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Tradicionalmente o Direito (as regras que regem o convívio dos seres humanos em sociedade) é dividido em dois grandes ramos: o Direito Público e o Direito Privado. O Direito Público, como o próprio nome já diz, é o ramo do Direito que regula preponderantemente as relações jurídicas (atos, contratos, medidas…) realizadas pelo ente público/ente estatal. O Direito Privado, por sua vez, é o ramo do direito que regula as relações jurídicas travadas por dois particulares (privados).

O Direito Público é marcado pela característica da desigualdade: o ente público, haja vista que busca atender a coletividade, possui mais poderes do que o particular (supremacia do interesse público frente ao privado). O Direito Privado, por sua vez, é marcado pela igualdade, uma vez que em uma relação existente entre particulares ambos possuem os mesmos direitos e estão em pé de igualdade.

Desse modo, o grande ramo do Direito Privado regula as relações privadas entre os indivíduos e,  dentro desse grande ramo, encontram-se inseridas diversas áreas do Direito, tais como Direito Civil que regula questões patrimoniais, obrigacionais e familiares

Princípios do Código Civil/02

Eticidade: esse princípio decorre do princípio da boa-fé objetiva, que é modelo de conduta social onde impera a honestidade, lealdade e a  confiança e possui as funções de interpretação (art. 113, CC), controle (art. 187, CC) e integração (art. 422, CC) e significa que os indivíduos devem agir em boa-fé nas relações de caráter civil.

De acordo com esse princípio, um indivíduo deve ser íntegro, leal, honesto e justo.

Sociabilidade: preconiza a prevalência dos valores sociais sobre os individuais, observados os limites impostos pelo respeito aos direitos fundamentais. Marca a superação do caráter individualista do Código Civil de16.  

EXEMPLIFICANDO

Princípio da função social do contrato, da propriedade.

Operabilidade: esse princípio objetiva a facilitação da aplicação (efetividade) e simplificação das normas civis. Esse princípio impõe soluções viáveis, operáveis e sem grandes dificuldades na aplicação do direito. A regra tem que ser aplicada de modo simples.

EXEMPLIFICANDO

Princípio da concretude pelo qual deve-se pensar em solucionar o caso concreto de maneira mais efetiva. O direito existe e deve ser aplicado e deve ser efetivado.

TRADUÇÃO JURÍDICA

Função Social do Contrato: trata acerca da relação dos contratantes com a sociedade, pois o contrato produz efeitos perante terceiros. Significa que no contrato, as partes estão em posição horizontal, devendo agir com boa-fé objetiva, cooperação, honestidade e lealdade.

Exemplo: Gabriela adquiriu um apto por contrato, mas o terreno estava hipotecado e o construtor não pagou o financiamento. O agente financeiro irá conceder a escritura do apartamento para Gabriela porque a hipoteca não atinge o adquirente, em razão da Súmula 308 Superior Tribunal de Justiça.

SÚMULA 308

A HIPOTECA FIRMADA ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE FINANCEIRO, ANTERIOR OU POSTERIOR À CELEBRAÇÃO DA PROMESSA DE COMPRA E VENDA, NÃO TEM EFICÁCIA PERANTE OS ADQUIRENTES DO IMÓVEL.

INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB)

O Decreto-lei n.º 4.657/42, antiga Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) teve a sua terminologia alterada para LINDB, posto que suas normas regulam todo o ordenamento jurídico, não só ao Código Civil. Reúne normas de sobre direito ou Lex Legum.

Desse modo, a LINDB é uma norma jurídica que visa regulamentar outras normas, composta por apenas 30 artigos nos quais aborda questões acerca da vigência da lei, aplicação da norma jurídica no tempo e no espaço e as fontes do direito, tendo como objetivo orientar a aplicação do Código Civil, diminuindo controvérsias que foram surgindo desde a sua primeira edição, em 1916.

Vigência normativa: a lei começa a vigorar em todo território brasileiro 45 dias depois de publicada, se não houver outro prazo determinado para a vacatio legis (art. 1º). Entretanto, no que tange  aos  Estados estrangeiros, a lei brasileira, quando admitida, passa a vigorar 3 meses após a publicação. § 1º – Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade de lei brasileira, quando admitida, se inicia 3 (três) meses depois de oficialmente publicada.

ATENÇÃO

As correções que forem feitas em lei já em vigor são consideradas lei nova. Se a correção for operada entre a publicação e a vigência, o prazo de vacatio legis começa a correr da publicação da correção (art. 1º, §§3º e 4º).

TRADUÇÃO JURÍDICA

Vacatio Legis: trata-se de um termo jurídico, de origem latina, que significa vacância da lei, ou seja, “a Lei Vaga”, que é o período que decorre entre o dia da publicação de uma lei e o dia em que ela entra em vigor, isto é, que tem seu cumprimento obrigatório.  Esse período de 45 dias é estabelecido para que haja um período de assimilação da nova lei que entrará em vigor depois do prazo determinado.

A norma, durante o período da vacatio legis, apesar de válida, ainda não é vigente.

Exemplo de período de vacância diferente dos 45 dias: podemos citar a vacância do Novo Código de Processo Civil, que em seu artigo 1.045 dispôs que somente passou a vigorar após 1 (um) ano da sua data de publicação.

Princípio da continuidade das normas: a lei, não se destinando a vigência temporária, vigora até que outra a modifique ou revogue. Portanto, só a lei pode revogar a lei. Esta não pode ser revogada por decisão judicial ou por ato do Poder Executivo. A revogação pode ser expressa ou tácita, total (ab-rogação) ou parcial (derrogação).

 

TRADUÇÃO JURÍDICA

A revogação é o fenômeno pelo qual uma lei perde a sua vigência. 

Ab-rogação: é a supressão total da norma anterior.

Derrogação: torna sem efeito uma parte da norma.

A revogação pode ser, ainda expressa ou tácita:

  • Expressa:quando o elaborador da norma declarar a lei velha extinta em todos os seus dispositivos ou apontar os artigos que pretende retirar.
  • Tácita:quando houver incompatibilidade entre a lei nova e a antiga, pelo fato de que a nova passa a regular inteiramente a matéria tratada pela anterior. Se a lei nova apenas estabelecer disposições gerais ou especiais, sem conflitar com a antiga, não a revogará (LICC, art. 2º, § 2º).

Repristinação: ocorre quando uma lei revogada volta a viger em razão da lei que lhe revogou ter sido revogada.

EXEMPLIFICANDO

Lei A revoga lei B. Posteriormente, lei B é revogada pela lei C. A repristinação ocorreria se a lei A voltasse a viger após a promulgação da lei C. Esse efeito é somente admitido se houver previsão expressa na lei, não ocorrendo de forma automática.

Para essa questão, devemos ir até a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro que irá nos orientar. Vejamos o que ela diz em seu artigo 2°: 

Art. 2° Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. 

§ 1° A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. 

§ 2° A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

§ 3° Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.”

Com isso nós vemos que, no direito brasileiro, não existe repristinação automática. Ou seja, no nosso exemplo, a lei A só voltará a ter validade caso haja disposição expressa nesse sentido. 

 

Princípio da obrigatoriedade das normas: a ninguém é dado o direito de se escusar do cumprimento da lei alegando que não a conhece . Entretanto, destaca-se que a presunção de conhecimento das leis é relativa. A FGV considerou errada a seguinte assertiva: ninguém se escusa de cumprir a lei, salvo alegando que não a conhece.

EXEMPLIFICANDO

Casamento putativo (art. 1.561, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

Camila, coitada, antes de encontrar o amor de sua vida, foi enganada! Quem nunca né meninas? Fui casada com um homem que já era casado! Mas é claro que eu não sabia disso né? Como não sabia, a lei assegura que, mesmo que esse casamento seja nulo ou anulável possa gerar efeitos para o cônjuge de boa-fé (não poderia imaginar que era cilada). Nesse caso, Gabriela não será prejudicada, tendo todos os direitos patrimoniais resguardados e irá receber todos os presentes que os pais do noivo lhe deram. Assim, Camila teve o casamento anulado, mas não saiu com as mãos abanando.

▪ Técnicas de integração da lei: quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito (art. 4º). Esse mandamento apregoa que o juiz não pode se abster de julgar por omissão da lei. Também conhecido como a proibição ao non liquet, ou ao “NÃO JULGAMENTO”. Essa ordem, em regra, é hierárquica e preferencial. No entanto, esse entendimento segue uma linha clássica do Direito Civil e, como o atual direito privado é constitucionalizado, há exceções a essa regra. Os princípios constitucionais, devido  a sua eficácia horizontal, são utilizados sem obedecer a essa ordem, podendo, ter aplicação antes de todas as outras formas de integração.

A analogia é a possibilidade de o juiz, analisando o caso concreto e verificando que não existe lei a ser lhe aplicada, utilizar leis similares estendendo o campo de atuação dessas normas.

EXEMPLIFICANDO

É o que ocorre com a aplicação do art. 499 do Código Civil. Nele está previsto a licitude da venda de bens entre cônjuges quando esses bens estiverem fora da comunhão. Num caso concreto envolvendo união estável, o juiz pode aplicar o art.499, por analogia, aos companheiros também permitindo a venda.

Analogia pode ser legis, quando houver uma disposição legal específica para a situação similar, ou juris, quando a análise é realizada em relação ao ordenamento jurídico como um todo.

Costumes são práticas reiteradas e lícitas que dão ao aplicador do direito, na falta de lei regendo o caso concreto, um embasamento para resolver determinada questão. O costume integrativo é somente o praeter legem, na falta de lei

EXEMPLIFICANDO

Sem dinheiro, nem cartão de crédito, Marilda, passeando no shopping fica tentada a comprar um lindo par de sapatos. Ela quer muito comprar e a única alternativa é passar um cheque pré-datado para 30 e 60 dias. Veja: Marilda não tem dinheiro na conta para compensar o cheque. Mas para resolver esse problema, os costumes do comercio criaram a figura do cheque pré-datado. É um acordo entre o lojista e o consumidor, o qual o lojista se compromete a, numa determinada data (pré-datada), descontar o cheque no banco, transformando um pagamento à vista em um pagamento futuro.

Princípios gerais do direito são mandamentos básicos com valor de norma que auxiliam o operador do direito a resolver questões em que a lei sozinha não dá conta para que se atinja a justiça e a pacificação social.

ATENÇÃO

A equidade aplica-se apenas nos casos previstos em lei.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Não confunda “julgar com equidade” com “julgar por equidade”. A primeira se refere ao dever do juiz de ser imparcial e estabelecer a paridade, resultando em um processo isonômico; a segunda é o juiz utilizar os princípios gerais do direito para fins de integração da norma nas situações de lacunas  da lei.

Aplicação da lei no tempo: a lei em vigor tem efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (princípio da irretroatividade, art. 6º).

Portanto, a lei entra em vigor e não atinge os fatos pretéritos (que já aconteceram) antes de sua entrada em vigor, somente produzirá efeitos a partir da entrada em vigor. Contudo, existem exceções como é o caso da abolitio criminis do adultério. Nessa situação, ocorre a abolição do crime, ou seja, quando nova lei penal descriminaliza fato que a lei anterior considerava como crime. Nessa situação específica a lei nova que abole o crime, retroage e atinge atos do passado para fins de beneficiar o réu.

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.

3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.

Quando da entrada em vigor do Código Civil/02, ficou estabelecido que, quanto à existência e à validade dos negócios jurídicos, se aplicaria a lei em vigor à época da celebração, e quanto à eficácia, a lei vigente atual (art. 2.035, CC).

EXEMPLIFICANDO

Um determinado negócio jurídico, que foi celebrado na vigência do Código de 1916, continuará a existir e será válido, mesmo na vigência do Código de 2002, e, apenas quanto à eficácia (produção de efeitos), é que esse negócio será regido pelo Código atual. Entendendo melhor, um famoso ator da Globo firmou contrato de exclusividade na vigência do Código de 1916 em janeiro de 1998. Em janeiro de 2004 o ator rompeu o contrato, o que fez com que a Globo lhe cobrasse multa contratual de 30 milhões de reais. No entanto, o Código de 2002 veda cláusulas onde há onerosidade excessiva (quando uma das partes tem que pagar valores tão altos que se tornam desproporcionais a valor total do contrato). Como em janeiro de 2004 o código em vigor era o atual e as multas se localizam no plano da eficácia do negócio, o juiz terá que reduzir a multa para valores proporcionais condizentes com o novo Código.

Princípio da retroatividade motivada: esse princípio consiste que as normas de ordem pública que se referem à função social da propriedade e dos contratos podem retroagir. Ou seja, nenhuma convenção prevalecerá se contrariar os preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos pelo CC para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

EXEMPLIFICANDO

Súmula 205, STJ – a Lei 8.009/90 (impenhorabilidade do bem de família) aplica-se a penhora realizada antes de sua vigência.

Aplicação da norma no espaço: adotou-se o princípio da territorialidade moderada ou mitigada, pois em algumas situações admite-se a aplicação de lei estrangeira em território brasileiro ou de lei brasileira em território estrangeiro.

Estatuto pessoal: para direitos da personalidade, nome, capacidade e família, aplica-se a lei do domicílio da pessoa.

A lei do primeiro domicílio conjugal será aplicada para os casos de invalidade do matrimônio e regime de bens, caso os nubentes tenham domicílios diversos (art. 7º, §3º).

Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem (art. 9º), é a regra do locus regit actum (o ato é regido pelo lugar).

A autoridade judiciária brasileira é competente para julgar o réu domiciliado no Brasil ou se aqui tiver que ser cumprida a obrigação (art. 12).

Além disso, a LINDB prevê regras específicas para: (a) bens imóveis aplica-se a lei do lugar onde situados; (b) bens móveis, aplicando-se a lei do domicílio do seu titular; (c) contratos, a lei do lugar de residência do proponente; (d) caso de falecimento de estrangeiro com herdeiros no Brasil, aplica-se a lei de sucessão que for mais favorável a esses.

Disposições sobre segurança jurídica e eficiência na criação e aplicação do direito público: foram incluídas entre os art. 20 a 30 na LINDB por meio da Lei n.º 13.655/18. Tais regras não se aplicam as relações de direito privado.

