Voltemos a lembrar que o crime é tripartido, sendo fato típico, ilícito e culpável. O fato típico é o primeiro substrato do crime, representando aquele fato previsto na lei como infração penal, constituído dos seguintes elementos: conduta, resultado, nexo de causalidade e tipicidade

ATENÇÃO

Não se pode confundir tipicidade penal com tipo penal! A tipicidade é o ajuste formal e material do fato ao tipo, por sua vez, o tipo penal é o modelo de conduta proibida pela norma.

6.1 – CONDUTA

A conduta é o elemento do fato típico que representa a ação e omissão humana, consciente e voluntária, que se destina a uma determinada finalidade. NÃO HÁ CRIME SEM CONDUTA. Vamos estudar juntos as teorias sobre o tema:

6.1.1Teoria causal-naturalista – Positivista/naturalista (Von Liszt e Beling): A ideia aqui é ver o direito com a exatidão das ciências naturais. Dessa forma o delito tem elementos objetivos, que são fato típico e ilicitude e subjetivos, onde se situa a culpabilidade.

A ação do ser humano é movimento de sua vontade que culmina na modificação do mundo exterior. Assim, fazem parte da ação: vontade, movimentação corporal e resultado. Vemos que a finalidade a qual a ação pretende obter faz parte da culpabilidade. Dessa forma, a ação é partida em duas frentes: o querer interno do sujeito está na culpabilidade e o processo causal está no fato típico. Em consequência disso o tipo penal é composto apenas pelos elementos objetivos e a culpabilidade, por seu turno, contêm apenas aspectos subjetivos. Em resumo, a conduta não tem finalidade ou querer interno, sendo somente um conteúdo causal. É na culpabilidade que estão os aspectos psicológicos do indivíduo.

A principal crítica a essa teoria é a ausência de finalidade na conduta, já que é impossível imaginar uma conduta humana não ter uma finalidade

6.1.2 Teoria causal-valorativa -neoclássica/normativista (neokantiana):

Essa teoria sai um pouco do conceito naturalista de direito, passando aos valores neokantistas, colocando o direito mais próximo da ideia do “dever ser”. Para essa teoria, a conduta é concebida da mesma forma que a causal naturalista estudada no tópico anterior. Em relação à ilicitude/antijuridicidade, ela está diretamente relacionada à tipicidade, sendo necessário a análise de elementos como a intenção na hora de praticar o crime. No que diz respeito à culpabilidade, a mesma é formada por elementos psicológicos e normativos. A culpabilidade, então, fica sendo entendida como a reprovabilidade pelo autor perante o ato praticado.

6.1.3Teoria Finalista: é a Teoria adotada pelo nosso Código Penal e estabelece que só é penalmente relevante a conduta praticada com dolo ou culpa. Desse modo, os elementos do dolo e culpa foram retirados da esfera da culpabilidade e passaram a compor o fato típico, sendo que a própria conduta típica passa a ser dolosa ou culposa.

Nesse sentido, os elementos objetivos do delito seriam a conduta, o nexo causal e o resultado, por sua vez, os elementos subjetivos seriam o dolo e a culpa.

6.1.4. Funcionalismo Teleológico, Dualista, moderado ou da Política Criminal (Claus Roxin) – essa teoria entende que o Direito Penal tem por objetivo tutelar os bens jurídicos e os valores essenciais à convivência pacífica da sociedade. Nesse caso, a culpabilidade é substituída pela análise da imputabilidade, do potencial consciência da ilicitude, da exigibilidade de conduta diversa e da necessidade da penal

6.1.5. Causas de Exclusão da Conduta: a) Caso Fortuito ou Força Maior – trata-se de circunstâncias que provocam fatos imprevisíveis ou inevitáveis, uma vez que não são reflexos da vontade humana. Cabe salientar que, embora a doutrina trate ambos como sinônimos, cumpre esclarecer que caso fortuito é a situação que decorre de fato alheio à vontade da parte, mas proveniente de fatos humanos. A força maior, por sua vez, é decorrente de forças naturais

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Vamos dizer que você foi assaltado à mão armada no interior de um ônibus, trem ou metrô. Nesse caso, a empresa de transporte será punida? Para o STJ trata-se de caso fortuito. A jurisprudência do Tribunal afirma que a empresa de transporte não deve ser punida por um fato inesperado e inevitável que não faz parte da atividade fim do serviço de condução de passageiros.

6.2. FORMAS DE CONDUTA

Conforme estudado, a conduta é a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a determinada finalidade. Conforme estudado, a ação é um comportamento positivo, ou seja, trata-se de um fazer e a omissão, por sua vez, é um comportamento negativo, o não fazer. Insta salientar que, nos termos do artigo 13, §2º do Código Penal, a omissão é penalmente relevante quando o agente devia e podia evitar o resultado. Vejamos:

Art. 13 – O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se

causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

[…]

Relevância da omissão (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado

O dever de agir incumbe a quem: (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

6.2.1. Conduta Dolosa

Trata-se da conduta descrita no tipo penal, praticada em decorrência da vontade consciente do agente que desejou provocar o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

Art. 18 CP – Diz-se o crime:

Crime doloso

I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo

Insta salientar que a noção do dolo não se esgota na realização da conduta, abrangendo também o resultado e as demais circunstâncias da infração penal. Ademais, podemos destacar que o dolo possui dois elementos que devem ser estudados, quais sejam:

a) Elemento volitivo: é a vontade de praticar a conduta descrita na norma;

b) Elemento intelectivo: consciência da conduta e do resultado.

