Inicialmente, é importante entender o Princípio da Territorialidade, adotado pelo Direito Penal Brasileiro, que prevê que a norma penal somente será válida no território do Estado que a editou, levando-se em consideração o solo onde ocorreu a empreitada delitiva, deixando de lado a nacionalidade dos sujeitos envolvidos ou do bem jurídico violado (art. 5º do Código Penal). Cabe destacar que o território nacional é considerado todo o espaço onde o Estado exerce sua soberania.
“Como assim, prof.?”
Robert, cuja nacionalidade é americana, furtou Paul, nacional da Inglaterra na cidade de São Paulo. Aplica-se no caso, as leis penais editadas pelo Brasil.
O Brasil adota a territorialidade temperada, uma vez que é possível, em razão das regras internacionais, que um crime cometido no Brasil não sofra as consequências das leis brasileiras. Ex.: imunidade diplomática.
Embora o Código Penal adote o Princípio da Territorialidade, de forma relativizada, em decorrência da existência dos tratados, regras e convenções internacionais e, por conta dessas exceções, ocorrem fenômenos como a extraterritorialidade e a intraterritorialidade. Contudo, no que se refere às contravenções penais, cabe destacar que o princípio da territorialidade é absoluto.
Territorialidade | Extraterritorialidade | Intraterritorialidade |
Local do crime: Brasil | Local do crime: estrangeiro | Local do crime: Brasil |
Lei aplicável: Brasileira | Lei aplicável: Brasileira. Em casos excepcionais, a nossa lei poderá extrapolar os limites do território, alcançando crimes cometidos exclusivamente no estrangeiro. | Lei aplicável: estrangeira. Ex.: imunidade diplomática. |
a) Conceito de Território Nacional: Além disso, é importante entender qual é a extensão do território nacional, determinada no art. 5º, §1º do Código Penal. Uma vez que, além de o território ser considerado a totalidade do espaço onde o Estado exerce sua soberania, considera-se, para efeitos penais, como extensão do território nacional, as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.
Art. 5º, §2º do CP: “É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.”
MAS PROF., APLICA-SE A LEI BRASILEIRA AO CRIME COMETIDO A BORDO DE EMBARCAÇÃO PRIVADA ESTRANGEIRA DE PASSAGEM PELO MAR TERRITORIAL BRASILEIRO?
Em regra, não. Somente àquelas que estiverem em porto ou mar territorial do Brasil. Art. 3º da Lei 8.617/93: “É reconhecido aos navios de todas as nacionalidades o direito de passagem inocente no mar territorial brasileiro”.
Uma embarcação privada de Portugal, a caminho do Uruguai, passa pelo mar territorial brasileiro. Nesse momento, acontece um crime. Nesse caso, estando a embarcação “de passagem”, em regra não é aplicada a lei brasileira. Ou seja, quando a embarcação estiver “de passagem” não será aplicado o disposto no art. 5º, §2º do Código Penal.
As Embaixadas não são uma extensão do território que representam, apesar de gozarem de inviolabilidade. Ex.: a Embaixada Brasileira em Lisboa não é extensão do território brasileiro, ou seja, crime cometido na embaixada é tido como cometido em Lisboa/Portugal. Entretanto, a polícia de Lisboa não pode adentrar na embaixada como bem entender, devendo obedecer a regras de Direito Internacional e o procedimento diplomático.
Lugar do Crime: Neste caso, o ordenamento jurídico adotou a Teoria da Ubiquidade, de modo que o local do crime pode ser o local da conduta do agente infrator ou o local do resultado (art. 6º CP). Diante disso, essa teoria soluciona os conflitos do Direito Penal Internacional, permitindo que, embora iniciada ou terminada a prática delitiva em outro país, será aplicada a lei penal brasileira.
“Como assim, prof.?”
Mia está em Madri, mas tem a intenção de matar Luísa que reside em São Paulo. Dessa forma, ela envia uma carta-bomba da Espanha para o Brasil. Quando Luísa recebeu a carta e a abriu, a bomba foi detonada, provocando a sua morte. Nesse caso, mesmo estando em Madri, Mia irá responder pelo crime de acordo com as leis brasileiras.
Se no Brasil ocorre somente o planejamento e/ou preparação do crime, esse fato, em regra, não interessa ao direito brasileiro, salvo quando a preparação, por si só, caracterizar crime (ex.: associação criminosa).