PESSOA FÍSICA E PERSONALIDADE

Personalidade

A personalidade é o atributo e a aptidão de contrair direitos e deveres na ordem jurídica, a qual toda pessoa é dotada (v. art. 1º, CC). É a qualidade de ser pessoa (ADI 3510). Cumpre destacar que, afirmar que o homem tem personalidade é o mesmo que dizer que ele tem capacidade para ser titular de direitos, no entanto, embora se interpenetrem, a personalidade e a capacidade não se confundem, uma vez que a capacidade pode sofrer limitação, enquanto a personalidade é um valor.

EXEMPLIFICANDO

É possível ser mais ou menos capaz, mas não se pode ser mais ou menos pessoa.

Aquisição da personalidade: a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (art. 2º, CC).

Há três teorias principais sobre o início da personalidade:

(a) Teoria natalista: a personalidade tem início com o nascimento com vida. Assim, para essa teoria o nascituro não é considerado pessoa, não possuindo direitos, mas apenas mera expectativa. É a teoria adotada pelo CC/02.

(b) Teoria da personalidade condicional: para os adeptos dessa teoria, a personalidade civil tem início com o nascimento com vida e os direitos do nascituro ficam sujeitos a essa condição suspensiva, configurando direitos eventuais.

(c) Teoria concepcionista: para essa teoria a personalidade tem início com a concepção, portanto o nascituro (feto ou embrião) é sujeito de direitos. É a teoria que PREVALECE atualmente na doutrina, na jurisprudência, e no direito internacional dos direitos humanos.

EXEMPLIFICANDO

Visualize a seguinte situação: Paula , dirigindo seu carro, se envolve em um acidente que resulta  no aborto do feto de 3 meses, que estava esperando. Paula terá direito de ser indenizada pelo DPVAT pela morte do nascituro?

Agora leia novamente o art. 2º do Código civil e o analise só pela letra da lei, adotando a teoria natalista, sem levar em conta a dignidade da pessoa humana. A morte do feto não daria direito à Paula ser indenizada, pois não seria o “feto” sujeito de direito, pois ainda não seria pessoa, tendo apenas expectativa de direito.

Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Porém, o STJ decidiu que a beneficiária legal de seguro DPVAT, que teve a sua gestação interrompida em razão de acidente de trânsito tem direito ao recebimento da indenização prevista no art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, devida no caso de morte.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.415.727-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/9/2014 (Info 547).

Em relação ao nascituro, já se reconhece: o direito à imagem; direitos de cunho existencial; direito a alimentos gravídicos; direito de indenização aos pais em razão de morte culposa por acidente de trânsito. Cabe destacar que os direitos patrimoniais ficam condicionados ao nascimento. Os embriões têm direito à sucessão (art. 1.798, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

Nascituro é o ente concebido no ventre materno.

Capacidade

As normas que regem a capacidade civil sofreram substancial alteração com a promulgação do Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD), Lei n.º 13.146/15, a exemplo do art. 3º, CC, que teve todos os seus incisos revogados. Antes de tratar desse assunto, é necessário diferenciar a capacidade de direito, que é atributo de toda pessoa (art. 1º, CC), da capacidade de fato que se refere ao exercício dos atos da vida civil, sem que haja necessidade de assistência ou representação. A capacidade plena é a conjugação das capacidades de direito + de fato.

Art. 1 o Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

A incapacidade é uma limitação legal para o exercício de determinados atos da vida civil.

Teoria das incapacidades (art. 3º e 4º, CC): atualmente, é somente considerado absolutamente incapaz o menor de 16 anos. Já os relativamente incapazes são: (a) os maiores de 16 e menores de 18 anos; (b) os ébrios habituais ou viciados em tóxicos; (c) aqueles que, por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade; (d) os pródigos. Ato praticado por relativamente incapaz pode ser anulável, já o ato praticado pelo absolutamente incapaz é nulo de pleno direito (art. 166, inc. I).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Pródigo é aquele que dissipa seus bens, que gasta mais do que o necessário; gastador, esbanjador, perdulário.

EXEMPLIFICANDO

Marta é um sério problema para sua família. O dinheiro que ganha vai todo para compras supérfluas ao ponto de não ter mais nenhum patrimônio. Uma vida completamente voltada ao gasto incontrolável. Marta é pródiga, o que é considerado um distúrbio mental. Nesse caso, a família pode anular vendas e demais negócios jurídicos firmados por ela.

ATENÇÃO

A capacidade dos indígenas deve ser regulamentada por legislação especial (FUNAI).

O art. 6º do EPD apresenta uma série de direitos relativos à capacidade civil que não são afetados pela deficiência, ligados principalmente a formação de família e aos direitos sexuais e reprodutivos. Ainda dentro da estrutura do EPD, é importante diferenciar os institutos da curatela e da tomada de decisão apoiada. A curatela de pessoa com deficiência é medida extraordinária, devendo durar o menor tempo possível e ser proporcional às necessidades da pessoa. Contudo, é facultado a pessoa com deficiência adotar o processo de tomada de decisão apoiada, no qual elegerá 2 pessoas idôneas da sua confiança para lhe prestar apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, em processo no qual o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, deverá ouvir o MP, o requerente e as pessoas que pretendem ser apoiadoras. No termo a ser firmado, deverão ser estipulados os limites do apoio e os compromissos dos apoiadores. Os efeitos do instituto estão previstos no art. 1.783-A, CC.

Término da incapacidade: cessa a incapacidade com o término do seu fato gerador. Se a causa é etária, a cessação se dá pelo alcance da maioridade. Se a causa é de outra natureza, ocorre quando a pessoa recupera o seu poder de autodeterminação.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

A principal diferença entre tutela e curatela é a idade. O primeiro é atribuído aos menores de idade até a chegada a maioridade. Já a curatela confere-se aos maiores de 18 anos, normalmente pessoas com deficiência ou idosos. Além disso, também há diferentes motivações para a nomeação do tutor e do curador. Por exemplo, o tutor fica encarregado do menor em caso de falecimento dos genitores. Se o filho, maior de idade, for viciado em tóxicos e os pais ainda estiverem vivos, o processo de interdição pode ser aberto.

A emancipação é hipótese na qual a cessação da incapacidade do menor de idade será antecipada, porém o menor emancipado não deixa de ser menor. Nesse sentido, o menor antecipado continua protegido pelo Estatuto da criança e do adolescente – ECA, bem como não pode tirar carteira de motorista, frequentar bares e casas noturnas, ingerir bebidas alcóolicas e todas as outras proibições no âmbito penal.

São espécies de emancipação:

a)Voluntária e judicial: ocorre pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, por instrumento público registrado em cartório, dispensada a homologação judicial (voluntária). Em caso de falecimento de um dos pais, por exemplo, somente basta a autorização do sobrevivente para que o ato possa ser realizado. .

A emancipação judicial ocorre por meio de sentença, em duas hipóteses:

A primeira é quando um dos pais não concordarem em emancipar o filho. Neste caso, o juiz decidirá a pendência.

Já a segunda possibilidade é se o menor, com mais de 16 anos, estiver sob assistência de tutor. Como este não tem poderes para emancipar o adolescente, porque não tem poder familiar ou parental, deverá requerer ao juiz.

A emancipação judicial, ou por sentença, ocorre quando ouvido o tutor do menor de idade que já tiver 16 anos (judicial). Se os pais não concordarem sobre a emancipação, o juiz poderá concedê-la, sob a ótica do princípio do melhor interesse.

ATENÇÃO

A emancipação não isenta os pais da responsabilidade civil por eventual ato ilícito praticado pelo filho.

OBS: voluntaria -> é pais concedem;

Judicialè -> juiz concede por sentença.

EXEMPLIFICANDO

Os pais de Davi resolvem o emancipar quando ele completa 17 anos, por meio de instrumento público registrado no cartório de registros civis de pessoas naturais; ocorre que, algumas semanas depois de emancipado, Davi humilha um desafeto em suas redes sociais, o que o torna réu em um processo por injúria. Nesse caso, Davi é menor para todos os efeitos penais e seus pais serão responsabilizados na esfera civil pelo pagamento de indenização.

Emancipação legal: O art. 5º do Código Civil prevê quatro possibilidades de emancipação legal:

Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:

I – pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;

II – pelo casamento;

III – pelo exercício de emprego público efetivo;

IV – pela colação de grau em curso de ensino superior;

V – pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria.

(b) Pelo casamento: de acordo com a antiga redação do art. 1.520 do CC a idade núbil era de 16 anos, mas o menor de 16 anos poderia casar em caso de gravidez. Em 2018 o dispositivo foi alterado e passou a proibir absolutamente o casamento de menor de 16 anos. O divórcio não tem o condão de desfazer a emancipação, contudo, a emancipação poderá ser invalidada se o casamento foi nulo, salvo se configurar casamento putativo.

EXEMPLIFICANDO

João, com 16 anos de idade, casou-se com Ana, com 18 anos de idade, mediante a falsificação da autorização dos seus pais. Descoberta a fraude, o casamento será declarado nulo e não haverá emancipação.

(c) Outras: pelo exercício de emprego público efetivo; pela colação de grau em curso de ensino superior; ou pela existência de relação de emprego ou por estabelecimento civil ou comercial, pelo qual adolescente de 16 anos possua economia própria (receber, pelo menos, um salário mínimo.

Extinção da Personalidade da Pessoa Física

O fim da personalidade da pessoa natural se dá pela morte, que pode ser real ou ficta, e deve ser devidamente registrada em registro público.

Morte real: nos termos do art. 3º, da Lei 9.434/97/97, que dispõe sobre a remoção de órgãos, a morte real é a morte encefálica, momento em que o cérebro para de funcionar. Deve ser declarada por médico ou por 2 testemunhas.

Morte presumida (sem decretação de ausência): é declarada quando (a) for extremamente provável a morte de quem estava em perigo (art. 7º, I, CC); (b) no caso de desaparecido ou prisioneiro, se a pessoa não for encontrada em até 2 anos, após o término da guerra (art. 7º, II); (c) em relação aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva (art. 6º, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Cláudio e Bia, pai e filha, foram acampar numa região perigosa. Chovia torrencialmente, ocasionando deslizamento de terra. O local onde foi registrado o último sinal dos seus celulares foi completamente devastado pelos deslizamentos. Os bombeiros efetuaram as buscas, porém os corpos nunca foram encontrados. Dentre essas circunstâncias é exatamente o que a lei prevê: extremamente provável a morte de ambos. Já no caso de guerra, estabelece uma lógica no mesmo sentido de a morte ser altamente provável após o lapso de 2 anos sem notícias de desaparecido ou prisioneiro.

Morte presumida com decretação de ausência: é o desaparecimento da pessoa natural, sem deixar vestígios de morte real.

EXEMPLIFICANDO

Um homem foi acampar numa densa mata e nunca mais se teve notícias dele, mesmo com todas as buscas possíveis. Observe que a morte não é extremamente provável, pois não há indícios de desastre, simplesmente o homem desapareceu. Eles está em local incerto e não sabido.

Processo de decretação de ausência: pode ser deflagrado por qualquer interessado ou pelo Ministério Público, quando desaparecer uma pessoa do seu domicílio sem dela haver notícia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens. Fases:

(a) Curadoria e arrecadação dos bens: amoldando-se a situação a hipótese supra, o juiz declara a ausência e nomeia um curador para administrar os bens do ausente. Há uma ordem preferencial par ao exercício da curadoria: o cônjuge, não separado judicialmente, ou de fato por mais de 2 anos; os pais; descendentes mais próximos. A curadoria dos bens é exercida por 1 ano, que poderá ser estendido para 3 anos, se o ausente tiver deixado procurador que aceite o exercício desse encargo.

(b) Sucessão provisória: pode ser requerida pelos credores, cônjuge ou herdeiros ou, em sua falta, pelo MP, após o decurso do prazo da curadoria dos bens. A sentença que determina a abertura da sucessão provisória somente produz efeitos 180 dias depois de publicada, mas, com o trânsito em julgado, abre-se o testamento e o inventário do ausente.

O patrimônio é recebido a título precário e só pode ser alienado com alvará judicial. O sucessor provisório que não for ascendente, descendente e ou cônjuge deve prestar caução (art. 30, §2º, CC) e guardar 50% dos frutos, prestando contas anuais ao juiz (art. 33, CC).

(c) Sucessão definitiva: 10 anos depois do trânsito em julgado da sentença da abertura da sucessão provisória, poderão os interessados requerer a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas. Pode-se requerer a sucessão definitiva, também, provando-se que o ausente conta 80 anos de idade, e que de 5 datam as últimas notícias dele (art. 37 e 38, CC). 

Retorno do ausente: se retornar na 1ª fase, a administração dos bens lhe é devolvida. Se retornar na 2ª fase, o ausente terá direito ao patrimônio no estado em que deixou. Se a ausência foi voluntária e injustificada, perderá o direito aos frutos. Se retornar na 3ª fase, terá direito ao patrimônio no estado em que se encontra ou aquilo que se sub-rogou em seu lugar.

EXEMPLIFICANDO

Se a casa deixada pelo ausente foi vendida para aquisição de um apartamento, retornando o ausente terá direito ao apartamento no limite do valor da casa vendida para comprá-lo. Se o ausente retornar após 10 anos da sucessão definitiva, não terá direito a nada. Não retornando o ausente e não tendo ele herdeiros, os bens serão considerados vagos.

Comoriência: se configura quando dois ou mais indivíduos falecem na mesma ocasião, não se podendo quem morreu primeiro, há presunção juris tantum (admite prova em contrário) de que morreram simultaneamente.

DIREITOS DA PERSONALIDADE

São direitos intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária (art. 11, CC). São também absolutos, extrapatrimoniais, inatos, imprescritíveis e vitalícios. Segundo a jurisprudência do STJ, a violação a direito da personalidade configura dano moral in re ipsa.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Em nosso ordenamento jurídico, quem ajuíza ação solicitando indenização ou reparação deve provar o prejuízo que sofreu. Todavia, em algumas situações o dano moral pode ser presumido, ou “in re ipsa”. Nestes casos, basta que o autor prove a prática do ato ilícito, que o dano está configurado, não sendo necessário comprovar a violação dos direitos da personalidade, que seria uma lesão à sua imagem, honra subjetiva ou privacidade.