No que tange à conduta dolosa, existem algumas teorias que devem ser estudadas:

a) Teoria da Vontade – o dolo é entendido como a vontade do agente que pratica a conduta movido pela consciência livre e espontânea em praticar o crime, ou seja, é a vontade consciente de querer praticar a infração penal

b) Teoria da Representação – nesse caso, fala-se em dolo sempre que o agente tiver a previsão do resultado como possível e, ainda assim, decidir prosseguir com a conduta. Essa teoria acaba abrangendo no conceito de dolo a culpa consciente.

c) Teoria do Consentimento (ou Assentimento) – nesse caso, há dolo quando o agente não só tem previsão do resultado, contudo, também decide continuar com a conduta, assumindo o risco de produzir tal resultado.

Vejamos:

Quanto às espécies de dolo, podemos citar:

a) Dolo Natural (ou Neutro) – é adotado pelos finalistas, sendo componente da conduta. Nesse caso, o dolo pressupõe apenas consciência e vontade. Nessa medida, a consciência da ilicitude é elemento da culpabilidade

b) Dolo Normativo (ou Híbrido ou colorido) – é aquele adotado pelos neokantistas e integra a culpabilidade, exigindo do agente vontade e a consciência da ilicitude. Ou seja, o indivíduo deve ter a consciência de que o que comete é errado para a sociedade e considerado crime para o direito penal.

c) Dolo Direto (ou de 1º grau) – é o dolo propriamente dito. Caracteriza-se quando o agente prevê o resultado, dirigindo a sua conduta na busca de realizar esse evento, de modo livre e consciente;

  1. d) Dolo Indireto (ou Indeterminado) – trata-se da modalidade na qual o agente pratica a ação, porém não deseja obter o resultado certo e determinado, sendo este previsível. O dolo indireto possui as seguintes modalidades:

Dolo Alternativo: nesse caso, o agente sabe que sua conduta pode gerar diversos resultados, sendo que todos esses satisfazem a sua vontade. O criminoso responde pelo crime mais grave, uma vez que sua vontade também foi direcionada àquele fim. O dolo pode ser objetivo, quando a vontade indeterminada estiver relacionada com o resultado em face da mesma vítima; ou subjetivo, quando a vontade indeterminada envolver as possíveis vítimas de um mesmo resultado.

EXEMPLIFICANDO

A namorada, integrante do Exército brasileiro, encontra o seu namorado beijando sua amiga! Muita enfurecida com ambos ela arremessa uma granada nos traidores, querendo matá-los ou feri-los. Para ela tanto faz, o que ela quer é se vingar!!

Dolo Eventual – nessa modalidade, a intenção do agente se dirige a um resultado, aceitando, porém, qualquer outro previsto. Nesse caso, o agente prevê pluralidade de resultados dirigindo a sua conduta para produzir um único resultado. Assim, ao contrário do dolo alternativo, o agente não tem a intenção de produzir o resultado mais grave, todavia, assume o risco de produzi-lo com a mesma intensidade

EXEMPLIFICANDO

Vamos supor que um sujeito está com muita raiva do prefeito de sua cidade e decide agredi-lo. Mas o seu ódio é tão grande que se da agressão o prefeito vier a falecer, o agente não se importa. Nesse caso, ele queria apenas machucar – lesão corporal – porém, aceita a possibilidade de um homicídio acontecer.

  1. e) Dolo Cumulativo – nessa situação, o agente possui duas vontades e realiza uma após a outra. Trata-se de um hipótese de progressão criminosa. Ex: o agente, depois de ferir a vítima, resolve matá-la;
  2. f) Dolo de Dano – o agente visa causar dano ao bem jurídico tutelado;

g) Dolo de Perigo – nesse caso, o agente não tem a intenção de causar dano ao bem jurídico, mas sim colocar em risco o mesmo, expondo-o a uma situação de perigo. Destaca-se que os crimes de perigo são punidos para evitar que o resultado danoso diverso da vontade do agente ocorra, sendo a ele imputado o delito, ainda que na forma culposa;

EXEMPLIFICANDO

Um perfeito exemplo do dolo de perigo é aquele exigido no crime de perigo para a vida ou saúde de outrem, vejamos: “Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.” Nesse caso, o simples fato de colocar a vítima em situação de risco já caracteriza a prática delitiva.

h) Dolo Genérico – nesse caso, o agente não possui uma vontade específica, somente visa praticar o fato criminoso. É o que ocorre no caso do crime de homicídio – matar alguém.

i) Dolo Específico – o agente visa praticar a conduta descrita como crime pela lei penal, ou seja, nesse caso o agente age movido por uma finalidade especial de agir e praticar a ação/omissão típica. Podemos citar como exemplo o crime previsto no art. 159 CP – “Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate” […] Desse modo, no dolo específico entende-se que além do dolo genérico, há uma intenção especial do agente.

j) Dolo Geral – ocorre quando o agente, imaginando já ter atingido um determinado resultado por ele desejado, pratica uma nova ação que efetivamente o provoca

EXEMPLIFICANDO

Luzia atira em Carola. Supondo que ela tenha morrido, joga-a no mar para se livrar do seu corpo. Porém, apenas quando é jogada ao mar que Carola efetivamente morre afogada.