LUTA:
LUGAR DO CRIME: Teoria da Ubiquidade -> L (Lugar) + U (Ubiquidade);
TEMPO DO CRIME: Teoria da Atividade -> T (Tempo) + A (Atividade);
Supõe-se que a vítima tenha sido alvejada com tiros no Paraguai e falece no Brasil. O Paraguai tem soberania para apurar o crime e condenar o réu. A pena eventualmente aplicada, ainda que com trânsito em julgado lá, não impede que o Brasil instaure o devido processo penal, inclusive condenando também o réu. Não obstante, o cumprimento da pena deverá ser computado com o do estrangeiro e, assim, seguir-se-á a regra contida no artigo 8º, CP (atenuação ou cômputo).
b) Extraterritorialidade: O art. 7º do CP estabelece diversas hipóteses em que a lei penal brasileira se aplica aos delitos praticados no estrangeiro, denominado fenômeno da extraterritorialidade.
A extraterritorialidade subdivide-se em incondicionada, condicionada e hipercondicionada, norma essa que não se aplica às contravenções penais, pois essas somente são puníveis se praticadas no Brasil. Vejamos essas aplicações:
c.1) Extraterritorialidade Incondicionada: refere-se aos casos elencados no artigo 7º, inciso I do CP, uma vez que nessas situações aplicam-se as leis penais brasileiras obrigatoriamente, independentemente de qualquer condição, até mesmo no caso em que o acusado já foi processado e julgado no exterior
Art. 7º – Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I – Os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
Alguns autores consideram essa determinação acima inconstitucional, uma vez que, segundo o entendimento desses, isso fere o princípio do non bis in idem, provocando dupla condenação do agente.
A extraterritorialidade incondicionada é uma situação excepcional que tolera bis in idem (relativizado) em razão da soberania dos países envolvidos (posicionamento majoritário). Trata-se de bis in idem relativizado em razão do disposto no art. 8º do Código Penal (leitura obrigatória). A vedação ao bis in idem não é absoluta.
c.2) Extraterritorialidade Condicionada: nesse caso, a lei brasileira será aplicada ao agente que cometer crime no estrangeiro desde que presente algumas condições, tais como o agente deve ter entrado no território nacional; o fato deve ser punível no país em que foi praticado; o fato deve estar incluído entre aqueles que a lei brasileira autoriza a extradição; o agente não pode ter sido perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, sua punibilidade não pode estar extinta, segundo a lei mais favorável, vejamos:
Art. 7º – Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
II – Os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.
1º – Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
Conforme descrito acima, nessas hipóteses, para fins de aplicação da lei penal brasileira, impõe-se o concurso das seguintes condições (extraterritorialidade condicionada):
“§ 2º – Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.”
c.3) Hipercondicionada: está positivada no artigo 7º, §3º, do Código Penal. Nesse caso, ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, para que a lei brasileira seja aplicada, faz-se mister apresentar além das condições previstas no §2º, os seguintes requisitos: não ter sido pedida ou ter sido negada a extradição; ter havido requisição do ministro da Justiça.
“Como assim, prof.?”
Nesse último caso, o estrangeiro cometeu um crime contra o brasileiro fora do Brasil (princípio da nacionalidade passiva) e posteriormente ingressou no território nacional, sendo cumpridos os requisitos do §2º do art. 7º do CP, mas na situação não foi pedida a sua extradição ou ela foi negada. Nesse caso, feita a requisição do Ministro da Justiça, o processo deverá ser instaurado no Brasil.
d)Pena Cumprida no Estrangeiro: No ordenamento jurídico brasileiro há a possibilidade de um cidadão ser condenado no estrangeiro e no Brasil, simultaneamente, pelo mesmo crime.
No entanto, o art. 8º do Código Penal estabelece que a pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas, observando os critérios de proporcionalidade e razoabilidade.
“Como assim, prof.?”
Rodrigo praticou na Itália um crime e foi condenado a 2 anos de reclusão no exterior e a 3 anos de reclusão no Brasil. Cumpriu toda a sua pena em um presídio localizado em Roma e foi liberado após o cumprimento. Voltou para o Brasil e, ao chegar na Bahia, foi surpreendido novamente com um mandado de prisão expedido pela justiça brasileira. Nesse caso, a pena cumprida no exterior será descontada da pena imposta no Brasil e, assim, Rodrigo terá que cumprir mais 1 ano de reclusão.
O artigo 9º do Código Penal prevê que a sentença estrangeira, quando a aplicação da lei penal brasileira desencadeia na mesma espécie e mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil com duas finalidades: obrigar o condenado à reparação do dano, promovendo restituições e outros efeitos civis, bem como sujeitar o condenado à medida de segurança.