EXEMPLIFICANDO

Kátia sempre pagou suas contas em dia, nunca ao menos esqueceu de honrar seus compromissos, todavia, foi surpreendida com o recebimento de uma carta do Serviço de Proteção ao Crédito lhe oferecendo um acordo para pagar uma dívida de cartão de crédito e ter seu nome limpo. Ela ficou estarrecida, uma vez que não tinha o referido cartão, então procurou os órgãos responsáveis para verificar se realmente seu CPF estava negativado, e estava. Kátia aciona a empresa de cartão de crédito na justiça e não terá que comprovar que sofreu violação ao direito de personalidade, bastando simplesmente comprovar que seu nome constava nos cadastros de inadimplentes.

▪ Pilar da integridade física

a) Tutela ao corpo vivo: salvo por exigência médica, é defeso (proibido) o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes (art. 13, CC).

“Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.”

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Uma pessoa não pode vender um rim. Porém, imagine a situação em que uma pessoa que deseja trocar de sexo: nasceu no sexo masculino e deseja fazer cirurgia de adequação ao sexo com o qual ela se define, neste caso com o sexo feminino. Seria ilícito, uma vez que ela está dispondo do próprio corpo? Claro que não será ilício, pois o Conselho Federal de Medicina considera lícita tal cirurgia.

(b) Tutela ao corpo morto: é válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. A disposição pode ser revogada a qualquer tempo (art. 14, CC).

EXEMPLIFICANDO

Doação de órgãos post mortem.

(c) Autonomia do paciente: ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica (art. 15, CC).  Nessa medida, é direito de qualquer paciente, seja ele Testemunha de Jeová ou não, recusar a hemotransfusão, e este direito deve ser respeitado pelos médicos e profissionais de saúde, que não devem coagi-lo a fornecer qualquer tipo de “autorização” e /ou “declaração” em desacordo com suas convicções pessoais. Testamento vital: declarações firmadas por pessoas que desejam restringir a atuação médica por diversos motivos, seja convicção religiosa, ideológica.

EXEMPLIFICANDO

Transfusão de sangue e testemunhas de Jeová. A doutrina e jurisprudência majoritárias defendem a intervenção médica em caso de risco de vida, já que os direitos protegidos são indisponíveis.

ATENÇÃO

O médico tem o dever de respeitar a autonomia e autodeterminação do paciente, evitando a transfusão sanguínea, com a adoção de técnicas alternativas que possam garantir a autodeterminação do paciente.

Pilar da integridade psíquica

(a) Nome: toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. A proteção abarca o pseudônimo e, ainda que não haja intenção difamatória, o nome da pessoa não pode ser utilizado para publicações ou representações que a exponham ao desprezo público. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial (art. 16, 17, e 18, CC).

(b) Imagem: salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais (art. 20).

(c) Privacidade: a vida privada da pessoa natural é inviolável (art. 21, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Em programas  do tipo Reality Show como BBB, geralmente os participantes são confinados em um ambiente montado pelo canal televisivo, onde são vigiados o tempo todo e submetidos a determinadas situações e testes de resistência física ou psicológica, sendo expostos ao julgamento da opinião pública ao mostrarem-se como cada um reage em convivência com os outros indivíduos. Claramente direitos como a liberdade de ir e vir, a intimidade, vida privada e a honra ficam violados nesse programas. Mas os participantes voluntariamente se submetem a tais condições mediante contrato. Ou seja, o participante renuncia negocialmente um direito personalíssimo, que em tese seria irrenunciável, pois estará exercendo o seu direito a livre autonomia da vontade, embora que com limitações, haja vista NÃO poder renunciá-los em definitivos, mas apenas cedê-los parcial e temporariamente durante as gravações do programa.

Tutela aos direitos da personalidade: pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito de personalidade (tutela inibitória), e reclamar perdas e danos (tutela repressiva), sem prejuízo de outras sanções previstas em lei (art. 12, CC). 

Terá legitimação para requerer tutela a direito da personalidade do morto o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o 4º grau. Especificamente para a tutela do direito de palavra, imagem e escritos, os parentes colaterais do morto não são legitimados.

ATENÇÃO

Os direitos da personalidade se aplicam à pessoa jurídica quando compatíveis. Exemplos: direito ao nome, à imagem e à privacidade (segredo de empresa) são extensíveis às pessoas jurídicas. Destaca-se que a  pessoa jurídica pode sofrer dano moral (Súmula 227, STJ).

PESSOA JURÍDICA

A pessoa jurídica é um conjunto de pessoas (associação ou sociedade) ou de bens arrecadados (fundações) que adquire personalidade jurídica por uma ficção legal. Assim, o CC adotou a teoria da realidade técnica, que conjuga a teoria da ficção (Savigny) com a teoria da realidade orgânica (Girke). A pessoa jurídica não se confunde com os seus membros (princípio da separação, independência ou autonomia).

Administrador: suas decisões, quando estiverem dentro dos limites estabelecidos pelo estatuto social, vincularão a pessoa jurídica. Decai em 3 anos o direito de anular as decisões do administrador que forem viciadas por ilegalidade ou por fraude.

Classificação

Pessoas jurídicas de direito público interno: União; Estados; Distrito Federal e os Territórios; Municípios; autarquias, inclusive as associações públicas; e as demais entidades de caráter público criadas por lei.

Pessoas jurídicas de direito privado: associações; sociedades; fundações; organizações religiosas; partidos políticos; EIRELI; sindicatos.

A pessoa jurídica de direito privado adquire personalidade com a inscrição do seu ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do poder executivo (art. 45, CC). Decai em 3 anos o direito de anular a constituição por defeito do ato, contados da publicação da inscrição.

Entes despersonalizados: família; espólio; herança jacente e vacante; massa falida; sociedade de fato; sociedade irregular; condomínio. Essas entidades não são pessoas físicas nem jurídicas, mas podem demandar e ser demandas em juízo.

Desconsideração da Pessoa Jurídica

É uma medida episódica e excepcional, mediante a qual o patrimônio dos integrantes da pessoa jurídica é atingido por obrigações contraídas em nome dela. Trata-se de exceção ao princípio da separação, segundo o qual o patrimônio da pessoa jurídica e a própria pessoa jurídica não se confundem com o patrimônio de seus membros e o patrimônio deles. A medida não provoca a extinção da pessoa jurídica (despersonalização) e deve ser requerida pelo interessado ou pelo MP, não podendo ser decretada de ofício.

ATENÇÃO

A desconsideração pode também ocorrer de forma inversa, quando o sócio transferir seu patrimônio pessoal para pessoa jurídica com o objetivo de prejudicar terceiros.

O CC adota a teoria maior da desconsideração, exigindo a presença do abuso da personalidade da pessoa jurídica, pelo desvio de finalidade (com o propósito de lesar credores) ou pela confusão patrimonial, para sua decretação.

EXEMPLIFICANDO

O sócio que utiliza o dinheiro da empresa para pagar as suas contas pessoais e não mantém separada a conta da empresa da sua conta pessoal (confusão patrimonial). A Lei n.º 13.874/19 incluiu cinco novos parágrafos ao art. 50 do CC que trata da desconsideração, os quais se recomenda a leitura. Dentre as alterações promovidas, consta que a existência de grupo econômico não é suficiente para caracterizar a confusão patrimonial, sendo exigida do credor a comprovação dos requisitos que autorizam a desconsideração da personalidade jurídica e de que o devedor se beneficiou do abuso na utilização da personalidade jurídica.

Os aspectos processuais do incidente de desconsideração da personalidade jurídica são regulamentados pelos art. 133 e seguintes do CC.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Desconsideração da Pessoa Jurídica: Paulo, Júlio e Messias são sócios da empresa JC. Porém, eles costumeiramente fazem dívidas pessoais e colocam as mesmas em nome da empresa, havendo uma verdadeira confusão patrimonial. Os credores da empresa não conseguem receber porque a empresa alega que está quase falindo, porém os sócios continuam gozando de boa saúde financeira. Observe como os sócios usam a empresa para não pagar pelos bens por eles adquiridos. Nesse caso, os credores podem pedir na justiça a desconsideração da personalidade jurídica para que o patrimônio dos sócios seja usado para quitar as dívidas.

Desconsideração inversa: Jairo, dono de uma rede de supermercado,  está prestes a se divorciar. Sabendo que vai perder boa parte de seus bens, ele rapidamente transfere esses bens para uma de suas empresas, para blindar esse patrimônio e não ser alcançado pela partilha. Essa esperteza de Jairo cai por terra, pois o juiz do divórcio, pode desconsiderar a personalidade jurídica da empresa de Jairo, atual proprietária dos bens, para trazê-los para a partilha.

Extinção da Pessoa Jurídica

Voluntária ou convencional: ocorre pela realização de distrato, por vontade dos sócios.

Administrativa: ocorre nos casos em que a pessoa jurídica precisa da aprovação do Poder Executivo para funcionar, mas este denega o pedido de renovação da autorização. É o caso, por exemplo das instituições financeiras e seguradoras.

Judicial: quando é formulado o pedido de anulação da constituição da pessoa jurídica, por defeito no seu ato constitutivo, dentro do prazo decadencial de 3 anos.

Legal: nas hipóteses previstas em lei, a exemplo do exaurimento do seu fim social.

Para a regular extinção da pessoa jurídica é necessária a averbação da dissolução, a liquidação e o cancelamento da inscrição.

Associações

As associações são formadas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos (art. 53, CC). Na associação não há direitos e deveres recíprocos entre associados. Os associados devem também ter direitos iguais, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais (art. 55, CC). Para a exclusão do associado é necessário que haja justo motivo e devido processo legal.

Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

Parágrafo único. Não há, entre os associados, direitos e obrigações recíprocos.

Fundações Particulares

A Fundação resulta da afetação de um patrimônio livre e desembaraçado para uma finalidade ideal, por ato inter vivos (escritura pública) ou mortis causa (testamento). As finalidades para as quais pode ser instituída uma fundação estão previstas no art. 62, CC.

EXEMPLIFICANDO

Fundação Xuxa Meneghel.

Art. 62. Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.

Se o patrimônio transferido pela pessoa for insuficiente, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante (art. 63, CC).

Art. 63. Quando insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.

O estatuto da fundação só pode ser alterado por deliberação de 2/3 dos competentes para geri-la e representá-la, se a reforma não contrariar ou desvirtuar a sua finalidade e se for aprovada pelo MP em 45 dias, podendo o juiz suprir esse ato, a requerimento do interessado, em caso de denegação. Se a alteração não for aprovada pela maioria, a minoria vencida poderá impugná-la em 10 dias (art. 68, CC).

As fundações devem ser fiscalizadas pelo Ministério Público estadual, do respectivo Estado onde situadas.

Extinta a fundação, o patrimônio remanescente deverá ser incorporado em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante, salvo disposição em contrário no ato constitutivo (art. 69, CC).

DOMICÍLIO

Da pessoa natural: tem domicílio pessoal no local onde estabelece a sua residência com ânimo definitivo e profissional no local onde estabelece relações concernentes à sua profissão.

ATENÇÃO

Se a pessoa tiver diversas residências, considera-se seu domicílio qualquer delas.

Da pessoa jurídica: é o local onde estiver situada a sua sede; onde os credores puderem demandar o cumprimento das obrigações; das suas atividades habituais, de seu governo, administração ou direção, ou ainda aquele indicado no ato constitutivo.

BENS

Classificação dos Bens

Quanto à tangibilidade: (a) corpóreos: possuem existência material. EXEMPLOS: veículo, casa, livros, etc. (b) incorpóreos: não possuem existência material. EXEMPLOS: softwares para computador; ebook; propriedade industrial; etc.

Quanto à mobilidade: (a) Móveis: são os bens que podem ser transportados sem ser deteriorados ou destruídos. São classificados em móveis propriamente ditos; por antecipação; por determinação legal; e semoventes. Exemplos de móveis: energias que tenham valor econômico; direitos reais sobre bens móveis; direitos pessoais de caráter patrimonial; direitos autorais; etc.

b)Imóveis: não podem ser removidos ou transportados sem ser deteriorados ou destruídos.

Os imóveis conservam essa qualificação por:

“Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.”

A propriedade do solo corresponde ao espaço aéreo e ao subsolo úteis ao exercício da propriedade.. Então, quem é o proprietário do subsolo? É o proprietário do solo, mas até o limite útil. Contudo, as riquezas que estão no subsolo pertencem à União.

b.1 natureza: compreende o solo, com sua superfície, e tudo o que se lhe incorporar naturalmente, abrangendo as árvores e frutos pendentes.

EXEMPLIFICANDO

Aluvião (acréscimo de terras à propriedade imóvel, que ocorre na margem das águas correntes, ou pelo desvio das águas destas, de maneira sucessiva e imperceptível.) e avulsão (Uma forte corrente de água desmembrou parcialmente um determinado imóvel e, sua terra desmembrada se aderiu a propriedade de outra pessoa).

b.2 acessão física, industrial ou artificial: abrange tudo o que for incorporado permanentemente pelo homem ao solo. Coisas que homem incorporou ao solo de forma permanente, cuja remoção gera sua destruição, como por exemplo, uma semente lançada à terra, edifícios e construções que não podem ser retirados sem destruição de suas estruturas. São as plantações e as construções.

b.3 equiparação legal: são os “bens imóveis por força de lei”, que são direitos patrimoniais, que são bens incorpóreos, a exemplo do direito real sobre imóveis (hipoteca, enfiteuse, servidão, etc), as ações reais sobre imóveis, e o direito à sucessão aberta, que são a herança e o legado, mesmo que compostos de bens móveis, sendo irrelevante a sua natureza material. Exemplos: direitos reais sobre imóveis; direito à sucessão aberta.

Quanto à fungibilidade: (a) fungíveis, os bens móveis que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade.

EXEMPLIFICANDO

São bens fungíveis o dinheiro; saca de café. (b) infungíveis, aqueles que não podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Exemplo: um quadro de Da Vinci.

Quanto à consuntibilidade: (a) consumíveis, os móveis cuja utilização importa na sua destruição imediata, a exemplo da comida; (b) inconsumíveis, aqueles que podem ser utilizados por várias vezes, a exemplo das roupas.