k) Dolo de Segundo Grau (ou de Consequências Necessárias) – é uma espécie de dolo direto, entretanto, a vontade do agente se dirige aos meios utilizados para alcançar determinado resultado. O dolo de segundo grau abrange os efeitos colaterais, de verificação praticamente certa, para gerar o evento desejado. Nesse caso, o agente não persegue imediatamente esses efeitos colaterais, mas tem por certa a sua superveniência, caso se concretize o resultado pretendido

EXEMPLIFICANDO

“A’’ quer matar ‘’B’’, que é motorista de ônibus. Para isso, corta os cabos de freio do veículo em que ‘’B’’ viajará, deixando-os na iminência de se romperem. O dolo quanto a ‘’B’’ é direto de primeiro grau, e quanto aos demais passageiros que morrerão no acidente o dolo é direto e de segundo grau.

l) Dolo Antecedente (Inicial ou Preordenado) – trata-se da intenção de realizar o delito, antes mesmo da sua realização. Essa espécie de dolo não é punível pelo Direito Penal, pois, nesse caso, o agente ainda não realizou a conduta;

m) Dolo Subsequente – trata-se da intenção do agente em momento posterior à conduta delitiva e, em decorrência disso, também não é punível pelo direito penal. Nessa situação, podemos citar como exemplo o caso do mandatário que recebe determinado valor em dinheiro do mandante com o propósito de lhe dar uma destinação ilícita, porém, em seguida, dele se apropria.

n) Dolo Concomitante – é aquele que é concomitante à conduta e enseja a punição do autor. Nesse caso, o dolo persiste durante todo o desenvolvimento dos atos executórios;

o) Dolo de Propósito – trata-se da vontade livre e consciente que existia antes da prática do crime e se prolongou durante a execução delitiva.

EXEMPLIFICANDO

O agente planeja a prática de um crime de homicídio contra vítima previamente determinada.

p) Dolo de Ímpeto – é aquela vontade que só surge no momento da prática criminosa, não sendo planejada pelo agente.

EXEMPLIFICANDO

Gabriel, policial militar, estava a caminho de casa, quando foi surpreendido pelo carro de Gustavo que bateu na traseira de seu veículo. Nesse momento, ambos iniciaram uma discussão no meio do trânsito. Como resultado desse fato e da raiva do momento, Gabriel pegou sua arma e atirou em Gustavo causando sua morte.

6.2.2. Conduta Culposa

O crime culposo consiste numa conduta voluntária que tem por consequência um evento ilícito, não querido ou aceito pelo agente, mas que lhe era previsível – culpa inconsciente – ou excepcionalmente previsto – culpa consciente – e que poderia ser evitado se empregasse a cautela necessária.

Crime culposo

II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

São elementos da conduta culposa:

a) Conduta Humana Voluntária – no caso de crimes culposos, a ação do agente tem que ser livre de coação, sendo consciente e voluntária. Nesse caso, o agente não pode ser forçado a praticar a ação/omissão. Destaca- -se que para que reste configurado o crime culposo, o resultado lesivo não deve ser voluntário.

b) Inobservância do Dever Objetivo de Cuidado – é um elemento que está intimamente ligado à questão da previsibilidade e refere-se a algumas regras que são impostas pela sociedade aos cidadãos, com o objetivo de fazer com que ele evite a ocorrência de situações de perigo a si e a outrem, bem como coloque em risco os bens jurídicos tutelados. Nesse caso, o operador do direito deve analisar as circunstâncias do caso concreto, verificando se uma pessoa de diligência mediana evitaria o resultado.

A inobservância do dever objetivo de cuidado é manifestada por meio da imprudência, negligência e imperícia:

Imprudência – trata-se de uma conduta precipitada e sem o devido dever de cautela, ou seja, o agente age sem a cautela e o zelo esperado durante a sua ação.

EXEMPLIFICANDO

O agente avança o semáforo vermelho e atropela uma pessoa, causando-lhe as lesões que foram à causa de sua morte.

Negligência – o agente deixa de fazer algo que sabidamente deveria ter feito, ausência de precaução.

EXEMPLIFICANDO

Mariazinha é babá de Felipo. Certa tarde, enquanto assistia tv, ela percebeu que a criança estava brincando em cima do sofá, próximo de uma janela aberta. Entretida com a novela, não quis tirar Felipo do local ou, ao menos, fechar a janela. Ato contínuo, Felipo caiu da janela e teve diversas lesões. Nesse caso, Mariazinha foi negligente e responderá por lesão corporal culposa.

Quanto a conduta culposa, iremos analisar os seguintes tipos de Culpa:

i) Culpa Consciente: é aquela na qual o agente prevê o resultado, porém, tem plena confiança de que ele não irá ocorrer ou que conseguirá evitá-lo. Nesse caso, o sujeito ativo não assume o risco de produzi-lo.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Vejamos o caso do artista de circo que usa facas para acertar um alvo e convida uma pessoa da plateia para participar do espetáculo. Caso o atirador de facas acerte a pessoa, ele responderá pelo crime praticado a título de culpa, sendo esta culpa consciente, porque ele sabia da possibilidade de atingir a pessoa, mas, confiando nas suas habilidades e experiência, acreditava sinceramente que podia evitar a ocorrência do resultado lesivo.

