além disso, ao condenado não pode ser concedido anistia, graça ou indulto. Como já dito anteriormente, também se vedava a substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Ocorre que o STF declarou a inconstitucionalidade dessa parte do art. 44 ao julgar o HC 97.256/RS, em setembro de 2010. Dessa forma, caso a pena fixada não seja superior a 4 anos, será possível a substituição da pena por pena restritiva, na forma do art. 44, I do Código Penal.
O parágrafo único do art. 44 da Lei 11.343/06 traz a previsão de livramento condicional ao condenado neste crime, desde que já tiverem cumprido dois terços da pena e não sejam reincidentes específicos.
Cabe frisar, por fim, que após o advento da Lei 11.464/2007, entende-se que não se justifica a vedação da liberdade provisória no crime em apreço. A ação penal nesse caso é pública incondicionada.
8) Informante colaborador (art. 37 da Lei 11.343/2006)
Para que esse crime seja configurado, não basta simples colaboração com o tráfico, exigindo-se que se trate de informante colaborador de grupo, organização ou associação voltados para o tráfico.
O autor desse crime não faz parte efetivamente do grupo, mas passa informações aos seus integrantes. Caso o informante integre o grupo, estando associado aos demais integrantes, responderá pelo delito de associação ao tráfico. Trata-se de forma especial, menos grave, de participação.
O citado crime tem como sujeito ativo qualquer pessoa. Já o sujeito passivo é a coletividade.
O crime se consuma com o fornecimento da informação ao grupo. A tentativa não é admitida.
Este crime é punido com pena de 2 a 6 anos de reclusão e 300 a 700 dias-multa. Para que seja concedido o livramento condicional, o condenado neste crime terá que cumprir dois terços da pena e não ser reincidente específico.
Por fim, a ação penal para esse crime é pública incondicionada.