Quanto à divisibilidade: (a) divisíveis, são os fracionáveis em unidades distintas e inteiras, sem importar na alteração da substância do bem ou em diminuição considerável do seu valor, a exemplo de uma saca de café; (b) indivisíveis, aqueles que não podem ser destacados em unidades ou fracionados sem diminuir substancialmente o valor do bem, a exemplo de um colar. Contudo, os bens indivisíveis podem ser assim qualificados também por disposição legal, a exemplo da herança, e pela vontade das partes.

Quanto à individualidade: (a) singulares, os bens que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais; (b) coletivos, os bens que em conjunto formam um todo homogêneo. Os bens coletivos podem ser universalidade de fato, quando formados por uma pluralidade de bens singulares, corpóreos e homogêneos pertencentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária; ou universalidade de direito, quando constitui um complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico, a exemplo do patrimônio e da massa falida.

Reciprocamente considerados: (a) principal, o bem que possui existência autônoma; (b) acessório, o bem cuja existência supõe a do principal. Princípio da gravitação jurídica: o acessório segue a sorte do principal, inclusive quanto a natureza.

Bens Acessórios

Frutos: são utilidades que a coisa principal produz de forma periódica, sem diminuir a sua substância. Podem ser naturais, industriais ou civis (ex.: aluguel). São classificados também como colhidos, pendentes, percipiendos, estantes e consumidos.

Produtos: são utilidades que não se renovam, cuja percepção diminui a substância da coisa principal. Exemplo: extração de carvão.

Pertenças: são os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro. Exemplo: o piano em um conservatório de música.

Benfeitorias: são bens acessórios que podem ser acrescidos pelo proprietário, possuidor ou detentor, a um bem móvel ou imóvel para evitar que se deteriore (necessária), para facilitar o seu uso (útil) ou para o seu aformoseamento (voluptuária). De acordo com a Lei do Inquilinato, as benfeitorias úteis e necessárias devem ser indenizadas pelo locador, podendo o locatário se valer do direito de retenção do bem, em relação a elas.

Bem de Família

É o imóvel destinado à residência da entidade familiar, sendo impenhorável por disposição expressa contida na Lei n.º 8.009/90.

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas (Súmula 364, STJ). É também impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para subsistência ou a moradia da sua família (Súmula 486, STJ).

▪ Bem de família Voluntário: é instituído por ato de vontade dos cônjuges, da entidade familiar ou de terceiro (quando ficará pendente da aceitação expressa dos cônjuges ou da entidade familiar), mediante escritura pública ou testamento, desde que não ultrapasse 1/3 do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição (art. 1.711, CC). Será inalienável e impenhorável exceto para as despesas de condomínio e para dívidas decorrentes de tributos que recaiam sobre o bem. EXEMPLO: débito de IPTU.

Dissolvida a sociedade conjugal pela morte de um dos cônjuges, o sobrevivente poderá pedir a extinção do bem de família, se for o único bem do casal. É também extinto se, morrendo ambos os cônjuges, os filhos forem maiores de idade e não sujeitos a curatela.

Legal: é considerado bem de família para a Lei n.º 8.009/90 o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar. Se possuírem mais de um imóvel, a impenhorabilidade recairá apenas sobre um imóvel e será sobre aquele de menor valor, exceto se outro tiver sido registrado. Ao contrário do bem de família voluntário, o bem de família legal é alienável, não possui limitação de valor e dispensa a individualização em registro imobiliário. Em casos excepcionais, o STJ admite o desmembramento do imóvel para fins de penhora. 

O art. 3º da Lei n.º 8.009/90 prevê exceções à impenhorabilidade do bem de família legal sendo elas: (a) por crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; (b) por pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; (c) para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; (d) para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; (e) por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens; (f) por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

ATENÇÃO

SÚMULAS IMPORTANTES:

A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora (Súmula 499, STJ).

É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família (Súmula 486, STJ).

É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação (Súmula 549, STJ).

FATOS, ATOS E NEGÓCIOS JURÍDICOS

Fato e Ato Jurídicos

Em sentido amplo, FATO JURÍDICO é o acontecimento, previsto em norma jurídica, em razão da qual nascem, se modificam, subsistem e se extinguem relações jurídicas. Portanto, é assim qualificado o acontecimento, decorrente da natureza ou de ato humano, que seja relevante para o direito. O fato jurídico é classificado em:

Fato natural ou stricto sensu: ocorre independentemente de intervenção humana. Pode ser extraordinário, a exemplo de um tsunami que devasta uma cidade, ou ordinário, como o decurso do tempo que acarreta prescrição.

DICA

Extraordinário -> extra = além do esperado. Ninguém espera uma catástrofe.

Ordinário -> significa comum, rotineiro. O passar do tempo é algo comum, ordinário, por isso a prescrição o é fato ordinário.

Fato humano ou jurígeno: decorre de uma conduta humana, em que há vontade e consciência voltada para produção de um resultado (ex. contrato, adoção). Quando os efeitos jurídicos independem da vontade, qualifica-se como ato-fato (ex. achado de tesouro). O CC subdivide os fatos jurídicos humanos em ato strictu sensu, ato-fato jurídico e negócio jurídico.

O ATO JURÍDICO, por sua vez, é aquele que depende da vontade humana. A diferenciação conceitual entre fato jurídico e ato jurídico, na concepção de Washington Barros Monteiro, é que “em sentido amplo, o primeiro compreende o segundo, aquele é o gênero de que este é a espécie. Em sentido restrito, porém, fato jurídico é acontecimento natural, independente da vontade”.

O ato jurídico lícito é a categoria que abrange o ato jurídico strictu sensu e o negócio jurídico. O ato jurídico lícito resulta da vontade humana, mas os seus efeitos se encontram predeterminados na lei.

EXEMPLIFICANDO

Reconhecimento voluntário de filiação.

Os negócios jurídicos são, portanto, declarações de vontade destinadas à produção de efeitos jurídicos queridos pelo declarante. Os atos jurídicos, em sentido estrito, são manifestações de vontade obedientes à lei, porém geradores de efeitos que nascem da própria lei.

Nessa medida, o ato ilícito é aquele contrário ao ordenamento jurídico, seja ele de natureza civil, administrativa ou penal, sendo regido no CC pelos art. 186 a 188 que tratam da responsabilidade subjetiva do agente pelos danos que causar ou por violação à boa-fé e bons costumes, e das excludentes de responsabilidade (legítima defesa, exercício regular de um direito reconhecido e a deterioração de coisa alheia para remover perigo iminente).

Negócio Jurídico

O negócio jurídico se configura com a declaração de vontade humana que objetiva criar, modificar, conservar ou extinguir relações jurídicas. Os exemplos mais característicos são os contratos e os testamentos.

DICA

Palavra-chave: vontade. Não há contrato sem vontade das partes.

Validade do Negócio Jurídico

Nos termos do art. 104 do CC, a validade do negócio jurídico requer agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, forma prescrita ou não defesa (proibida) em lei. A doutrina acrescenta ainda que o agente precisa ter legitimidade e o consentimento precisa ser válido. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 107, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Cláudia e Marcos firmam um contrato de aluguel. Para ser válido, ambos deverão ser capazes, ambos devem ter vontade livre (não estão sendo coagidos); o aluguel é atividade lícita, possível e determinada; tem forma (modo de se concretizar o negócio) de acordo com a lei.

A manifestação de vontade pode ser expressa ou tácita, se a lei não dispuser de modo contrário. O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem e não for necessária a declaração de vontade expressa (art. 111, CC).

Sobre a forma, a regra geral é de que essa é livre. No entanto, não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País (art. 108, CC).

▪ Teoria das Invalidades

O descumprimento dos pressupostos de validade do negócio jurídico acarreta a sua nulidade ou anulabilidade.

São hipóteses de nulidade absoluta o negócio jurídico: (a) celebrado por pessoa absolutamente incapaz; (b) for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; (c) o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; (d) não revestir a forma prescrita em lei; (e) for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; (f) tiver por objetivo fraudar lei imperativa; (g) a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção (art. 166, I a VII, CC). É também nulo o negócio jurídico simulado, subsistindo o que se dissimulou, se válido na substância e na forma (art. 167, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Marcos tem um apartamento, uma namorada e um relacionamento paralelo. Ele quer doar esse apartamento para uma sem a outra saber. Marcos simula, então, uma compra e venda com uma das namoradas. Isso resulta numa nulidade da compra e venda (simulação), porém o dissimulado não é nulo, ou seja, a doação não será nula.

Todavia, caso Marcos fosse casado com Luana e, caso quisesse simular uma doação para sua amante Jéssica, a doação não seria válida, já que é proibido o cônjuge casado em regime de comunhão de bens doar bens para a amante. Assim, seria nula tanto a compra e venda, quanto a doação.

Além dos casos previstos em lei, são hipóteses de nulidade relativa o negócio jurídico celebrado por agente relativamente incapaz e aquele que contém vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores (art. 171, I e II, CC).

EXEMPLIFICANDO

O país está chocado! Famoso apresentador de televisão morre e não deixa nada para a companheira! A companheira foi excluída do testamento e os advogados dos herdeiros do apresentador apresentaram um documento em que ela abre mão de toda fortuna. Porém, a companheira do apresentador diz ter prova de que foi dopada e, na sequência foi induzida a assinar tal documento. Nesse caso, temos um exemplo claro de anulabilidade do negócio, já que a companheira não está no seu juízo normal quando o assinou; devendo o negócio ser anulado.

O ato anulável atinge interesses particulares, não pode ser suscitado de ofício pelo juiz, admite ratificação e deve ser arguido no prazo decadencial de 4 anos, em regra, ou de 2 anos, quando a lei não estabelecer um prazo específico. O prazo de 4 anos é contado do dia em que se realizou o negócio para os casos de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão; do dia que cessar a coação e do dia que cessar a incapacidade.

Por outro lado, o ato nulo atinge interesse público, pode ser arguido de ofício, pelas partes, terceiro interessado e pelo Ministério Público e não admite ratificação, mas pode ser convertido (art. 170, CC).

Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:

I – por incapacidade relativa do agente;

II – por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.

EXEMPLIFICANDO

Casamento de menor de 18 anos e maior de 16 anos sem a permissão judicial. Idade núbil de 16 anos completos aos 18 incompletos do Artigo 1.517 do Código Civil, depende da autorização de ambos os pais ou dos representantes legais.

Princípio da conservação dos negócios jurídicos: nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem (art. 112, CC). É também com fundamento nesse princípio que se admite a convalidação dos negócios jurídicos anuláveis e a conversão dos nulos.

EXEMPLIFICANDO

Em uma compra e venda por escritura particular de imóvel cujo valor for superior a 30 salários, o juiz poderá converter o negócio em promessa de compra e venda, se presentes os requisitos dessa. O princípio da conservação autoriza o aproveitamento da parte válida do negócio jurídico que for declarado parcialmente inválido, se for possível separar.

ATENÇÃO

A invalidade da obrigação principal implica na invalidade da acessória, mas a destas não induz a da obrigação principal (art. 184, CC).

Eficácia dos Negócios Jurídicos

Refere-se à aptidão para produção de efeitos. Em regra, o negócio jurídico válido já produz efeitos. Contudo, é facultada a inserção de elemento acidental, acessório ou secundário para limitar a produção desses efeitos.

São elementos acidentais:

(a) Condição: é a cláusula que subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto. A condição pode ser suspensiva, quando deixa suspensos os efeitos do negócio, enquanto não implementada (EX.: Dar-te-ei um carro se passares na faculdade), ou resolutiva, quando a sua implementação faz cessar a produção de efeitos do negócio jurídico (EX.: doação em forma de subvenção periódica, que se extingue com a morte do doador).

ATENÇÃO

São condições que geram nulidade absoluta dos negócios que lhes são subordinadas as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas; as condições ilícitas, ou de fazer coisa ilícita; e as condições incompreensíveis ou contraditórias.

São condições ilícitas, dentre outras, as que privarem o negócio jurídico de todo efeito ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes (condição puramente potestativa).

EXEMPLIFICANDO

Compra e venda de imóvel, na qual o valor do contrato fique a puro arbítrio do vendedor.

As condições resolutivas, quando impossíveis, e as de não fazer coisa impossível são tidas por inexistentes.

(b) Termo: subordina o começo ou o fim dos efeitos do negócio jurídico a evento futuro e certo, podendo ser convencionado pelas partes ou estipulado pela lei. Assim, o termo pode ser inicial (dies a quo) ou final (dies ad quem). A diferença entre o termo inicial e a condição suspensiva é que essa suspende o exercício e a aquisição do direito, subordinando a eficácia do negócio a evento futuro e incerto, enquanto o termo suspende o exercício, mas não a aquisição do direito, subordinando a eficácia do negócio a evento futuro e certo. EXEMPLOS DE CLAUSULAS COM TERMO: Dar-te-ei esse imóvel após a morte do seu pai (evento futuro e certo – só não se sabe a data) ; Dar-te-ei esse carro ao completares 25 anos;

Se o negócio possui termo inicial e final, o lapso temporal entre um e outro chama-se prazo. Segundo o disposto no art. 132 do CC, os prazos são computados excluindo-se o dia do começo e incluindo o do vencimento, salvo se houver disposição legal ou convencional em contrário. Se o dia do vencimento cair em feriado, o prazo é prorrogado até o dia útil seguinte. Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência. Por fim, os prazos fixados em hora são contados de minuto a minuto.

(c) Modo ou encargo: é um ônus imposto a alguém para que essa pessoa usufrua de um benefício superior ao ônus imposto. O encargo é comum na doação, testamento e legado.

EXEMPLIFICANDO

Doação modal. Pai doa um determinado valor ao filho, mas a quantia somente poderá ser empregada para compra de um imóvel. Os institutos da evicção e do vício redibitório se aplicam à doação modal.

O encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito, salvo quando expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente, como condição suspensiva (art. 136, CC). O fato de o encargo não suspender a aquisição e o exercício do direito o diferencia da condição. Via de regra, a pessoa precisa do objeto para cumprir o encargo, como visto no exemplo supra.

Art. 137. Considera-se não escrito o encargo ilícito ou impossível, salvo se constituir o motivo determinante da liberalidade, caso em que se invalida o negócio jurídico.