(ii) Culpa Inconsciente (Sem Previsão) – trata-se do caso no qual o agente não prevê o resultado, entretanto, em decorrência das circunstâncias do caso concreto, a figura do “homem médio” conseguiria prever.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Se uma pessoa arremessa um objeto pela janela de casa, acreditando que não passará ninguém no local, e atinge um outro indivíduo causando-lhe uma lesão, deve responder pelo crime praticado a título de culpa, porque nessa situação não era necessária nenhuma qualificação especial para que o resultado lesivo pudesse ser previsto. Em tese, qualquer pessoa poderia prever que o objeto poderia atingir um pedestre se arremessado em um local onde há trânsito de pedestres.

c) Culpa Própria (Culpa Propriamente Dita) – é aquela em que o agente não quer e não assume o risco de produzir o resultado, mas acaba lhe dando causa por imprudência, negligência ou imperícia – CONDUTA VOLUNTÁRIA + RESULTADO INVOLUNTÁRIO

d) Culpa Imprópria (Culpa por Equiparação, por Assimilação, ou por Extensão) – é aquela na qual o agente, mediante erro evitável, imagina que está em uma situação que se de fato existisse extinguiria a ilicitude do seu comportamento

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Luizinho foi ameaçado de morte através de uma carta anônima. Com medo da ameaça, começa a portar uma faca para se proteger. Certo dia, um desconhecido bateu em sua porta e, ao verificar pelo olho mágico, Luizinho vê um homem “mal-encarado” e acredita que este é seu algoz. Com a faca em mãos, abre a porta e esfaqueia o rapaz. Posteriormente, descobre que sua vítima, na verdade, era apenas o novo vizinho que foi se apresentar e pedir um punhado de sal. Nesse caso, Luizinho incidiu em erro inescusável, pois bastava perguntar o que a vítima queria ou chamar a polícia para sanar sua dúvida. Porém, ele acreditou que estava em situação de legítima defesa. Em casos como esse, o legislador entende que o agente deve responder a título de culpa imprópria pela prática delitiva.

Cabe destacar, ainda, algumas situações que podem acontecer no caso concreto e que interferem na delimitação da culpa do agente. Vejamos:

Caso Fortuito e Força Maior – conforme estudado, trata-se dos fatos que não podem ser previstos, uma vez que não dependem da vontade humana. Desse modo, para que o crime culposo ocorra faz-se necessário a previsibilidade do resultado, não tendo como caracterizá-lo se não houver possibilidade de previsão;

Princípio da Confiança – quando o agente age em conformidade com aquilo que é esperado por toda a sociedade, preservando o seu dever de cuidado, o mesmo não responde penalmente pelo resultado involuntário causado pela sua conduta

Erro Profissional – nesse caso, os métodos científicos e todo o conhecimento profissional adquirido pelo agente se tornam insuficientes para evitar a produção do resultado;

EXEMPLIFICANDO

Joana necessita de uma cirurgia muito delicada, para a qual a medicina ainda não desenvolveu uma técnica segura. Seu médico João, muito experiente e conceituado, deseja realizar o procedimento utilizando todos os métodos cirúrgicos mais avançados. Contudo, durante a cirurgia, em razão de algumas complicações da situação, João comete um erro que acaba causando a morte de Joana. Nessa situação, evidencia-se o erro profissional que não caracteriza a culpa, uma vez que resta ausente a imperícia.

Risco Tolerado – ocorre um risco que é socialmente tolerado. Nesse caso, o grau de reprovação do risco assumido é inversamente proporcional à importância do ato. É a situação, por exemplo, do médico que realiza procedimento experimental em paciente com doença grave, sem perspectiva de tratamento adequado pelos métodos já consagrados.

6.2.3. Crime Preterdoloso

A conduta preterdolosa pode ser definida como aquela que refere-se à prática de um crime doloso que se torna mais grave em decorrência de um resultado culposo, ou seja, o agente pratica uma conduta com determinado objetivo, mas ocorre um resultado além do esperado, que é consequência da culpa. Em outras palavras, o agente age com dolo na conduta antecedente e culpa no que se relaciona à consequência do resultado mais gravoso.

EXEMPLIFICANDO

Art. 129, §3º Lesão Corporal seguida de morte – nesse caso, resta consubstanciado a ocorrência de dolo no fato antecedente (lesão corporal) e culpa no consequente (morte).

6.3. Resultado

Como vimos, toda conduta delitiva gera um resultado lesivo que define o fato como típico e, por isso, punível no âmbito do Direito Penal. Em relação ao resultado, existem duas Teorias que explicam seus fundamentos:

Teoria Naturalística: nesse caso, o resultado é a modificação do mundo exterior por um comportamento humano, não levando em conta a análise da norma jurídica. De acordo com essa Teoria, podem existir crimes sem resultado, como os crimes de mera conduta.

EXEMPLIFICANDO

Crime de Invasão de Domicílio – Art. 150: Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.

Teoria Jurídica: nesse caso, o resultado é a lesão ao bem jurídico protegido pela norma penal. Conforme essa Teoria, não há crime sem resultado, pois, obrigatoriamente, deve existir uma lesão ao bem. Nessa medida, todos os crimes possuem resultado jurídico.

6.4. Tipicidade

Conforme estudado, a tipicidade refere-se à correspondência entre a conduta praticada pelo agente, levando-se em consideração o caso concreto, com a norma prevista em abstrato. Na situação em que essa correspondência ocorrer diretamente, dizemos que a adequação é imediata. Contudo, quando se fizer através de uma norma de extensão, por sua vez, a adequação típica será mediata.

A tipicidade penal evoluiu ao longo do tempo, sofrendo diversas modificações significativas à medida que os padrões sociais foram alterados, o que contribuiu para o próprio processo de inovação dos tipos penais.

Vejamos:

6.4.1. Tipicidade Conglobante

Criada por Eugênio Raul Zaffaroni, essa Teoria estabelece que não se pode tipificar uma conduta que é tolerada pelo Estado e aceita por toda a sociedade, ou seja, o que é permitido por uma norma não pode ser proibido por outra. Nesse sentido, o juízo da tipicidade deve ser analisado em conformidade com o ordenamento jurídico como um todo, considerado em sua globalidade.

Conforme essa Teoria, no caso concreto a conduta praticada pelo agente é contrária à norma e ofensiva aos bens jurídicos tutelados pelo direito penal, sendo composta pela tipicidade material e pela antinormatividade do ato. Cumpre salientar que a antinormatividade consiste na conduta humana contrária ao ordenamento jurídico. Desse modo, Zaffaroni visa excluir do alcance do Direito Penal aquelas condutas que não são proibidas efetivamente, mas têm aparência proibitiva.

6.4.2. Elementos do Tipo Penal

a) Objetivos – são aqueles que se interligam aos aspectos materiais e normativos do delito, podendo ser:

Descritivos – quando indicam e descrevem os aspectos materiais da conduta.

EXEMPLIFICANDO

“Matar alguém”. “Matar” é eliminar a vida, “alguém” pessoa humana. Portanto, não há necessidade alguma de valoração ou interpretação para compreensão do tipo;

Normativos – são aqueles elementos que exigem um juízo de valor do julgador para a completa compreensão do fato típico.

EXEMPLIFICANDO

Art. 233 – Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.

O conceito de ato obsceno depende de um juízo de valor;

b) Elementos Subjetivos – são os elementos que influenciam ou não o agente a praticar a conduta delitiva;

6.4.3. Modalidades do Tipo Penal

a) Tipo congruente e tipo incongruente – no tipo congruente existe uma exata correspondência entre os elementos objetivos e subjetivos, não se exigindo qualquer intenção especial do agente, além do dolo normal do crime (ex: homicídio simples 121, CP). No tipo incongruente, por sua vez, além do dolo de cometer a ação/omissão, exige-se um requisito subjetivo do agente, sendo o tipo subjetivo diverso do tipo objetivo (ex: art. 158 CP “Art. 158 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa”-> Note-se que o tipo exige um requisito subjetivo transcendental (que vai além do dolo): a intenção de obter vantagem econômica.).

b) Tipo normal e tipo anormal – o tipo normal é caracterizado por apresentar somente os elementos objetivos. O tipo anormal, por sua vez, apresenta elementos objetivos e subjetivos;

c) Tipo simples e tipo misto – o tipo simples é aquele que possui um único núcleo que define a conduta por completo (ex: Crime de furto). O tipo misto, noutra medida, apresenta duas ou mais condutas em seu núcleo, originando os delitos de ação múltipla (ex: Corrupção ativa art. 333 CP). O tipo misto pode ser:

– Alternativo – nesse caso existe apenas um único crime, porém, o próprio tipo penal prevê múltiplos núcleos do tipo, ou seja, as condutas previstas são fungíveis, tanto faz o cometimento de uma ou de outra, uma vez que afetam o mesmo bem jurídico. Ex: No tráfico de drogas, por exemplo, se “A” importa a pasta base de cocaína, prepara a substância e expõe o produto final à venda, será punido por apenas um delito, embora, no caso, a pena possa ser aumentada com base nas circunstâncias judiciais.

– Cumulativo – ao contrário, as condutas não são fungíveis e atingem diversos bens jurídicos. Nesse caso, o tipo penal prevê diversas condutas que, se praticadas uma atrás da outra mesmo em um só contexto, se amoldam no concurso material de crimes. Ex: art. 198 do Código Penal, que pune as condutas de constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho, ou a não fornecer a outrem ou não adquirir de outrem matéria-prima ou produto industrial ou agrícola.

d) Tipo fechado e tipo aberto – o tipo fechado é aquele que descreve por completo o crime e o tipo aberto, por sua vez, necessitam que o intérprete da norma o complemente;

e) Tipo fundamental e tipo derivado – tipo fundamental é a forma simples dos delitos, os tipos derivados, por sua vez, são as formas acrescidas de majorantes ou minorantes;

Para aqueles que aderem a teoria finalista, o dolo e a culpa estão internalizados na conduta do agente, sendo os tipos penais classificados como anormais.

DICA

Tipo fechado: art. 121 CP – matar alguém: os dois elementos constantes do tipo penal são meras descrições, sem qualquer valoração a exigir do intérprete conceitos que vão além da norma.

Tipo aberto: O tipo penal aberto, por outro lado, é incompleto, demandando do intérprete um esforço complementar para situar o seu alcance. Ao estabelecer, no § 3º, a pena de detenção de um a três anos “se o homicídio é culposo”, o art. 121 impõe ao aplicador da lei que explore os conceitos de culpa para apurar se a conduta se adéqua ao tipo penal. 

f) Tipo de autor e tipo de fato – O tipo de autor é aquele influenciado pelo Direito Penal do Autor, levando-se em consideração as condições pessoais do agente, sem levar em conta a sua conduta praticada. No tipo de fato, por sua vez, o que deve ser punido é a conduta praticada pelo agente.