Vícios ou Defeitos do Negócio Jurídico

Vícios de consentimento ou de vontade:

a)Erro ou ignorância: o agente age sob falsa percepção acerca da pessoa, do objeto ou do próprio negócio jurídico. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio (art. 138, CC). Por prevalecer o princípio da confiança não importa se o erro é justificável. Já o erro acidental (indicação da pessoa ou da coisa) não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.

Vícios ou Defeitos do Negócio Jurídico

Vícios de consentimento ou de vontade:

a)Erro ou ignorância: o agente age sob falsa percepção acerca da pessoa, do objeto ou do próprio negócio jurídico. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio (art. 138, CC). Por prevalecer o princípio da confiança não importa se o erro é justificável. Já o erro acidental (indicação da pessoa ou da coisa) não viciará o negócio quando, por seu contexto e pelas circunstâncias, se puder identificar a coisa ou pessoa cogitada.

O Erro escusável ou perdoável é aquele que dentro do que se espera do homem médio que atue com grau normal de diligência. Ou seja, não se admite a alegação de erro por parte daquele que atuou com acentuado grau de displicência, pois o direito não deve amparar o negligente.

O art. 139 do CC apresenta as hipóteses em que o erro é substancial: I – interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais (EXEMPLO: comprar um metal qualquer pensando ser ouro); II – concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante (EXEMPLO: casar com uma pessoa viciada em jogos, sem saber desse vício); III – sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico(EXEMPLO: dono de uma padaria locatário deste imóvel que aceita um novo contrato com valores bem maiores, achando que já tinha perdido o prazo para a ação renovatória -> ação que o locatário tem direito para continuar o contrato de locação).

O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante (art. 140), desde que seja a causa determinante da realização do Negócio jurídico

EXEMPLIFICANDO

Aluga um imóvel para instalar um restaurante, pressupondo que em frente terá uma escola, quando na verdade isto não ocorre

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Célio, quer presentear a filha Amanda com um carro zero, porém no dia de entregar o presente percebe que é aniversário de seu filho Jonas. Isso não é capaz de anular a compra e venda.

Espécie: As hipóteses de erro substancial estão enumeradas no art. 139, do CC e segundo Roberto de Ruggiero (2005, p. 341) o erro substancial se caracteriza por uma das seguintes modalidades:

Error in negotio: falsa representação intelectual relativa à natureza do negocio jurídico celebrado.

EXEMPLIFICANDO

O agente pensa que o imóvel lhe está sendo entregue a titulo de comodato e na realidade se trata de contrato de locação.

Error in corpore: situação em que se declara que quer comprar o animal que está diante de si, mas acaba levando outro, trocado.

Error in substantia: o agente desconhece algumas qualidade ou características essenciais, por exemplo: alguém adquire um aparelho televisor na crença de ser LCD, verificando se tratar de TV apenas de Plasma.

 Error in persona: Esta espécie diz respeito à identidade da pessoa com que o agente pratica o negócio jurídico.

EXEMPLIFICANDO

A sociedade XY Eletrônica LTDA contrata José latrina pensando se tratar do famoso José latinhas.

Erro juris ou erro de direito: consiste no desconhecimento das implicações jurídicas trazidas pelo negócio jurídico.

EXEMPLIFICANDO

Alguém eventualmente celebra contrato de importação de uma determinada mercadoria, sem saber que, recentemente, for expedido decreto proibindo a entrada de tal produto no território nacional. Neste exemplo, tem aplicação o erro de direito.

Art. 141. A transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta.

É o que acontece na situação em que um negócio jurídico é afirmado através de meios de Transmissão como e-mail, quarta, fax, internet e televisão. Nessas situações, pode acontecer que a utilização desses meios possa vir de alguma forma, deturpar a manifestação de vontade. Se aplica na hipótese do mero acaso e não quando há dolo, neste caso a parte que escolheu o emissário fica responsável pelos prejuízos que tenha causado à outra parte por sua negligência na escolha feita.

O erro de cálculo apenas autoriza a retificação da declaração de vontade (art. 143).

O erro de direito só é admissível quanto ao alcance da norma e constitui exceção ao princípio da obrigatoriedade da lei. Em regra, o erro de direito não é causa de anulabilidade ou nulidade relativa do negócio, porém, às vezes a doutrina e a jurisprudência flexibilizam esse entendimento. Desta forma, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2008, p. 138) afirmam que “desde que não se pretenda descumprir preceito legal, se o agente, de boa-fé, prática o ato incorrendo em erro substancial e escusável, há que reconhecer, por imperativo de equidade, a ocorrência do erro de direito”.

EXEMPLIFICANDO

Jeremias tem uma sapataria no centro da cidade e firmou contrato de locação com Sérgio, proprietário do imóvel. Sérgio alega que já é tempo de assinarem um novo contrato, porém com um valor bem mais alto. Jeremias, completamente leigo no assunto, o assina com receio de perder o ponto, achando que havia perdido o prazo da ação renovatória, o que possibilitaria a manutenção do valor atual. Nesse exemplo, Jeremias, por não saber da lei, incorreu em erro de direito, tendo direito a anulação do novo contrato (negócio).

O art. 144 do CC apresenta hipótese específica para convalidação do erro, ao dispor que quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la em conformidade com a  vontade real do manifestante.               

Art. 144. O erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real do manifestante.

(b) Dolo: é o induzimento malicioso para enganar alguém com o objetivo de obter um benefício para si. Dispõe o art. 145 do CC que são anuláveis os negócios jurídicos por dolo, quando este for a sua causa. Já o dolo acidental, no qual, apesar dele, o negócio jurídico seria realizado, mas de outro modo, acarreta a obrigação de satisfazer perdas e danos

EXEMPLIFICANDO

Maria comprou um Iphone branco, mas na hora de receber percebe que foi enganada pelo vendedor, que lhe enviou um preto. Porém, Maria não quer desistir do negócio e poderá exigir compensação por perdas e danos.

Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou (art. 148, CC).

ATENÇÃO

O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve, se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos (art. 149, CC).

Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização (art. 150, CC).

ATENÇÃO

Dolo e erro estão elencados no Código Civil vigente como defeitos do negócio jurídico. Previsto nos artigos 138 a 144, o erro é compreendido como o engano espontâneo. Nos dizeres do art. 138, são anuláveis os negócios jurídicos das declarações de vontade que emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. Já o dolo, previsto nos artigos 145 a 150, trata do engano induzido, quando há a intenção de prejudicar. Os dois são causas de anulabilidade do negócio jurídico.

No erro existe uma falsa percepção da realidade. O agente se engana por conta própria. A confusão mental no erro não é provocada por atuação de terceiro. Já no dolo, essa falsa percepção da realidade surge por artifícios maliciosos provocados por outra pessoa. Aqui o agente não se engana sozinho.

(c) Coação moral: é uma pressão psíquica exercida sobre a parte negociante, com o intuito de obrigá-la a assumir uma obrigação que não é do seu interesse.

A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação. (art. 151, caput e parágrafo único, CC).

EXEMPLIFICANDO

Nestor recebe uma ligação, na qual alguém afirma conhecer sua filha, sabendo de todos os passos dela, e exige de Nestor a quantia de 20 mil reais por transferência pix. Caso Nestor não realize a transação em até 10 minutos, sua filha será abordada na rua e violentada. Nestor não tem outra alternativa a não ser realizar o negócio.

Ao apreciar a coação, devem ser consideradas as características pessoais do paciente e demais circunstâncias que possam influir para sua gravidade.

Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial (art. 153, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

A ameaça do exercício normal de um direito exclui a coação, porque se exige que a violência seja injusta.

EXEMPLIFICANDO

Se um credor de dívida vencida e não paga ameaça o devedor de protestar o título e requer falência, não se configurará a coação por ser ameaça justa que se prende ao exercício normal de um direito;

Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos (art. 154, CC).

Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento; mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos que houver causado ao coacto (art. 155, CC).

(d) Lesão: ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta (art. 157, CC). Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico e somente incide nos negócios jurídicos bilaterais. A premente necessidade ou a inexperiência do lesado não é presumida para fins de anulação do negócio jurídico (Enunciado 290, CJF).

Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito (art. 157, §2º, CC).

ATENÇÃO

Não se deve confundir a lesão com a teoria da imprevisão. Nessa  última, o negócio jurídico tem origem válida, mas se desequilibra posteriormente, o que enseja a revisão ou resolução do contrato. Na lesão o negócio jurídico já nasce viciado, podendo ser invalidado.

(e) Estado de perigo: Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.

EXEMPLIFICANDO

Pessoa que chega em um hospital particular e tem o atendimento de emergência condicionado ao pagamento de um valor dez vezes mais alto que o normalmente praticado.

VÍCIOS SOCIAIS:

(f) Fraude contra credores: configura-se com a prática maliciosa de atos de disposição do patrimônio pelo devedor insolvente ou daquele que esteja na iminência de tornar-se insolvente, frustrando, assim, o cumprimento das obrigações assumidas anteriormente à transmissão. São requisitos caracterizadores: anterioridade do crédito; eventos damni (dano ao credor); e consilium fraudis (intenção de prejudicar credores).

EXEMPLIFICANDO

Tiago contraiu um empréstimo e não mais conseguiu pagar as parcelas. Antes que o mutuante buscasse judicialmente o cumprimento da obrigação, ele transferiu o seu carro (único bem que possuía em seu nome) ao irmão, que sabia de toda a situação.

Se, porventura, o ato de disposição for gratuito (ex.: doação e remissão), a intenção de prejudicar será presumida, e o negócio poderá ser anulado.

Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante (art. 159, CC).

O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu (art. 162, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

O Credor quirografário é aquele que não possui um direito real de garantia, pois seu crédito está representado por títulos oriundos de uma obrigação, como, por exemplo, a duplicata, o cheque, um contrato que configure um título executivo extrajudicial,  uma nota promissória e etc.

Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor (art. 163, CC).

Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família (art. 164, CC).

(g) Simulação: é uma declaração enganosa de vontade com o objetivo de produzir efeito diverso do declarado. É gênero do qual são espécies a simulação absoluta (simulação) e a relativa (dissimulação).

É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; ou os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados (art. 167, §1º, I a III, CC).

EXEMPLIFICANDO

1- Imagine que Manoel está endividado e, possuindo patrimônio em seu nome,  este  poderá  ser  perdido.  Manoel  chama  um  amigo  e  combina para  que  ambos  simulem uma compra e venda, passando os bens para o nome do amigo. A compra e venda não existe de fato, servindo  apenas  para  tirar os bens  da propriedade de Manoel. Todavia,  o amigo  com quem Manoel simulou a compra e venda dos bens os vendeu  para um terceiro, que não conhece a simulação. Esse negócio simulado é nulo, porém os efeitos gerados ao terceiro de  boa-fé  não  serão  prejudicados,  restando  a  este  uma  ação  de  indenização  contra  João e o amigo.

2 – Exemplo sobre simulação relativa: Jeremias é casado e tem uma namorada (fora do casamento). Jeremias, para não causar problemas no casamento, simula  uma  compra  e  venda no lugar de realizar uma doação de imóvel direta  para  a  namorada.  O  Código  veda  a  doação  de  um cônjuge para outra pessoa com quem se tem um relacionamento paralelo e, por conseguinte,  haveria um negócio simulado nulo. Por seu turno, a doação, que é o dissimulado, também será nula, pois violará direito da esposa legítima.

Reza o art. 550 do Código Civil que “A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até DOIS ANOS depois de dissolvida a sociedade conjugal”.

EXEMPLIFICANDO

Cássio namora Vânia e ainda tem um relacionamento paralelo com Cibele. A lei não veda que, nesta situação, Cássio faça uma doação para o seu relacionamento paralelo. Desse modo, se ele fizer uma simulação de compra e venda,   a simulação é nula, mas a dissimulação( a doação)   não será nula.

PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA

Prescrição

De acordo com o CC, a prescrição é a perda da pretensão relativa a um direito subjetivo, patrimonial e disponível, que é veiculado através de uma ação condenatória em virtude do passar do tempo. Na prescrição ocorre a extinção da pretensão e não do direito em si. Por isso é que, se alguém pagar uma dívida prescrita, não pode pedir a devolução da quantia paga.

EXEMPLIFICANDO

Maria teve a infeliz ideia de emprestar seu cartão de crédito a sua cunhada. E ela foi gastando, gastando….resultando numa dívida impossível de Maria quitar. Assim, Maria foi inscrita no Serasa. Após 5 anos o nome dela foi retirado dos cadastros de inadimplentes, pois ocorreu a prescrição do direito da operadora de cartão de crédito cobrar a dívida de Maria.

A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita e a prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor.

Os prazos prescricionais são sempre legais e não podem ser alterados por disposição das partes. Encontram-se elencados nos art. 205, que estabelece a regra geral de 10 anos, e 206 do CC, que apresenta os prazos especiais, que variam de 1 a 5 anos. Recomenda-se a leitura desses dispositivos na íntegra.

A prescrição não corre (causas suspensivas): entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela; contra os menores de 16 anos; contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios; contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra; pendendo condição suspensiva; não estando vencido o prazo; pendendo ação de evicção.

Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva (art. 200, CC).

Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível (art. 201, CC).

A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á (art. 202, CC): por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual; por protesto, nas mesmas condições; por protesto cambial; pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores; por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.

A interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros, semelhantemente, a interrupção operada contra o codevedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados, salvo em caso de solidariedade. A interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros herdeiros ou devedores, senão quando se trate de obrigações e direitos indivisíveis. Por fim, a interrupção produzida contra o principal devedor prejudica o fiador.

Decadência

Decadência é a perda efetiva de um direito que não foi não requerido no prazo legal .A decadência diz respeito à perda de direitos potestativos, que são veiculados por ação constitutiva, bem como aquelas ações que visam a constituir positiva ou negativamente atos e negócios jurídicos, como é o caso da ação anulatória de negócio jurídico em decorrência do decurso do tempo.

Podemos citar, como exemplo no Código Civil: artigo 45, parágrafo único, artigo 48, parágrafo único, artigo 119, parágrafo único, artigos 178, 445 e 505.Ao contrário do prazo prescricional, o prazo decadencial pode ser legal ou convencional, admitindo renúncia. Quando determinada em lei, a decadência deve ser conhecida pelo juiz de ofício. Se convencional, pode ser alegada pela parte a quem aproveita, em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação.

Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição. Contudo, não se opera a decadência contra o menor de 16 anos (absolutamente incapaz).

Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição ou à decadência, ou não as alegarem oportunamente.

OBRIGAÇÕES

A teoria geral das obrigações é disciplinada pelos arts. 233 a 420 do CC, sendo o primeiro tema da parte especial do Código Civil.

A obrigação é uma relação jurídica de crédito, de caráter transitório, entre o credor (sujeito ativo) e o devedor (sujeito passivo), que tem por objeto uma prestação pessoal econômica.

Classificação

Obrigação de Dar Coisa Certa: é uma espécie de obrigação pessoal e positiva, pois envolve uma ação, e seu objeto é individualizado, podendo ser bem móvel ou imóvel. Em razão disso, o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa (art. 313, CC).

EXEMPLIFICANDO

José se compromete a dar a Laura um quadro específico de determinado artista. Ele está obrigado a dar esse quadro, não podendo, dar um relógio de ouro maciço como substituto.

A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso (art. 233, CC). Aplica-se, assim, o princípio da gravitação jurídica universal. Acessório segue o principal.

EXEMPLIFICANDO

Pneus do carro vem juntos com o carro.

A obrigação de dar coisa certa abarca a transferência da propriedade ou da posse (ex.: entrega do bem locado ao locatário).

Em caso de perda da coisa antes da tradição (entrega), se não houver culpa do devedor, o credor e devedor resolvem a obrigação sem perdas e danos, voltando ao status anterior.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Jairo vende um carro a Simão, que prontamente lhe transfere o valor e combinam que dia 5 do corrente mês Jairo irá entregar o carro a Simão em determinado endereço. Contudo, no dia 3 uma árvore cai em cima do carro  destruindo-o completamente. Nesse caso, a obrigação foi resolvida, voltando-se ao status anterior, qual seja, Jairo como proprietário do bem e a venda não existindo. Trata-se de perda da coisa, sem a culpa do devedor.

Havendo culpa do devedor na perda da coisa, funcionará assim: imagine que Jairo, dias antes da entrega, tenha emprestado o carro a seu sobrinho de 17 anos, que capota o carro e resulta em perda total. Simão poderá exigir de Jairo a devolução do dinheiro recebido  e mais perdas e danos

Em caso de deterioração da coisa, sem culpa do devedor, tem-se a opção de resolver a obrigação, voltando ao status anterior, ou aceitar a coisa, abatido do seu preço o valor que se perdeu. Se houver culpa do devedor, o credor tem a faculdade de exigir o valor equivalente ou aceitar a coisa no estado em que se achar, tendo direito ainda a indenização por perdas e danos.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Sem culpa: antes de fazer a entrega Jairo sofre uma batida leve que causa uns amassados no carro. Simão pode pedir abatimento do preço ou pedir devolução do valor pago, sem perdas e danos.

Com culpa: Jairo, antes de entregar o carro a Simão, atravessa o sinal vermelho e acaba batendo em outro carro, causando a quebra de um dos faróis de seu carro. Simão terá direito a receber o valor do carro ou  ficar com o carro no estado em que se encontra, nessas duas hipóteses receberá Simão perdas e danos.

Restituição de coisa certa:

Nessa obrigação, havendo a perda da coisa sem culpa do devedor e antes da entrega, é utilizada a máxima a qual a coisa perece para o dono (res perit domino), suportando o credor o prejuízo, conforme determina o art. 238 do CC.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Roberto é locatário de um apartamento de Robson. Fim do contrato, Roberto se prepara para devolver-lhe o apartamento. Mas, dias antes, acontece o inesperado e um curto-circuito incendeia o apartamento, causando perda total deste. Nesse caso, a única obrigação de Roberto será pagar aluguéis vencidos e não pagos até a data do infortúnio, se for o caso. 

No entanto, caso Roberto tenha dado causa ao incêndio, ele terá que pagar o valor total do apartamento e mais perdas e danos.

Havendo deterioração na obrigação de restituir:

Sem culpa do devedor: o credor recebe a coisa no estado em que se encontra. Imaginemos que no exemplo anterior, sem culpa de Roberto, o incêndio tivesse sido parcial, não causando a perda do imóvel, Robson receberia o bem no estado em que se encontra, sem ter direito a perdas e danos.

Com culpa do devedor: voltemos ao caso do incêndio, se Roberto deu causa ao dano, e o apartamento foi danificado parcialmente,  Robson poderá ficar com o bem no estado em que se encontre ou exigir valor equivalente, mais perdas e danos.

Obrigação de Dar Coisa Incerta: o objeto da obrigação não é individualizado, são indicados apenas o seu gênero e quantidade. EXEMPLIFICANDO: entregar dez sacas de café. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor (art. 244, CC). A partir do momento em que o credor é cientificado da escolha do devedor, aplicam-se as mesmas regras que regem a obrigação de dar coisa certa.

Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito (art. 246, CC). Isso se deve ao fato de o gênero nunca perecer. Por isso, a obrigação persiste, devendo o devedor responder ainda que a perda tenha decorrido de caso fortuito ou força maior.

Obrigação de Fazer: tem por objeto uma prestação de fato, podendo ser fungível (que se pode substituir por outra igual) ou infungível. A obrigação de fazer fungível é impessoal. Em caso de inadimplemento por culpa do devedor, o credor pode exigir o cumprimento forçado da obrigação, por meio de tutela específica, o cumprimento da obrigação por terceiro, à custa do devedor originário, ou ainda a conversão da obrigação em perdas e danos

EXEMPLIFICANDO

Se o sujeito encomenda a limpeza de seu veículo, não importa quem irá fazê-la, mas sim, que seja feita.

O CC traz ainda uma hipótese de autotutela quando o fato puder ser executado por terceiro, ao facultar ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido (art. 249, parágrafo único, CC).

Já a obrigação de fazer infungível é personalíssima.

EXEMPLIFICANDO

Determinado médico que é contratado para realizar cirurgia estética em razão do seu notório saber na área. OUTRO EXEMPLO: se Milton Nascimento é contratado para fazer um show, é inadmissível que outra pessoa apareça em seu lugar para cantar; neste caso, o credor não é obrigado a aceitar.

Em caso de inadimplemento por culpa do devedor, o credor pode exigir o cumprimento forçado da obrigação, por tutela específica, ou sua conversão em perdas e danos (art. 247, CC).

Obrigação de Não Fazer: tem por objeto uma abstenção.

EXEMPLIFICANDO

Dever de guardar sigilo empresarial. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se devia abster (art. 390, CC). Desse modo, aquele vizinho que se compromete a não aumentar seu muro, ou a não construir nenhum prédio, aquele comerciante que aliena seu estabelecimento e se compromete a não abrir outro da mesma espécie do alienado na mesma rua, todos estão diante de uma obrigação de não fazer.

Em caso de descumprimento com culpa do devedor, o credor pode exigir dele o desfazimento do ato, sempre que possível, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado em perdas e danos. Não sendo possível o desfazimento, converte-se a obrigação em perdas e danos.

Também há previsão de autotutela para os casos de urgência, sendo facultado ao credor desfazer ou mandar desfazer o ato, independentemente de autorização judicial, sem prejuízo do ressarcimento devido.

Se o descumprimento se opera sem culpa do devedor, por ter se tornado impossível a ele abster-se do ato que se obrigou a não praticar, a obrigação se resolve.

Outras Espécies de Obrigações

Obrigação Simples e Composta: a obrigação simples compreende apenas uma prestação. Já a composta pode ser cumulativa, em que há uma pluralidade de prestações e todas devem ser cumpridas, ou alternativa, em que há uma pluralidade de prestações ligadas pela partícula “ou”. Apenas uma delas deverá ser cumprida.

EXEMPLIFICANDO

Vender o carro e pagar certa soma em dinheiro.

No caso da obrigação alternativa, não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte em outra.

Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se tornada inexequível, subsistirá o débito quanto à outra (art. 253, CC).

Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações, não competindo ao credor a escolha, o devedor deverá pagar o valor da que por último se impossibilitou, mais as perdas e danos.

Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a prestação subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por culpa do devedor, ambas as prestações se tornarem inexequíveis, poderá o credor reclamar o valor de qualquer das duas, além da indenização por perdas e danos (art. 255, CC).

Se todas as prestações se tornarem impossíveis sem culpa do devedor, a obrigação se extingue.

Obrigação Solidária: ocorre quando na mesma obrigação há mais de um credor (solidariedade ativa) ou mais de um devedor (solidariedade passiva), cada um com direito ou obrigado, à dívida toda. A solidariedade NÃO SE PRESUME e subsiste mesmo que seja convertida em perdas e danos. É possível estabelecer condições diferentes para um ou alguns dos credores ou dos devedores.

Na solidariedade ativa, se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros, cada um destes só terá direito a exigir e receber a quota do crédito que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível (art. 270, CC).

Também na solidariedade ativa, o credor que tiver perdoado a dívida ou recebido o pagamento responderá aos outros pela parte que lhes caiba (art. 272, CC).Ou seja, recebida a prestação por um dos credores, este ficará responsável por entregar aos demais co-credores a respectiva quota-parte.

Na solidariedade passiva, o pagamento parcial não implica, por si só, renúncia à solidariedade. Com a renúncia da solidariedade quanto a apenas um dos devedores solidários, permanece a solidariedade quanto aos demais devedores, abatida do débito a parte correspondente aos beneficiados pela renúncia (Enunciado 349, CJF).

Se um dos devedores solidários falecer deixando herdeiros, os herdeiros só ficam obrigados a pagar o valor correspondente a quota que corresponder ao seu quinhão hereditário, salvo se a obrigação for indivisível. Todos os herdeiros reunidos são considerados como um devedor solidário em relação aos demais devedores (art. 276, CC).

Também na solidariedade passiva, o pagamento parcial e a remissão obtida por um dos codevedores, aproveita aos demais, até o valor da quantia paga ou perdoada. Em caso de impossibilidade de cumprimento da prestação, todos os codevedores respondem pelo valor equivalente a prestação, mas pelas perdas e danos só responde o culpado.

Obrigação Divisível e Indivisível: a obrigação divisível é aquela cuja prestação ou objeto comporta fracionamento. Já na obrigação indivisível, a prestação ou objeto é único. A indivisibilidade, ao contrário da solidariedade, decorre da própria natureza da prestação ou do objeto. Não é possível a sua conversão em perdas e danos, pois, nesse caso, a obrigação se torna divisível. O devedor que paga a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor em relação aos demais obrigados.

ADIMPLEMENTO

(a) Consignação em Pagamento: consiste no depósito judicial (judicial) ou em estabelecimento bancário (extrajudicial) da coisa devida, em caso do credor não demonstrar interesse em receber, que objetiva liberar o devedor da obrigação. As hipóteses de cabimento estão previstas no art. 335 do CC.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Célio deve 10 mil reais a Nestor. Porém, ao ser procurado por Célio a fim de quitar a obrigação, Nestor diz que não irá receber esse valor, pois entende que o valor devido é 20 mil. Com a recusa de Nestor em receber, Célio teme ser prejudicado, então entra com uma ação contra Nestor de consignação em pagamento, depositando os 10 mil em juízo.

O devedor de obrigação que estiver sob litígio poderá se exonerar dela com a consignação, mas, se pagar a qualquer dos pretendidos credores, tendo conhecimento do litígio, assumirá o risco do pagamento (art. 344, CC).

(b) Imputação do Pagamento: a pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos (art. 352, CC). A imputação é justamente a indicação de quais débitos estão sendo pagos, em caso de pluralidade de débitos em relação ao mesmo credor. Se o devedor não declarar, a imputação caberá ao credor. Se este também não o fizer, segue a ordem de pagamento estabelecida nos arts. 354 e 355 do CC.

EXEMPLIFICANDO

Caio deve a Gerson 10 mil de um empréstimo, 5 mil de um serviço que Gerson lhe prestou e 1 mil reais de objetos que Gerson lhe vendeu. Caio tem o direito de indicar qual quer pagar primeiro. Se Caio nada fizer, cabe a Gerson dizer qual dívida quer receber.

(c) Pagamento com Sub-rogação: nesse caso, há uma substituição de uma pessoa por outra na obrigação. A sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores (art. 349, CC).

A sub-rogação pode ser legal ou convencional.

São pagamentos realizados por terceiros que têm interesse em quitação da dívida. Esse interesse é patrimonial. (art. 346, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Vejamos os incisos do art. 346, seguido do exemplo:

I – do credor que paga a dívida do devedor comum. Jessé deve para Maria 10 mil e 20 mil para Márcio. Maria paga para Márcio esses 20 mil. Agora, Maria tem direito de cobrar os 30 mil de Jessé.

II – do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel. Patrícia compra uma casa que está hipotecada, então ela paga a hipoteca ao Banco para quitar a dívida.

III – do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte. Max teve a infeliz ideia de ser fiador de seu cunhado Mário, que não pagou a dívida. Max, com receio de ser cobrado judicialmente, paga a dívida de Mário.

A sub-rogação convencional ocorre quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos; ou quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia que precisa para solver a dívida, sob a condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito (art. 347, CC). É caso de negócio jurídico, ou seja, é um contrato que estabelece a mudança de credor.

(d) Dação em Pagamento: ocorre quando o credor consente em receber prestação diversa da que lhe é devida.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Cláudio vende uma casa a Reginaldo. Porém, Cláudio não consegue entregar a casa e os dois resolvem fazer um contrato estabelecendo que Cláudio, no lugar da casa, dará 3 carros a Reginaldo.

(e) Novação: opera uma substituição da obrigação anterior por uma nova obrigação que modifica o objeto (objetiva ou real) ou substitui uma das partes (ativa ou passiva).

A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não houver estipulação em contrário (art. 364, CC). A novação extingue a obrigação primitiva, mas não satisfaz o crédito. Pode ser por delegação, quando houver consentimento do antigo devedor, ou por expromissão, quando não houver o consentimento do antigo devedor.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Verificando que seu amigo Paulo não tinha condições de quitar dívida em dinheiro contraída com Manoel, Carlos dirigiu-se ao credor e disse querer assumir a obrigação. Nessa situação, se Manoel aceitar Carlos como novo devedor, em substituição a Paulo, não será necessária a concordância deste, hipótese em que haverá novação subjetiva passiva por expromissão.