6..5. ERRO DE TIPO

O erro refere-se a uma falsa percepção da realidade. Quem nunca avistou um amigo na rua e se dirigiu até ele para o cumprimentar, mas chegando mais perto percebeu que se tratava de um estranho? É uma tremenda gafe, mas é um exemplo de se estar em estado de erro.

O erro do tipo pode ser essencial ou acidental. O essencial está definido no caput do art. 20 do CP, qual traz as descriminantes putativas, erro provocado por terceiro e erro sobre a pessoa. Após estudarmos esses conceitos do art.20, vamos estudar o erro acidental.

6.5.1.O erro do tipo essencial – previsto no caput do art. 20 CP

Nos termos do caput do art. 20 do Código Penal Brasileiro, o erro do tipo essencial é o erro sobre o elemento constitutivo do tipo legal do crime e exclui o dolo (vontade de cometer o crime), mas permite a punição do crime na modalidade culposa, se prevista em lei. Nesse sentido, podemos dizer que o erro de tipo se amolda em uma falsa representação da realidade pelo sujeito que pratica uma conduta delitiva sem possuir a devida consciência de que a sua ação representa um tipo penal.

Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Trata-se de erro quanto às circunstâncias elementares do tipo, ou quaisquer outros aspectos que compõem a conduta descrita no tipo penal. Nesse caso, o erro recai sobre os dados principais do tipo penal e cabe destacar que, caso o agente tivesse sido avisado do erro, ele não cometeria o delito. O erro de tipo essencial pode ser evitável ou inevitável, a depender de como o “homem médio” agiria na situação, vejamos:

Inevitável (Justificável ou Escusável ou Invencível) – trata-se da modalidade de erro que exclui o dolo e a culpa, em decorrência das circunstâncias da ação que não puderam ser previstas pelo agente. Insta salientar que o simples fato de ser erro de tipo essencial já exclui o dolo, pois na conduta do agente não existe consciência, tampouco previsibilidade. Nesse caso, qualquer pessoa da sociedade, ainda que esteja agindo com o devido dever de cuidado, teria cometido o erro.

EXEMPLIFICANDO

Bráulio, rapaz de 18 anos, conhece Paula em um show de rock em uma casa noturna. Os dois, após conversarem um pouco (tem que conversar muuuuuuito meninas, maaaas vamos voltar ao exemplo), resolvem dirigir-se a um motel e ali, de forma consentida, o jovem mantém relações sexuais com Paula. No outro dia, Bráulio descobre que a moça, na verdade, tinha apenas 13 anos e que somente conseguira entrar no show mediante apresentação de carteira de identidade falsa. Nesse caso Bráulio não praticou crime, pois agiu em hipótese de erro de tipo essencial e inevitável.

Evitável (Injustificável, Inescusável ou Vencível) – nesse caso, o agente não agiu dotado de plena consciência acerca da sua conduta, excluindo o dolo. Porém, o perigo e os possíveis resultados são previsíveis, punindo na modalidade culposa, se prevista. Em outras palavras, somente o dolo é excluído, sendo que se houver previsão culposa para o delito haverá a responsabilização do sujeito. Deve-se atentar para a advertência feita pelo artigo 20, caput, e também prevista no artigo 18 parágrafo único, ambos do CP: somente é possível punir a conduta culposa se houver previsão legal desta modalidade.

EXEMPLIFICANDO

O caçador que, percebendo um movimento atrás de uma moita, dispara sua arma de fogo sem qualquer cuidado, não verificando tratar-se de homem ou de um bicho (animal), matando outro caçador que lá se encontrava.

6.5.2. Descriminantes putativas

Art. 20 § 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Erro determinado por terceiro (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Art. 20 § 2º – Responde pelo crime o terceiro que determina o erro. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

EXEMPLIFICANDO

Médico que ordena enfermeira a ministrar determinada substância tóxica no paciente. Aplicado o produto, o paciente morre. 

Erro sobre a pessoa (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Art. 20 § 3 º – O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

OBS: elementar significa o elemento integrante do crime. São situações que a lei descreve, sem a qual não há o crime.

6.5.3.Erro de Tipo Acidental – trata-se daquele erro que ocorre quando o agente possui vontade e consciência na realização da sua conduta, porém, erra quanto a elementos secundários e, por vezes, acidentais do tipo. Nesse caso, o agente age com a consciência do fato, errando a respeito de algum elemento do delito ou quanto à maneira de execução. O erro de tipo acidental pode recair:

Sobre o Objeto – nesse caso, o erro recai sobre o objeto da infração penal, ou seja, o agente pratica o crime sobre outro objeto alheio à sua vontade, respondendo pelo delito normalmente, sem a exclusão do dolo ou da culpa e sem a isenção de pena. Destaca-se que, nesse caso, o agente responde pelo delito levando em consideração o objeto material efetivamente atingido e não o desejado – Teoria da Concretização.

EXEMPLIFICANDO

O agente queria furtar um celular, porém, ao “enfiar” uma mão no bolso da vítima retira uma carteira.

Sobre a Pessoa – encontra-se previsto o art. 20, §3º Código Penal. Nesse caso, ocorre um erro quanto à representação do alvo, ou seja, o agente, querendo praticar a conduta delitiva sobre uma pessoa, acidentalmente atinge outra. Nessa situação o agente responde pelo delito normalmente, sem a exclusão do dolo ou culpa e sem a isenção de pena

Insta ressaltar que essa previsão legal adota a Teoria da Equivalência, uma vez que para definir as circunstâncias do delito são analisadas as qualidades ou condições da vítima virtual que o agente buscava atingir.

EXEMPLIFICANDO

Digamos que José, por erro na representação da pessoa, mata seu tio, irmão gêmeo de seu pai (vítima pretendida). Nesse caso, o erro é irrelevante, haja vista a existência do dolo de matar.

Sobre a execução (aberratio ictus) – previsto no art. 73 do CP, ocorre quando o agente atinge uma pessoa diversa daquela que desejava, em decorrência da falta de habilidade e destreza nos meios de execução. Nesse caso, ocorre um erro na execução do crime sem haver confusão mental por parte do agente

Vejamos:

Art. 73 – Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo–se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.

O erro sobre a execução (aberratio ictus) possui as seguintes consequências:

resultado único: o agente atinge somente a pessoa diversa da pretendida, sendo punido levando em consideração apenas as qualidades da vítima visada – Teoria da Equivalência.

resultado duplo: o agente atinge também a pessoa pretendida, respondendo pelos crimes aplicando-se a regra do concurso formal.

– Resultado Diverso do Pretendido (aberratio criminis) – encontra-se previsto no art. 74 do CP. Nesse caso, o agente atinge outro bem jurídico diverso do pretendido, em decorrência de alguma falha nos meios de execução

“Art. 74 – Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.”

Entretanto, cabe salientar que no erro de execução os bens jurídicos atingidos são pessoas, no resultado diverso do pretendido, por sua vez, a natureza do bem é diferente, como por exemplo: coisa e pessoa. Caso o fato for previsto em sua modalidade culposa, o agente responde pelo resultado ocorrido. Todavia, se o bem jurídico pretendido também for atingido, haverá concurso formal de crimes. 

EXEMPLIFICANDO

“A”, visando a danificar uma vitrine, atira uma pedra e atinge uma pessoa, causando-lhe lesões. “A” responderá por lesões corporais culposas (art. 74, CP). Todavia, se “A”, com uma pedra, pretende atingir “B”, mas acaba atingindo somente uma janela, não responderá por crime de dano, visto que não há previsão culposa para este delito.

TRADUÇÃO JURÍDICA

“Como assim, prof.?”

Exemplo 1: O agente joga uma pedra na vidraça e acerta um transeunte. Nesse caso, responderá por lesão corporal culposa.

Exemplo 2: O agente joga uma pedra no transeunte e acerta a vidraça. Nesse caso, responderá por tentativa de lesão corporal culposa, uma vez que o dano culposo só é crime no Código Penal Militar.

Exemplo. 3: O agente querendo atingir uma coisa, vem a lesionar uma pessoa (aberratio criminis com resultado duplo). Nesse caso, conforme a regra do art. 74, existem dois delitos: tentativa de dano e o homicídio culposo ou lesão corporal culposa em concurso formal, aplicando-se a pena do crime mais grave com o acréscimo de um sexto até metade.

6.5.4. Delito Putativo por Erro de Tipo: nesse caso, o agente pratica um fato que não se constitui crime, imaginando que estava agindo ilicitamente. Ou seja, o agente pretende cometer um crime, cogita-o, prepara-o, porém o resultado não configura crime. Vejamos as espécies de delito putativo:

a) Erro de Subsunção: nesse caso, ocorre uma valoração jurídica equivocada, ou seja, ocorre uma interpretação jurídica errada daquilo que realmente está previsto no tipo penal. O erro de subsunção não exclui dolo, nem a culpa, tampouco isenta o agente da pena. O agente responderá pelo crime, porém, o erro pode servir como atenuante, nos termos do art. 66 do Código Penal “A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei”.

EXEMPLIFICANDO

Luís realizou a falsificação de um cheque. Na audiência de instrução, alegou que ignorava a equiparação do cheque a documento público.

b) Erro Determinado por Terceiro: previsto no art. 20, §2º do CP, trata-se da hipótese em que o agente é levado a erro por um terceiro. Nesse caso, há somente a punição do agente que ordenou o feito, na condição de autor mediato, seja dolosa ou culposamente. O agente que executou a ação e foi induzido a erro, por sua vez, não responderá pelo delito, salvo se tiver atuado também com dolo ou culpa, hipótese em que haverá concurso de pessoas.

EXEMPLIFICANDO

Um médico, com intenção de matar seu paciente, induz dolosamente a enfermeira a ministrar dose letal ao enfermo. O médico (autor mediato) responderá por homicídio doloso, enquanto a enfermeira (autor imediato), em regra, fica isenta de pena, salvo se demonstrada a sua negligência, hipótese em que será responsabilizada a título de culpa.

6.5.5. Erro sobre o nexo causal: o agente produz o resultado desejado, porém, em razão de nexo causal diverso do pretendido. Nesse caso, o agente responde pelo crime, levando-se em consideração o nexo real. O referido erro pode ser:

– em sentido estrito: ocorre quando o agente, mediante um só ato, provoca o resultado visado, porém, com outro nexo causal.  