(f) Compensação: se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem (art. 368, CC). A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis (art. 369, CC).

A diferença de causa nas dívidas NÃO impede a compensação, exceto: se provier de esbulho, furto ou roubo; se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos; se uma for de coisa não suscetível de penhora. Os honorários advocatícios, por exemplo, por terem natureza alimentar, não podem ser compensados. A compensação pode ser total ou parcial, legal ou convencional.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Empresa AA e a Empresa XXX têm dívidas uma com a outra. Os contadores de ambas as empresas averiguam que 5 milhões serão compensados, por serem valores que ambas devem uma a outra. Assim, a dívida é extinta.

(g) Confusão: ocorre quando na mesma pessoa se confundem as qualidades de credor e devedor, o que provoca a extinção da obrigação.

A confusão pode ser total ou parcial. Quando operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a solidariedade (art. 383, CC). Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a obrigação anterior (art. 384, CC).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Pense no caso de a Empresa Zeta dever à Empresa Beta R$ 5.000.000,00.A dívida estará extinta, caso a segunda empresa adquirir a primeira. Trata-se de confusão total. Porém, se essa aquisição for judicialmente ou administrativamente declarada nula, a dívida ressurge.

Agora, imagine que alguém deva um valor  ao seu pai, o qual é declarado morto por ausência. Na hipótese, de o filho ser o seu único sucessor haverá confusão total. Terá confusão parcial se outro parente também for credor da dívida. No entanto,  caso o pai reapareça a dívida volta.

(h) Remissão de Dívidas: é negócio jurídico bilateral que consiste no perdão da dívida pelo credor, que deve ser aceita pelo devedor. Pode ser total ou parcial, expressa ou tácita. A remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na parte a ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito sem dedução da parte remitida (art. 388, CC). Se concedido ao devedor principal, extingue a obrigação dos fiadores, libertando as garantias reais.

Cláusula Penal

Também conhecida por multa contratual ou penal convencional, é a penalidade de natureza civil pactuada para ser aplicada em caso de inexecução parcial ou total de um dever patrimonial assumido.

Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que culposamente deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora (art. 408, CC).

A cláusula penal pode ser moratória ou compensatória. Quando moratória, o credor lesado pode pleitear o cumprimento da obrigação e a aplicação da cláusula penal. Já a compensatória se aplica em caso de inadimplemento absoluto, com o intuito de compensá-lo. Nesse caso, o lesado poderá exigir o cumprimento da obrigação principal ou a aplicação da cláusula penal. Se a cláusula penal for moratória, é possível ainda ao credor exigir perdas e danos. O mesmo não ocorre com a cláusula penal compensatória.

Arras

É o valor (sinal), em dinheiro ou bens móveis, que se paga no momento da conclusão do contrato com o objetivo de garantir o cumprimento do contrato.

Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a título de arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução, ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da principal (art. 417, CC).

As arras podem ser confirmatórias ou penitenciais. As confirmatórias (regra geral) constituem sinal de confirmação do contrato, servindo de piso indenizatório à parte lesada, em caso de inexecução do contrato.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Luciano compra imóvel de João e paga arras confirmatórias de 25 mil. Se Luciano não cumprir com o contrato, João ficará com os 25 mil a título de indenização, nada impedindo, no entanto, que João ajuíze ação judicial pleiteando indenização complementar. Se é João quem descumpre o contrato, João terá que devolver o dobro, que compreende a restituição dos 25 mil recebidos + as arras à título de indenização. E também nessa hipótese poderá ser requerida indenização complementar por Luciano.

A parte inocente pode também exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras como o mínimo da indenização.

Já as arras penitenciais constituem o teto indenizatório, quando no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes. Não possuem a função de confirmar o contrato definitivo. Neste caso, quem as deu, irá perdê-las em benefício da outra parte; e quem as recebeu irá devolvê-las, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar.

Transmissão das Obrigações

Cessão de crédito: é negócio jurídico bilateral que tem por objetivo transferir a um terceiro a posição de sujeito ativo da relação obrigacional. Não é necessária anuência do devedor (cedido) para que seja consumada, contudo, esse deve ser comunicado para que faça o pagamento a pessoa certa. Se Maria (cedente), por exemplo, cede o crédito que possui contra João (cedido) à Paulo (cessionário), sem comunicar a João, e João efetua o pagamento à Maria, ocorre o adimplemento putativo, ficando João desobrigado.

Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito abrangem-se todos os seus acessórios (art. 287, CC).

Para ter eficácia perante terceiros, a transmissão de um crédito, deve ser feita por instrumento público, ou instrumento particular, contendo indicação do lugar onde foi passada; qualificação do cedente, cessionário e cedido; data da transmissão; designação e extensão da obrigação transferida.

Classificação

(a) Quanto à origem pode ser convencional (à título oneroso ou gratuito, total ou parcial), legal (ex. fiador que paga a dívida e fica sub-rogado nos direitos do credor) ou judicial.

(b) Quanto a responsabilidade do cedente em relação ao cedido pode ser pro soluto, quando o cedente apenas garantir a existência do crédito, ou pro solvendo, quando o cedente assume a responsabilidade também pelo pagamento. Em regra, a cessão é pro soluto, se não houver estipulação em contrário.

Cessão de débito ou assunção de dívida: é também negócio jurídico bilateral, mas por meio da assunção de dívida o devedor transfere a um terceiro a posição de sujeito passivo da relação obrigacional. É necessário o consentimento expresso do credor, interpretando-se o seu silêncio como recusa, mas há exceção (v. art. 303, CC).

O novo devedor não pode opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao devedor primitivo (art. 302, CC). Além disso, salvo assentimento expresso do devedor primitivo, consideram-se extintas, a partir da assunção da dívida, as garantias especiais por ele originariamente dadas ao credor (art. 300, CC).

Classificação

(a) Assunção por expromissão: o terceiro assume de forma espontânea o débito, sem a intervenção do devedor. Pode ser liberatória, quando o devedor primitivo se exonera da obrigação; ou cumulativa, quando o expromitente entra na relação como novo devedor, ao lado do primitivo.

(b) Assunção por delegação: o devedor originário transfere o débito a terceiro, com anuência do credor.

CONTRATOS

É o acordo de vontades que tem por objetivo criar, modificar, conservar ou extinguir relações jurídicas. É espécie de negócio jurídico.

Princípios

Autonomia privada, autonomia negocial ou consensualismo: refere-se à liberdade para estipular as cláusulas contratuais da maneira que convier às partes. Contudo, atualmente, esse princípio é aplicado sob a ótica da função social dos contratos e da boa-fé objetiva, limitando-se em determinadas situações o exercício da vontade das partes. EXEMPLO: vedação ao pacto de corvina, acordo que tem por objeto a herança de pessoa viva. Trata-se de medida expressamente proibida pelo Código Civil.

ATENÇÃO

Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual (art. 421, parágrafo único, CC).

Relatividade dos efeitos do contrato: em regra, o contrato vincula apenas as partes que dele participaram (efeitos inter partes). Há exceções, a exemplo da promessa de fato de terceiro.

Pact sunt servanda: o contrato pactuado pelas partes tem força de lei entre elas, subordinando os contratantes ao cumprimento do acordo. É também um princípio cuja aplicação tem sido atenuada em razão da boa-fé objetiva e da função social do contrato.

Função social dos contratos: a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato (art. 421, CC). Com esse princípio ficou superado o modelo individualista proposto pelo CC/16, sendo reconhecidas as repercussões sociais dos contratos. O contrato possui tanto eficácia interna (ex. proteção contra cláusulas abusivas) quanto externa (função socioambiental do contrato, ex. função social da propriedade).

Boa-fé: preconiza a ética, probidade e confiança nas relações contratuais, tanto na sua conclusão, quanto na sua execução, sem prejuízo da sua aplicação nas fases pré e pós-contratuais. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração (art. 113, CC). Possui três funções principais: interpretativa, integrativa (deveres anexos implícitos) e restritiva (juiz pode revisar o contrato para adequá-lo à boa-fé). São desdobramentos da boa-fé: vedação do comportamento contraditório, supressio e surrectio, tu quoque e o duty to mitigate the loss.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Vedação ao comportamento contraditório:  A financeira XYS sempre permitiu que os usuários de seus cartões de crédito pudessem fazer pagamentos em atraso, porém passou a rescindir contratos alegando a cláusula que previa extinção do contrato por inadimplemento. Ora, o comportamento da financeira era um, e agora mudou repentinamente fazendo-a retirar da manga uma cláusula que ela mesma nunca usou. Notável exemplo de comportamento contraditório. Dessa forma as rescisões contratuais são ilegais.

Supressio e Surrectio: Imagine um casal que se divorcia e sua única filha vai morar com a mãe. Passam-se 10 anos e o pai nunca pagou as pensões à filha, nem a mãe cobrou dele. Essa atitude da mãe em nunca ter cobrado a dívida gerou no pai devedor a expectativa de que ele não precisaria mais pagar. A supressio se aplica à mãe que, com sua inércia, renunciou ao direito de receber o pagamento da dívida, e dessa atitude surge o direito, surrectio, de o pai não mais pagar. Supressio, portanto é a supressão de um direito. A mãe tinha esse direito, mas abriu mão. E surrectio é a consequência disso,  o direito do devedor não ser mais cobrado.

Tu quoque: significa que é vedado alguém fazer com o outro, o que não faria consigo mesmo. É a situação de uma parte num contrato: Empresa XSS violou cláusula de um contrato, essa não tem razão para reclamar em juízo caso a outra parte venha violar essa mesma cláusula.

Duty to mitigate the loss: Significa o dever de mitigar as próprias perdas. Kátia tem uma dívida junto ao banco que só aumenta. O banco resolve não cobrar para que a dívida chegue num patamar muito mais alto, visando cobrar mais juros da cliente. Nesse caso, o direito veda esse comportamento do banco, que tem o dever de buscar reduzir as próprias perdas.

Contrato Preliminar

O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado (art. 462, CC). Assim, por exemplo, embora a escritura pública seja exigida nos negócios que têm por objeto imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente, o seu contrato preliminar possui forma livre.

Concluído o contrato preliminar e desde que dele não conste cláusula de arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive (art. 463, CC).

Esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação (art. 464, CC).

O contrato preliminar deve ser obrigatoriamente levado ao registro competente. Caso não seja registrado, ficará prejudicada a sua eficácia contra terceiros, tendo o contrato preliminar efeitos somente inter partes.

Vícios Redibitórios

Trata-se de vício ou defeito oculto preexistente na coisa alienada, que diminuem o seu valor e utilidade, de forma que o contrato não teria se realizado se o vício ou o defeito fosse conhecido. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor (art. 441, CC). A responsabilidade do alienante, nesses casos, é objetiva.

O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de 30 dias se a coisa for móvel, e de 1 ano se for imóvel, contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido à metade (art. 445, CC).

Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo deverá ser contado do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de 180 dias, em se tratando de bens móveis; e de 1 ano, para os imóveis.

EXEMPLIFICANDO

Quando um particular vende um veículo a outro particular, o comprador tem direito à responsabilizar o vendedor por vícios que diminuam o valor ou tornem a coisa sem uso.

Evicção

A evicção consiste na perda da posse ou propriedade de uma coisa para terceiro, em razão de um vínculo jurídico anterior desse com a coisa e por sentença judicial. A evicção pode ser total ou parcial e o alienante deve responder por ela.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Luciano (alienante) vende a Fábio (evicto) o carro de Matheus (evictor). Alienação a non domino. Matheus perdeu o carro dele, mas tem o direito de sequela, que é o direito de reivindicação, art. 1.228. Fábio vai sofrer a perda, seja por conta de decisão judicial ou por ato administrativo (apreensão policial). Fábio poderá, então, pleitear contra Luciano. O evicto tem direito à restituição integral do preço pago, a restituição das despesas com o contrato, a perdas e danos, à indenização dos frutos que for obrigado a restituir, ao valor das benfeitorias necessárias e úteis, às custas judiciais, honorários advocatícios e demais despesas processuais.

Extinção dos Contratos

Adimplemento: é o modo natural de extinção do contrato, que se dá pelo cumprimento ou satisfação da obrigação. Se o credor não entregar a quitação ao devedor ou se o fizer de forma irregular, o devedor poderá reter o pagamento ou efetuar a consignação em pagamento.

Nulidades: se verifica pela inobservância dos requisitos subjetivos, objetivos e formais, como capacidade, objeto, consentimento e forma. É nulo, por exemplo, o contrato que tem por objeto coisa ilícita.

 ▪ Arrependimento: deve haver previsão no próprio contrato autorizando a rescisão unilateral, mediante declaração de vontade de qualquer das partes contratantes.

Resolução: ocorre nos casos de inadimplemento. Quando esse se der por culpa do devedor, a resolução será voluntária e acarretará o direito do credor ao ressarcimento por perdas e danos. Já se o inadimplemento se operar sem culpa do devedor, em situações de caso fortuito ou força maior, não haverá direito de indenização por perdas e danos. Retorna-se ao status quo ante, com a devolução de quantias eventualmente pagas. A resolução pode também ocorrer por onerosidade excessiva, mediante aplicação da teoria da imprevisão.

Resilição bilateral ou distrato: as partes firmam um novo contrato para extinguir o contrato anterior. Se submete às mesmas normas que regem o contrato.

Resilição unilateral: o contrato é dissolvido pela declaração de vontade de uma das partes, sendo também conhecida por denúncia vazia. EXEMPLO: contrato de mandato, quando o mandante revoga o mandato concedido ou quando o mandatário o renúncia.

Morte: ocorre a extinção do contrato pela morte de um dos contratantes, se a obrigação assumida for personalíssima. Não o sendo, será transmitida aos herdeiros até o limite das forças da herança.

Contratos em Espécie

Compra e venda

Um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro. A propriedade é transferida pela tradição (bem móvel) ou pelo registro do título no Cartório de Registro de Imóveis (bem imóvel).

Elementos: coisa, consenso e preço (princípio do nominalismo – o preço deve ser expresso em moeda nacional corrente e pelo valor nominal). É nulo o contrato de compra e venda, quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço.