EXEMPLIFICANDO

“A” empurra “B” de um penhasco para que morra afogado. Contudo, “B” morre em razão de traumatismo craniano em decorrência da queda nas pedras.

dolo geral/erro sucessivo: o agente, mediante conduta desenvolvida em pluralidade de atos, provoca o resultado pretendido, porém com outro nexo causal.

EXEMPLIFICANDO

“A” dispara contra “B” e imaginando que “B” já estivesse morto, atira o seu corpo ao mar. Entretanto, “B” morre afogado.

6.6. Nexo de Causalidade

O nexo de causalidade é a relação de causa e efeito existente entre a conduta voluntária do agente e o resultado dela proveniente. A mencionada relação busca aferir se o resultado pode ser atribuído objetivamente ao sujeito ativo como obra do seu comportamento típico.

O nosso ordenamento jurídico, ao disciplinar as consequências do nexo causal, adotou a Teoria da equivalência dos antecedentes causais ou da conditio sinequa non (art. 13 CP), que prevê que causa é a ação ou omissão, sem a qual o resultado não teria ocorrido. Dessa forma, tudo aquilo que contribuir para o resultado, será considerado uma causa delitiva

Art. 13 CP: O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”

6.6.1. Concausas

O resultado, não raras vezes, ocorre em razão de uma pluralidade de comportamentos, associações de fatores, entre os quais a conduta do agente aparece como seu principal – mas não único – elemento desencadeante. No caso concreto, podemos perceber que em algumas situações o resultado lesivo pode ser produzido por uma ou mais de uma conduta. Nesse sentido, a pluralidade de condutas é denominada de concausas.

A concausa pode ser dividida em duas espécies:

Concausas absolutamente independentes – nesse caso, o resultado lesivo não foi causado pelo comportamento do agente, mas sim, por outros fatos. Esse fato/causa pode ser:

  • Preexistente – a causa que deu origem ao resultado já existia antes da conduta praticada pelo agente;

EXEMPLIFICANDO

Pedro na intenção de suicidar-se ingere um veneno de longa intoxicação. Logo após esse fato, Maria desfere algumas facadas em Pedro pois já estava desejando matá-lo. Contudo, Pedro falece em decorrência do seu próprio envenenamento e não em razão das lesões provocadas por Maria.

  • Concomitante – nesse caso, a causa que deu origem ao resultado acontece no mesmo momento da conduta praticada pelo agente;

EXEMPLIFICANDO

A” efetua disparos de arma de fogo contra “B”, que vem a falecer em razão de um súbito colapso cardíaco. Nesse caso, não se trata de doença cardíaca preexistente, mas sim de um colapso ocorrido no mesmo instante da conduta do agente!

  • Superveniente – a causa que deu origem ao resultado acontece após a conduta praticada pelo agente

EXEMPLIFICANDO

Filipe envenena Gabriel. Porém, no mesmo dia a viga de uma construção cai sobre Gabriel, que morre por conta dos ferimentos causados pelo acidente.

Concausas relativamente independentes – nesse caso, o resultado lesivo ocorre em decorrência de duas causas interligadas: uma realizada pelo próprio agente ea outra que não tem qualquer relação com a sua conduta pode ser:

  • Preexistente – a conduta do agente tem liame com uma causa anterior à sua ação. Nesse caso, ambas são responsáveis pela produção do resultado;

EXEMPLIFICANDO

Gustavo é hemofílico e, no intuito de matá-lo, Carla o fere com facadas. Nesse caso, Gustavo morre em face da complicação dos ferimentos decorrentes da hemofilia, caracterizando assim uma concausa relativamente independente à preexistente

  • Concomitante – a conduta do agente tem liame com uma causa responsável pelo resultado e é concomitante à sua ação, porém, independente dela. Nesse caso, ambas são responsáveis pela produção do resultado;

EXEMPLIFICANDO

Vênus atira em Marte. Em decorrência do susto que levou com os disparos, Marte tem um ataque cardíaco. Nesse caso, a tentativa de homicídio contribuiu diretamente para a produção do resultado morte.

Superveniente – a conduta do agente tem liame com uma causa posterior à sua ação, de modo que ambas são responsáveis pela produção do resultado; Art 13, § 1º CP – A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado, os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

EXEMPLIFICANDO

José encontra seu desafeto num bar e efetua-lhe disparos. A vítima, ferida, é levada ao hospital. Durante o percurso, a ambulância é atingida frontalmente com uma carreta, matando todos os ocupantes da ambulância. Será que João responderá por homicídio tentado ou consumado? Ele responderá por homicídio tentado, pois a causa superveniente (que ocorreu depois do evento), por si só, produziu o resultado morte. João responderá sobre os fatos anteriores, ou seja, os disparos que não foram capazes de matar seu desafeto.

Nesse caso, é aplicada a Teoria da Condição Qualificada ou da Causalidade Adequada, segundo a qual causa é a pessoa, o fato ou a circunstância que, além de praticar um antecedente indispensável à produção do resultado – que para a causalidade simples é o que basta – realiza uma atividade adequada à sua concretização

EXEMPLIFICANDO

Um belo dia, Chimbinha sofre uma agressão de Joelma. Chimbinha foi socorrido pela ambulância, que rapidamente o levou para o hospital, contudo, no meio do trajeto o automóvel sofre um acidente, capotando e provocando a morte de Chimbinha.

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