Venda de ascendente para descendente: é anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido (art. 496, CC). ATENÇÃO também para a necessidade de outorga uxória na compra e venda de bens imóveis, exceto no regime de separação absoluta de bens.

Venda de coisa comum ou venda de bem indivisível em condomínio: não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro condômino a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de 180 dias, sob pena de decadência (art. 504, CC).

Cláusulas especiais

(a) Retrovenda: propriedade resolúvel, o vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de 3 anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.

(b) Venda a contento: a venda se realiza sob a condição suspensiva de manifestação de agrado pelo comprador, quando se reputa perfeita, ainda que a coisa lhe tenha sido entregue.

(c) Preempção ou preferência: impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa, caso decida vendê-la, para que este use de seu direito de preferência na compra. Prazo de exercício: 180 dias para bem móvel e 2 anos para bem imóvel.

(d) Reserva de domínio: o vendedor reserva para si a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago. Aplica-se na venda de coisa móvel.

Doação: contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. Não há qualquer remuneração. Trata-se de contrato gratuito, unilateral e inter vivos. Exceções: doação remuneratória por serviço prestado pelo donatário e doação feita em contemplação de casamento.

Para que a doação se aperfeiçoe, é necessária a aceitação do donatário, seja de forma expressa ou tácita. Se a doação for onerosa, a anuência deve ser expressa. No caso da doação feita ao nascituro, a aceitação deve ser feita pelo seu representante legal.

A doação pode ser feita por instrumento público ou particular ou verbalmente, se a coisa for bem móvel de diminuto valor.

A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário (homicídio, ofensa física, injúria grave e abandono material), no prazo decadencial de 1 ano, ou por inexecução do encargo/modo, no prazo prescricional de 10 anos. Não cabe a revogação por ingratidão na doação contemplativa de casamento, na doação onerosa e na doação por cumprimento de obrigação natural.

Locação: uma das partes (locador) se obriga a ceder à outra (locatário), por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição (art. 565, CC).

A locação por tempo determinado cessa de pleno direito findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso (art. 573, CC).

Salvo disposição em contrário, o locatário goza do direito de retenção, no caso de benfeitorias necessárias, ou no de benfeitorias úteis, se estas houverem sido feitas com expresso consentimento do locador (art. 578, CC).

No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário apenas uma das seguintes modalidades de garantia: caução; fiança; seguro de fiança locatícia; e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento (art. 37, Lei do Inquilinato).

Empréstimo: (a) comodato: é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis e não consumíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto. Exemplo: casa.

(b) mútuo: é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade. EXEMPLO: mútuo de dez sacas de café. Pode ser gratuito ou oneroso (feneratício).

Prestação de serviços: é toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, não sujeita às leis trabalhistas ou a lei especial, que pode ser contratada mediante retribuição. Em caso de contrato firmado por prazo indeterminado, deve ser dado o aviso prévio: com antecedência de 8 dias, se o salário se houver fixado por tempo de um mês, ou mais; com antecipação de 4 dias, se o salário se tiver ajustado por semana, ou quinzena; ou de véspera, quando se tenha contratado por menos de 7 dias (art. 599, parágrafo único, CC).

Empreitada: é o contrato por meio do qual o empreiteiro assume a obrigação de fazer ou mandar fazer determinada obra, mediante remuneração. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de 5 anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

Depósito: por esse contrato o depositário recebe um objeto móvel, para guarda, até que o depositante o reclame (art. 627, CC). É um contrato gratuito, salvo se estipulado o contrário, se resultante de atividade negocial ou se o depositário o praticar por profissão.

O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos, quando o exija o depositante (art. 629, CC).

É depósito necessário o que se faz em desempenho de obrigação legal e o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio, a inundação, o naufrágio ou o saque (art. 647, CC). É também necessário o depósito do hospedeiro pelas bagagens dos viajantes ou hóspedes nas hospedarias onde estiverem.

Mandato: alguém (mandatário) recebe de outrem (mandante) poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato (art. 653, CC). Pode ser gratuito ou oneroso, sendo admitido o mandato verbal nos casos em que o ato não deva ser celebrado por escrito. Pode ainda ser legal, judicial ou convencional. Admite substabelecimento.

Seguro: o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. A seguradora somente pode ser entidade legalmente autorizada para esse fim. O seguro pode ser de dano ou de pessoa.

ATENÇÃO

Nulo será o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro (art. 762, CC). Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido (art. 766, CC).

Fiança: uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra. É contrato personalíssimo. A fiança pode ser total ou parcial. Podem ser objeto de fiança as dívidas atuais e futuras. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor (benefício de ordem).

Não aproveita este benefício ao fiador se ele o renunciou expressamente; se se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário; ou se o devedor for insolvente, ou falido.

RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil é obrigação de reparar o dano decorrente da inobservância de uma norma legal ou do descumprimento de uma regra contratual.

A legislação civil adotou o sistema binário, sendo a responsabilidade civil classificada em contratual, quando decorrente de inadimplemento contratual, sendo regida pelos arts. 389 a 391 do CC, e extracontratual ou aquiliana, quando decorrente de ato ilícito ou abuso do direito, conforme previsto nos arts. 186 e 187.

Quando se tratar de controvérsia que diga respeito à responsabilidade contratual deve-se aplicar o regramento previsto no artigo 205 do CC (10 anos de prazo prescricional), mas quando envolver responsabilidade extracontratual, o artigo 206, parágrafo terceiro, inciso V, do CC/02, com prazo de 3 anos é que deve prevalecer (STJ. 2 Seção. REsp 1.280.825-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/06/2018).

A responsabilidade civil decorrente do abuso de direito é independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico (Enunciado 37, CJF). Ou seja, basta que a conduta configure exercício irregular de direito.

EXEMPLIFICANDO

Publicidade abusiva (art. 37, §2º, CDC) e abuso do direito de propriedade (art. 1.128, §2º, CC).

Responsabilidade civil X responsabilidade criminal: o CC adotou o princípio da independência relativa ao estabelecer que a responsabilidade civil é independente da criminal, contudo, não se poderá questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. Portanto, em regra as instâncias são independentes, salvo quando, na instância penal, o réu é absolvido em razão da inexistência do fato ou negativa da autoria. Nessa situação, a decisão da esfera penal influência diretamente a decisão na esfera civil.

Reparação: aplica-se o princípio da responsabilidade, segundo o qual, os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação (art. 942, CC).

Elementos da Responsabilidade Civil

Conduta humana: ação ou omissão voluntária, negligência, imprudência ou imperícia, que viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão de reparação, a qual se extingue, pela prescrição.

Culpa genérica ou lato sensu: dolo e culpa estrita (conduta voluntária, previsão ou previsibilidade e falta de cautela).

Em regra, a responsabilidade civil é subjetiva, sendo necessário demonstrar a culpa do agente. Mas nos casos previstos em lei e quando a atividade desenvolvida, por sua natureza, implique risco ao direito de outrem, a responsabilidade civil será objetiva, dispensando a comprovação de culpa do agente.

Culpa concorrente: se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano (art. 945, CC).

Afastam a imputabilidade: incapacidade civil absoluta, estado grave de desequilíbrio mental ou debilidade mental, e a anuência da vítima.

Nexo de causalidade: é o liame que conecta a ação ou omissão ao dano que dela resulta. São causas excludentes da responsabilidade civil: estado de necessidade; legítima defesa; exercício regular de direito; caso fortuito e força maior, que se verifica no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir; culpa exclusiva da vítima ou fato exclusivo da vítima; ); fato de terceiro; cláusula de não-indenizar (ex.: cláusula que exclui a responsabilidade por evicção). 

EXEMPLIFICANDO

– Discussão no trânsito e o agente ameaça agredir terceiro, este por sua vez, em vista da iminente e injusta agressão, dispara com seu veículo colidindo com outros veículos em sua frente. Neste caso, em nosso entendimento, há excludente de responsabilidade civil devido a comprovada legítima defesa

– A pessoa que se arrisca em cima de uma composição ferroviária, praticando o denominado ‘surf ferroviário’, assume as consequências de seus atos, não se podendo exigir da companhia ferroviária efetiva fiscalização, o que seria até impraticável)

Dano ou prejuízo: pode ser patrimonial (emergentes ou lucros cessantes), moral, quando decorrer de lesão a direitos da personalidade, estético, por perda de uma chance, social (ex.: danos decorrentes de fraude a sistema de loterias) e morais coletivos.

Outras Modalidades de Responsabilidade Civil

A regra é que a pessoa responda por seus próprios atos. Excepcionalmente, poderá responder por ato de terceiro, ainda que não haja culpa da sua parte. Nesse caso, a culpa do terceiro deverá ser provada (responsabilidade objetiva indireta ou objetiva impura).

São responsáveis pela reparação civil por fato de terceiro (art. 932, CC): os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições; o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

ATENÇÃO

No caso da prática de ato ilícito por incapaz, se os seus responsáveis (que detenham o poder familiar) não tiverem condições econômicas de arcar com os danos causados, o incapaz, se tiver condições financeiras, responde subsidiariamente.

EXEMPLIFICANDO

João, menor de idade provoca acidente de trânsito na condução de veículo automotor. João mora com o pai em São Paulo e sua mãe reside no Espírito Santo. Nesse caso, apenas o pai poderá responder pelo ato ilícito do filho. Mesmo que sua mãe detenha o poder familiar, é o pai que exerce a autoridade de fato sobre o filho.

Responsabilidade pelo fato do animal: O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior (art. 936, CC).

Responsabilidade pelo fato da coisa: o dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta (art. 937, CC). Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido (art. 938, CC).

Responsabilidade no contrato de transporte: o transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade (art. 734, CC). Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar (Súmula 161, STF). Note-se que as regras do contrato de transporte não regem o transporte gratuito (carona).

DIREITO DAS COISAS: POSSE

A posse é um poder de fato sobre coisa corpórea ou situação jurídica na qual uma pessoa passa a exercer algum dos poderes da propriedade (usar, fruir, gozar e dispor) de maneira fática. É possível que a posse seja partilhada por uma pluralidade de sujeitos (composse).

A posse não é considerada um direito real, pois esses direitos estão previstos em rol taxativo no art. 1.225, CC.

Teorias explicativas da posse:

(a) Subjetiva (Savigny): a posse se caracteriza com a apreensão física do bem e a vontade de ser dono (corpus + animus domini).

(b) Objetiva (Ihering): a posse é apenas corpus sem animus. Basta o elemento objetivo. É a teoria adotada pelo CC.

A posse não se confunde com a detenção. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas (art. 1.198, CC).

EXEMPLIFICANDO

Caseiro em relação ao imóvel de que cuida. Se eventualmente uma ação possessória for dirigida indevidamente ao detentor, este deverá nomear a autoria o proprietário ou o possuidor. A nomeação a autoria é obrigatória, sob pena por responder pelas perdas e danos. CC, Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.

A ocupação indevida de bem público configura mera detenção (v. Súmula 619, STJ).

Elementos da posse: sujeito capaz, objeto lícito e possível, forma livre e relação dominante entre sujeito e coisa.

Classificação da Posse

Direta ou imediata: é a posse exercida por quem detém fisicamente a coisa, a exemplo do locatário. O possuidor direto tem o direito de defender a sua posse contra o indireto e vice-versa.

Indireta ou mediata: é a posse por intermédio de outrem, exercida em decorrência de direito derivado da propriedade. EXEMPLO: locador.

Justa: é justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária.

Injusta: (a) posse violenta: obtida por força física ou violência moral (esbulho); (b) clandestina: obtida por meio furtivo, de forma oculta; (c) precária: obtida por abuso de confiança ou de direito. A posse injusta pode ser defendida contra terceiros, mas não contra quem seria o justo possuidor.

Desforço imediato e legítima defesa da posse (autotutela): o possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse (art. 1.210, §1º, CC).

De boa-fé: é de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa (art. 1.201, CC).

De má-fé: a posse perde o caráter de boa-fé, se o possuidor não ignora que possui a coisa indevidamente.

Nova: é a posse exercida a menos de um ano e um dia.

Velha: é a posse exercida a mais de um ano e um dia. Sendo a posse nova, a ação possessória ajuizada para protegê-la segue o rito especial, cabendo medida liminar. Se a posse for velha, o rito é o ordinário e não cabe liminar, mas é possível pleitear a tutela antecipada.

Formas de Aquisição da Posse

Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.204, CC). Pode ser adquirida de forma originária (coisa sem dono ou abandonada) ou derivada (ex. contrato).

Não induzem a posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade (art. 1.208, CC).

A posse pode ser adquirida: pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante; ou por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

Efeitos da Posse

As Ações Possessórias são remédios processuais cabíveis quando o possuidor de um bem se sente esbulhado, turbado ou ameaçado de perder sua posse. O ordenamento jurídico prevê três tipos de ações possessórias. São elas, de acordo com o art. 560, NCPC: Ação de reintegração de posse; Ação de manutenção de posse; e Interdito proibitório.

Defesa da posse por meio de ações possessórias: em caso de ameaça a posse, cabe o interdito proibitório. Quando evidenciado a  turbação, cabe a manutenção da posse. E para o caso de  esbulho, cabe a reintegração da posse. O CPC dispõe que essas ações são fungíveis entre si (art. 554).

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Esbulho é a situação em que o possuidor é despojado do bem possuído. Nesse caso, o remédio jurídico é a ação de reintegração de posse.

Turbação, por sua vez, é a situação em que um ofensor exerce atos materiais que dificultam o exercício da posse. Isto ainda que o possuidor não perca a disposição física sobre o bem. Nesse caso, portanto, o remédio jurídico é a ação de manutenção de posse.

Quando há apenas ameaça de esbulho ou turbação, o remédio jurídico adequado é o interdito proibitório.

Percepção dos frutos: o possuidor de boa-fé tem direito, enquanto durar a posse, aos frutos percebidos. Art. 1.214. O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.

Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas da produção e custeio; devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação (art. 1.214, CC). Já o possuidor de má-fé, responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé. Entretanto, este  tem direito às despesas da produção e custeio (art. 1.216, CC).

Benfeitorias: o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis (art. 1.219, CC). Já ao possuidor de má-fé, serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias, não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o direito de levantar as voluptuárias (art. 1.220, CC).